Zahir

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— Gostei do seu cabelo. — Foi a primeira coisa que ele pensou em falar depois de intermináveis 60 segundos. Já estava começando a pensar, aleatoriamente, se deveria trocar as poltronas da sala.

— Não queria te contar, mas fiz isso por sua causa — respondeu ela, se remexendo no banco.

— Por minha causa? — Houve um franzir de sobrancelhas. Esse era um assunto mais interessante de se pensar que o catálogo da loja de móveis.

— É aquela coisa de mudar por fora e trazer a mudança para dentro, sabe?

"Coisas que nunca vou entender", pensou o rapaz, mas preferiu dizer:

— Entendi.

A moça suspirou.

— Seus comentários nunca ajudam.

— E o que é que você quer que eu diga? — A voz dele parecia cansada. — Não quero que você me odeie mais.

— Eu não odeio você.

Silêncio. Ele tentou esconder o sorriso de canto.

— Olha só para mim — continuou ela. — Eu que sempre acabo tentando fazer as pazes. Quer dizer, não é porque te odeio. Acho. — Ela cruzou as mãos atrás da cabeça e olhou para o teto branco.

— Não tento fazer as pazes porque não adianta pedir desculpas para você. — O rapaz também começou a encarar a cor interessantíssima do teto.

— É porque estou frustrada.

— Entendo a sensação.

Suspiraram ao mesmo tempo e se encararam com surpresa pelo acontecido. A jovem não resistiu e deixou um sorriso de canto aparecer. O rapaz sabia da existência do sorriso sem precisar olhar.

— Preciso de uísque — disse ela.

— Puro?

— Por favor.

Ele se levantou para pegar a bebida na prateleira de bebidas no outro cômodo, sendo observado por todo o percurso, desde seus pés descalços no chão até o balanço das mãos no ar. A moça fechou os olhos por um instante, indignada com a beleza daqueles gestos.

Não demorou para que a bebida chegasse em dois copos de vidro lisos. A troca de objetos foi rápida (sem brindes naquele dia). Ele se apoiou na parede onde a poltrona dela estava encostada. Ambos beberam em silêncio durante outros intermináveis 60 segundos, porém, dessa vez, o rapaz procurava se controlar para não pensar em como a curva da boca de sua companhia feminina estava excepcionalmente convidativa.

Quando acabou, não tiveram vontade de repetir, e ela tinha plena consciência de que as batidas de seu coração estavam audíveis.

— Ainda tenho muita coisa para estudar. — A moça se levantou de súbito e largou o copo onde estava, anteriormente, sentada. — Desculpa pela visita repentina.

— Você pode vir quando quiser. — Empertigou-se o jovem.

— Não sei se é bem assim que funciona, foi meio que um impulso. — Mentira! Ela havia pensado naquilo por dias. Pendurou a bolsa no ombro para disfarçar o constrangimento. Os livros pesavam mais do que lembrava.

A falta de resposta a fez pensar que, realmente, era hora de ir embora. Pelo visto, já tinha falado demais. Feito demais. Tentado demais. Talvez ele não quisesse que ela tentasse? Certo, tinha entendido o recado.

Virou as costas, mas ele a segurou pela mão. Na dúvida de se desvencilhar ou não, a moça apenas ficou parada, tentando obrigar o coração, pelo amor de Deus, a bater mais devagar. O rapaz se aproximou e tirou o cabelo dela da nuca.

— Você não disse que queria cortar seu cabelo.

— Você não perguntou. 

Ele sorriu e beijou o pescoço dela delicadamente enquanto passeava os dedos pela sua cintura. Viu que causou arrepios na companheira e se apropriou da bolsa feminina, para, em seguida, jogá-la no chão.

— Você sabe que não precisa ir embora nunca, se quiser — sussurrou-lhe o rapaz.

— Como vou saber se não devo ir? — A pergunta da moça era tão genuína quanto dolorosa.

Ele a virou de frente, para que nenhum detalhe dela passasse despercebido aos seus olhos.

— Não vai saber — respondeu.

E quando ele passou os dedos pela boca quente dela e a beijou, a jovem, realmente, ainda não sabia.

Mas também não foi embora.

Mas também não foi embora

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B'shert [O contraste de suas luzes] - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora