Coautor: Jean V. Hass
— Calma, deixa eu arrumar sua manga antes.
— Para! — Ela bateu de leve na mão do melhor amigo, Ícaro. — Nós não somos namorados de verdade. Não precisa arrumar minhas roupas.
— Qual é! — Ícaro reclamou.
— Não acredito que você me convenceu. — A moça esfregou as têmporas.
— O pessoal precisa pensar que tenho uma namorada, colabora! Só por hoje, tudo bem? — O homem estava suplicante. — Depois posso falar que terminamos ou algo assim.
Ela revirou os olhos. Parecia estar em uma história clichê da Netflix.
— Vocês estão aqui para trabalhar ou ficar expondo namoradinhas?
— Já conversamos sobre isso, por favor. — A feição dele estava desesperada pela possibilidade de a amiga desistir do plano. — Você pode criticar meu ego depois.
— Tanto faz. Vamos entrar nesse negócio ou não?
— Espera, vou abrir a porta do carro para você descer.
— Ainda não sou incapaz, sabe? — revidou ela, descendo do veículo por conta própria.
Logo Ícaro estava ao lado da namorada postiça, oferecendo o braço.
— Você vai ter que segurar — falou para a amiga, que enlaçou o braço no do acompanhante. — Além do mais, você está realmente incrível.
— Não precisa puxar meu saco — respondeu ela, tentando esconder um sorrisinho.
Já que teria de representar a namorada de Ícaro, decidiu entrar bem no papel e escolheu um vestido tanto profissional quanto cativante: vinho-escuro, curto, renda nas mangas, colado ao corpo. O batom forte da mesma cor combinava com a peça, assim como o salto preto.
Quando se olhou no espelho antes de sair, concluiu que era até muito elegante para uma festa de funcionários. Porém, analisando o prédio da empresa, mudou de ideia. Era gigantesco, e os vidros brilhavam com um jogo de luzes milimetricamente calculado para espelhar daquela forma, exatamente naquela posição, projetando a iluminação exata para quem entrava ou saía. Ela conseguia ver a si mesma e ao amigo caminhando no reflexo dos vidros cintilantes.
O segurança confirmou o crachá de Ícaro e os deixou entrar sem maiores problemas, oferecendo, inclusive, um sorriso simpático. Mentalmente, ela estava fazendo um checklist de coisas boas da organização: primeiro, bonito prédio; segundo, boa recepção na entrada. Ao pôr os pés dentro do ambiente, parou imediatamente de andar e decidiu o terceiro item sem nem pensar.
— É, eu sei. — Ícaro riu do deslumbramento da amiga.
Ela foi recebida por uma brisa fresca, e um suave cheiro de madeira rústica impregnava o ar. Ao redor, mais e mais portas de vidro, elevadores nos cantos e paredes azul-marinho. O local era tão sofisticado que ela poderia ter ficado sem jeito.
A secretária foi breve e calorosa, confirmou os nomes em uma lista e aprovou a entrada dos dois.
— Meio complicado entrar aqui sem ser convidado — brincou a moça, reparando que eles precisaram ser confirmados em listas duas vezes. Ícaro sorriu, orgulhoso por trabalhar num lugar como aquele. Ela o deixou conduzi-la a um dos elevadores disponíveis.
Enquanto o elevador subia, uma música calma tocava nos cantos. No entanto, não uma música que pudesse passar despercebida: aquela era conduzida por instrumentos de corda, e ela experienciou o ouvido sendo preenchido com a melodia. Viu-se devaneando até o elevador apitar, sinalizando que chegaram ao andar da festa.
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B'shert [O contraste de suas luzes] - DEGUSTAÇÃO
Historia CortaComo é que se termina um quebra-cabeças? Na teoria, até que é bem simples. Primeiro, você espalha as peças. Depois, tenta encaixar tudo o que parece se completar. Por fim, após criar seu próprio padrão de raciocínio, a imagem fica pronta. Ou não. Se...