F O U R

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A pior parte das terças de manhã era a sessão com Dr. Stanley, o psicólogo da escola, um senhor de meia-idade que havia se apegado fortemente a ideia de que eu tinha "tendências suicidas". 

Quando voltei para a escola, duas semanas depois do enterro do meu pai, estava confiante que ninguém ousaria falar sobre o que aconteceu comigo, porém, dois dias após me reestabelecer fui surpreendida com a notícia de que a escola estava me oferecendo — talvez impondo — apoio psicológico. Demonstrei toda minha gratidão ao recusar, mas essa não era uma escolha, então, comecei a frequentar a sala do doutor Stanley fielmente, certa de que, se eu não faltasse, ele logo me liberaria. 

Eu não podia estar mais errada. Afinal, faziam três anos e eu continuava a ter que comparecer às sessões apenas para esclarecer que não, eu não queria me matar!

Suspirei e me endireitei na cadeira dura e que ficava estrategicamente disposta de frente para o psicólogo, me sentindo tentada a contar os livros de sua estante apenas para não ter que enfrentar sua inspeção minuciosa.

 — Como você se sente? Sobre o... 

Aquilo parecia ensaiado: eu entrava e depois de uma saudação curta e desanimada, me sentava. Ele, por sua vez, mantinha os olhos atentos a cada movimento meu, antes de finalmente me perguntar sobre meus instintos suicidas, ainda que a resposta fosse sempre a mesma: 

Inexistente, Dr. Stanley. Assim como na semana passada e em todas as outras em que estive aqui.

As palavras não eram exatamente essas, mas ele as desconsiderava de qualquer forma. 

— Nenhuma. Gosto de viver. — Dei de ombros. Às vezes, nem tanto.

 Ele me olhou por debaixo das grossas sobrancelhas. 

— Nada? — Insistiu. 

Eu gostaria de saber exatamente o que ele queria ouvir de mim, mas ainda assim, neguei outra vez. 

O diretor dizia que o acompanhamento era uma forma de apoiar os alunos e de evitar mais perdas, mas ninguém entendia que aquilo só me frustrava mais. Se estávamos indo para frente, por que eu devia parar e olhar para trás? 

Suspirando, doutor Stanley colocou seu bloco de anotações de lado e se debruçou sobre a mesa: 

— Alyssa, como se sente ao passar pela ponte? 

— Eu não passo por ela. — Resmunguei e  afundei na cadeira outra vez. 

— Mas passava. — Afirmou e eu concordei.

Eu não estava em negação. Só não queria um lembrete diário de tudo o que poderia ter sido evitado se papai apenas... Se ele apenas...

Desviando meus olhos para o relógio preso na parede atrás de doutor Stanley, puxei a mochila que estava sobre meu colo e, reprimindo um suspiro aliviado, apertei-a contra meu corpo, esperando.

Descontente, os lábios de doutor Stanley se repuxaram para baixo e ele olhou para o seu próprio relógio de pulso. O homem se ergueu e assinando rapidamente a primeira folha do seu bloco, destacou-a e entregou-a para mim. 

Já de pé, esperei a frase que encerrava a sessão: 

— A solução é falar, não se esqueça! Estou aqui para ajudar. 

Em três anos ninguém notou que eu não queria falar sobre a perda, pois, vivê-la era o suficiente para mim. Ninguém sequer considerou que, talvez, eu só estivesse seguindo em frente e não planejando um suicídio. Ainda assim, agradeci e segui até a porta.

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