Capítulo 2

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Os raios de sol atravessavam as cortinas salmão do meu quarto. Abri os olhos e fiquei alguns instantes me situando. Levantei um pouco meu corpo, apoiando-me nos cotovelos, varri o quarto com os olhos. Já era dia. Dirigi meu olhar para o despertador na mesinha de cabeceira ao lado e constei que faltava quinze para as sete. Eu estava atrasada (e fodida)!

Joguei bruscamente meus lençóis para o lado, levantando rapidamente. A ação me deixou um pouco tonta. Fechei os olhos, esperando tudo parar de girar. Quando os abri, vi um papel na mesinha, ao lado do despertador. Olhei e era um recado de Pandora.

Você não sabe o que perdeu!

Sorri ao constatar que minha irmã se divertira em sua noite. Deixei o papel de lado, indo para o banheiro para tentar fazer alguma coisa nos quinze minutos que eu tinha. Depois de dá uma facada na água (e nem lavei meu cabelo) vesti qualquer coisa, enfiando meu pé no All Star. Engoli um cereal com leite. Pandora não estava mais em casa, Phil era pontual, abria seu consultório às sete e meia, exigindo que ela também fosse pontual. Além de seu consultório ser no centro da cidade, e da nossa casa até lá era vinte minutos, se tivesse sorte de não pegar um engarrafamento!

Já para o prédio da faculdade o caminho era contrário a tudo, logo não tive problemas com o trânsito. Mas mesmo assim cheguei dez minutos atrasada e só entrei porque o porteiro era um senhor muito legal (e também porque ele não conseguia negar nada quando eu botava meu melhor sorriso no rosto). Então, dizendo um "só hoje", ele abriu o portão para mim.

Caminhava a passos largos e apressados quando me detive com alguém chamando meu nome.

Fiquei igual uma tonta, girando-me para todos os cantos à procura da pessoa que me chamara. Mas não vi ninguém. Quer dizer, vi um cara, do lado de fora do portão, acenando impaciente para mim. Apertei mais meus olhos tentando focar melhor a figura da pessoa que me chamava, mas nem mesmo isso me fez lembrar-me de conhecer alguém como ele. Na verdade, nunca vi ninguém como ele. Ele era lindo! Mesmo de longe dava para se perceber sua beleza.

Coloquei minhas mãos nas alças da mochila. Calmamente caminhei de volta ao portão. E à medida que me aproximava dele, era que me certificava realmente o quão lindo ele era. Seus cabelos lisos cor de mel estavam completamente desgrenhados, fazendo-o parecer feroz. Seu sorriso torto mostrava todos os seus dentes brancos e retinhos. Pisquei os olhos respirando fundo. Meu coração pulava no peito, minhas mãos estavam suadas e deslizavam nas alças da mochila, minha garganta estava completamente seca. Ele olhava-me tão profundamente que me sentia desconfortável com o seu olhar insistente em mim. Corei.

― Oi, Penélope! ― saudou-me assim que cheguei ao portão. Sua voz era rouca e grossa, e... Nossa, minhas pernas estavam bambas.

Olhei para ele, na verdade eu já estava olhando-o... Não conseguia deixar de olhá-lo. Suas mãos estavam agarradas às grades escuras do portão, enquanto todo o seu corpo estava espremido para frente com sua cabeça tentando passar por um espaço menor que ela.

― Oi... ― foi a única coisa que consegui falar.

Ele lançou seu braço para dentro da grade, puxando-me pela alça da minha mochila, levando-me até ele, colando nossas bocas. Arregalei meus olhos por conta da surpresa, e na hora em que pensei em afastá-lo de mim, sua língua invadiu com força a minha boca, fazendo-me ir ao delírio quando tocou a minha. Fechei os olhos, abrindo meus lábios para deixá-lo me invadir mais fundo. Chupei sua língua com força e avidez enquanto largava as alças de minha mochila. Segurei as mãos dele... Pois eu precisava segurar em algo, não estava mais sentindo minhas pernas, a única coisa que eu sentia era sua boca na minha, sua língua na minha, suas mãos nas minhas e uma sensação estranha e nova para mim entre as minhas pernas. Eu estava excitada.

Oh. Meu. Deus, eu nunca sentira aquilo antes!

Quem era aquele homem? Ele tinha uma presença perturbadora, e isso eu podia constatar pelo simples fato de que nada mais ao meu redor fazia sentido, nem eu fazia sentido... Só ele fazia sentido! Devagarzinho, o estranho desconectou nossas bocas. Abri meus olhos e o vi sorrindo para mim.

― Passei a noite pensando em você... ― sussurrou.

"Céus! É ele..."

E eu estava desesperada e na maior saia justa da minha vida! Não sabia nem ao menos o nome dele. Pela primeira vez eu não sabia o que fazer ou como agir.

Ouvi um forte pigarro. Com muita dificuldade desviei do olhar do estranho, olhando para o lado. Era o porteiro. Saco! Ele batia seu dedo indicador no visor do velho relógio com bracelete de coro desgastado, informando-me que eu tinha que entrar. Olhei novamente para o estranho.

― É... Eu tenho que ir... Estou... ― balancei a cabeça, tentando clariar minhas ideias. ― Estou atrasada. Tenho que entrar... ― olhei mais uma vez em seus olhos, perdendo-me no tom acinzentado deles.

― Claro! Eu só estava de passagem e te vi entrando. Vim só desejar bom dia e te dizer que eu adorei a noite de ontem ― um largo sorriso nasceu em sua boca, derretendo-me por dentro.

― Muito... Gentil da sua parte! ― tentei sorrir.

― Te vejo depois? Mais tarde, quem sabe... ― piscou.

"Oh. Meu. Deus! Ele piscou para mim, seria possível ele ter ficado mais bonito ainda?"

― Aham... Mais tarde ― fiz que sim com um movimento de cabeça.

― Te ligo! ― disse, afastando-se.

O homem pegou do bolso do jeans as chaves do carro, acionando o botão de trava. Mais à frente, um carro (muito belo, por sinal) destravou-se ao simples toque de seu dedo no pequeno botãozinho, acendendo suas luzes por alguns segundos, fazendo "bip".

Ele iria me ligar.

Olhei mais atentamente para ele enquanto com todo glamour e destreza entrava no carro... Um belo carro para um homem mais belo ainda.

Ele disse que me ligaria...

Ele tinha me beijado. De longe, o melhor beijo da minha vida. Estreitei meus olhos admirando-o, enquanto ele guiava seu carro avidamente. Deu sinal, entrando à direita, sumindo logo em seguida do meu campo de vista.

Ele disse que ligaria para mim...

"Mas pera aí, ele não tem o meu telefone!"

Pan!

Lógico! O número que o estranho tinha era o de Pandora. A garota com quem ele saiu na noite passada era Pandora, e não eu! Ele pensou que eu era ela... Como na noite anterior todos pensaram que ela fosse eu. Meu Deus, em que confusão eu fui me meter e também a minha irmã? Eles ficaram ontem? Com toda a certeza do mundo! Pan não teria perdido a chance de "pegar" aquele homem! Eu também não teria.

Senhor, isso não daria certo! Ele era lindo, tanto, que me deixava sem ar e sem os meus sentidos preciosos. E isso apenas com o seu olhar! O olhar mais lindo que eu já vira em toda a minha vida!

"Ele disse que iria ligar... Mas não para mim".

Eu queria realmente que fosse para mim.

Suspirei pesadamente, desencostando do portão, indo para a minha aula. Contudo, nada mais faria sentido. "Não hoje". Não depois de conhecer aquele homem, de ter sido beijada por ele. E muito menos depois de ter-lhe visto sorrindo aquele sorriso. Aquele que eu sabia, nunca mais tiraria da cabeça.

DUAS FACESOnde histórias criam vida. Descubra agora