Capítulo 6 - A casa dos Cabeças-Ocas

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Júlia:

Horas depois.

Duas e quarenta e cinco da tarde. Eu estava em um táxi, indo pra casa de Fred. Encostei a cabeça na janela, pensando na nossa briga de mais cedo.

Olhei pro céu.

Não sei qual era a dele com a história do Mike. Tudo bem que esse aí não era lá um exemplo de garoto, vivia se metendo em encrencas... Mas não precisava tanto! Eu não preciso de olhares tortos vindos dele, já não bastava do colégio inteiro?

Mas na real, pra mim, Fred era uma incógnita. Eu nunca sabia o que tinha por trás de suas ações. Na verdade, sempre desconfiei delas. Desde aquela vontade súbita de ser meu amigo até sua perseguição babaca pelo Mike.

O táxi parou, me acordando do pequeno transe. Paguei o motorista e saí logo. Dei-me de cara com uma casa grande e bonita, de dois andares. Senti meu coração disparar em sinal de puro nervosismo. Aonde eu fui me meter?

Passei pelo jardim de grama queimada e um pouco suja. Havia latinhas de cerveja em alguns lugares e gnomos bizarros. A varanda tinha um piso de madeira escura, com parapeito branco, combinando com a pintura da casa. Vi bitucas enfeitando as plantas e dei um leve riso. Então quer dizer que eles eram chegados num cigarro, além deFred? To começando a gostar desses amiguinhos! A porta era também de madeira, só que escura. Respirei fundo.

Antes de apertar a campainha, senti o coração palpitar. Estalei os dedos nervosa e engoli em seco. Ajeitei meu cardigã preto. O rabo de cavalo no alto da cabeça mostrava o quanto fui preguiçosa e desleixada por deixá-lo torto. E... Merda! Por que não me arrumei mais um pouquinho? Mas, não, Júlia! Você tinha que vir com um dos piores cardigãs e o cabelo preso desse jeito!

Palmas.

Ótimo, virei a minha mãe.

Apertei a campainha e juro que, quando ouvi o barulho, me deu dor de barriga. Joguei meu corpo pra frente e pra trás esperando alguém abrir a merda da porta. Vi a maçaneta girar e num impulso, andei pra trás. E então, a porta se abriu por completo.

- O Fred? – quase que minha voz não saiu quando vi um garoto só de samba-canção xadrez. Ele tinha uma cara sonolenta e coçava os olhos. Sua cara amassada e o cabelo bagunçado me fizeram abrir um sorrisinho.

- Pô, Bia! Eu já disse que não é pra atender a porta desse jeito! Vai que é a tia da torta! – uma voz saiu do interior da casa. O tal Bia ia responder quando percebeu quem era. O menino sonolento arregalou os olhos e em seguida engoliu em seco. Vi pavor em sua feição. Claro, Júlia Torres, a devil girl na sua porta, é muita informação pra uma pobre criança, eu entendo. Mano, esperar um contato é chato! Fala alguma coisa!

Mesmo assim, Bia ainda me olhava sem acreditar que eu estava lá. Eu já tava ficando incomodada, sabe?

- Po-de e-entrar. – Bia falou gaguejando, me olhando de cima a baixo. Se ele não se importava por estar só de cueca, é agora que ele não liga mesmo!

Cocei minha nuca com vergonha, mas mesmo assim fui entrando.

- Obrigada. – falei simpática. Pus minha bolsa preta nas costas e depois tentei, idiotamente, ajeitar o cabelo. Eu tenho problemas com cabelo, argh!

Bia ainda vigiava meus passos. Percebi que meu All Star azul sujava o piso com um pouco de barro, mas não me importei. O dono da voz anterior estava escorado no corrimão da escada, também me olhando. Ele estava com uma calça jeans folgada e sem camisa. Os garotos dessa casa só vivem assim? Será que Fred vai aparecer assim também?

Dançinha da vitória interna.

Ok, parei.

- Fique à vontade. Eu sou o Bia e aquele ali é o Harry. – Bia (que agora tentava ser normalzinho) apontou pro outro seminu. Então, esse é Harry, o tocador de bateria. Hum, sinto que ele ta querendo seduzir escorado nessa parada. Ele fez um sinal com a cabeça e o respondi assim também. As pessoas daqui falam pouco ou é só impressão?

Como Ser um Pegador em 12 LiçõesOnde histórias criam vida. Descubra agora