08 | star shopping

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FAZIA QUATORZE DIAS DESDE que comemoramos meu aniversário e as mudanças exigiam muita energia de mim, tanto quanto de Ayla, que acompanhou-me no processo de desintoxicação

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FAZIA QUATORZE DIAS DESDE que comemoramos meu aniversário e as mudanças exigiam muita energia de mim, tanto quanto de Ayla, que acompanhou-me no processo de desintoxicação.

A rádio local tocava minha música Star Shopping, parecia o momento propício para me lembrar do motivo dela ter sido escrita e produzida tão caótica e apaixonante. Ainda não havia contado-a sobre ser a principal inspiração, mas não restavam dúvidas que não existia outra pessoa responsável por trás da melancolia cega e amorosa que abastecia minhas canções, a não ser ela mesma.

— Espere aqui, vou voltar quando amanhecer. — Anunciei estressado, apanhando minhas roupas com pressa. Ayla não demonstrou nenhum sinal de decepção, mesmo que estivesse decepcionada. Uma mistura de culpa e medo me apoderou, não era justo ela ter que aguardar pela minha volta. O mundo estava em rotação, ela precisava viver a vida dela, mas parecia impossível comigo atrasando-a. — Sei que no momento não tenho valor, me dê um tempo enquanto trabalho nisso.

Ela bufou, sem paciência. Ninguém conseguiria suportar tantas desculpas sem ao menos se chatear, ela não merecia suportar um fardo daqueles. 

— Podemos ter uma conversa, ao menos? — Tomou uma lufada de ar, inflando sua caixa torácica, Ayla tinha a pose mais forte de todas, não importava a circunstância. — Olhe pro meu rosto, enquanto fala comigo...

Desta vez, a exigência veio em um tom áspero, atingindo-me duramente. Naquela altura, só conversávamos uma vez por semana e sequer compartilhávamos nós mesmos. 

— Me desculpe, Lua. — Soltei a bolsa no chão, paralisado em uma dor árdua. Só conseguia pedir desculpas, embora elas não resolvessem os erros cometidos. — Se eu achar um caminho, você vem comigo? — Perguntei em meio ao nosso forte abraço, numa fraqueza inacabável; nunca pedi ajuda para alguém, mas Ayla constantemente me ajudava. Ela era a única que se importava e ela era a única razão pela qual atendia o telefone. 

Ayla não podia passar mais um dia em Califórnia, aliás, tinha que retornar a faculdade e toda a sua verdadeira realidade em Long Beach. A distância nos castigaria novamente por mais sete dias, até que viajasse de volta para casa e terminasse de produzir a minha mixtape. Em Califórnia mal conseguia dinheiro para me alimentar, exceto pelos enlatados de feijões que a mesma trazia. 

— Por que faz isso por mim? — Caminhávamos pela extensão deserta da praia, sua mão entrelaçada na minha me guiava pela imensidão arenosa da noite; questionei com apresso, mas junto com remorso. Ela fazia tripas corações para sustentar nosso relacionamento. — Venho aborrecendo todos, não sou como minha família queria que eu fosse e meus amigos me odeiam. Por que você continua do meu lado?

— Ei, me escuta. — Ayla pousou o polegar em meus lábios carnudos, fazendo-o parar de falar tais lamentos. — Olhe para o céu essa noite, pense em todas essas estrelas.

Ela queria me distrair dos pensamentos ruins e dos problemas, pensar neles, naquele instante, não adiantaria muito. E assim, fiz. Observamos a grandiosidade azul escuro, com diversos pontos brilhantes marcando a perdição obscura. "São lindas", suspirei, admirando-as.

— Todas elas tem uma razão, uma razão para brilhar, uma razão como a sua. – A loira não deixou de sorrir, revisando olhar entre a paisagem e minha face encantada. — Não deixe que isso se apague, nunca.

Ela sabia que um dia estaria no topo, apostava toda sua fé em mim, até quando não devia. Independentemente dos altos e baixos, discussões e carinhos, eu a amava e ela me amava. Como deveria ser até o fim dos tempos, ou como jurei que fosse.

— Se isso não der certo, vou largar tudo para que nada fique entre nós. Nunca mais. — Afaguei seu rosto perfeito, os traços e cada mínimo detalhe do meu universo, bem de frente aos meus olhos lacrimejados. Se aquilo fosse um sonho, queria viver em um perpétuo sono. — Se der certo, iremos atravessar o oceano, fumar nosso baseado e dormir abaixo das estrelas toda noite. Quero viver com você, quero que seja feliz. 

Ela sorriu. Foi um sorriso intenso, numa fusão de tristeza com a mais pura felicidade.

— Não me prometa comprar as estrelas, sabe bem que as trocaria para estar ao seu lado. 

E Ayla realmente trocou várias coisas só para estar presente, numa atitude tão autossuficiente e decidida. Eu largaria as drogas por ela, largaria qualquer coisa que ela quisesse, se ao menos, soubesse como acabaria e se a teria próximo a mim. 

Àqueles que nos viram naquela noite, nos declararam insanos: dançávamos na quebra das ondas, ríamos, caíamos em uma crise de choro juntos, gritávamos e corríamos. Achávamos que fosse a última vez que no veríamos, e apesar de errados, foi uma das vezes que a senti por completa, sua cintura se encaixando perfeitamente em minhas mãos, seu corpo acima do meu, transformando-os em um só. 

Star Shopping não foi composta somente para a nossa despedida, mas de todas as coisas que senti no processo. Assim como a canção, a garota de cabelos compridos e expressão sedutora também me trazia certa paz, ela era a única que me mantinha inteiro quando estava prestes a despedaçar.

star shopping ✦ lil peepOnde histórias criam vida. Descubra agora