XVII

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Ele não sabia por quanto tempo suportaria ficar na corte de Viena. Parecia que quanto mais ficava longe da capital, ela ficava ainda mais insuportável e intolerável. Se não fosse por Helene, teria ido embora daquele palácio logo depois do episódio ridículo do Natal causado por seu irmão. Mas, por ela, aguentaria mais tempo naquele lugar.

Seus pais tinham procurado por ele naquela manhã, perguntando até que ponto Albert estava dizendo a verdade. Sentiu vontade de dizer toda a verdade, mas quando lembrou da humilhação que Helene havia sofrido por causa do idiota, resolveu negar tudo com a maior frieza que conseguiu. Como militar tinha facilidade para esconder seus sentimentos quando era necessário.

E, como se não bastasse, parecia que um diabo tinha possuído o corpo de Helene. Ela estava completamente determinada a assistir a amante de Albert dançar, e não apenas isso, queria cumprimentar a bailarina também. Tentou convencê-la de que não era uma boa ideia, poderia resultar em algum escândalo, no entanto, nenhum argumento surtiu efeito. Como não deixaria ela ir sozinha, a acompanharia.

Passou a mão pelo cabelo perfeitamente penteado, com exceção de uma mecha que teimava em cair sobre seu olho. Ajeitou mais uma vez sua faixa vermelha e branca com a Ordem do Velocino de Ouro, suas medalhas estavam perfeitamente colocadas. Seu valete entregou suas luvas, depois sua espada.

— Será Quebra-Nozes, Alteza?

— Sim, como é típico desse período natalino.

— Não parece que o senhor está muito animado.

— Tenho medo das consequências. — suspirou. — Mas não posso deixá-la ir sozinha.

— Acredito que Vossa Alteza arrisca muitas coisas por ela. Não acredito que eu teria tanta coragem, sempre imaginaria as consequências dos meus atos.

— Pensei sobre isso quando ela estava no altar para se casar com Albert. Não imagina a enorme vontade que eu tive em tirá-la de lá, carregá-la em meus braços com aquele vestido branco pesado para fora da catedral e fugir. Minha madrinha é rainha de Portugal, nos ajudaria. Porém, obedeci ao que nos foi imposto. — falou amargamente. — Veja como estamos, infelizes.

— Perdoe-me pela audácia, Alteza.

— Perdoado. — deu um pequeno sorriso.

Karl se dirigiu até a porta e saiu do seu quarto em direção a carruagem que provavelmente já esperava por ele.

Como tinha imaginado, a carruagem esperava por ele. Helene estava em outra carruagem com sua dama de companhia. Ela deu um pequeno aceno com a mão, que ele retribuiu no mesmo instante.

— Sua ironia é maravilhosa, Alteza. — Karl deu uma risada debochada, subindo na carruagem.

Burgtheater ficava apenas um minuto de distância do palácio. Chegou tão rápido, que nem deu tempo pensar em nada. Desceu da sua carruagem, indo em direção a Helene, oferecendo seu braço para acompanhá-la até o camarote imperial.

Naquele momento ele pôde observar Helene melhor. Ela estava belíssima, em toda sua glória. Era a semelhança de uma deusa, nem Afrodite poderia ser comparada a Helene naquela noite. Como desejou beijá-la, arrancar aquelas roupas, todas as joias, ter ela apenas para ele.

— Karl?

Saiu do seu devaneio.

— Sim?

— Aconteceu alguma coisa? — sua voz soou preocupada.

— Não, apenas alguns pensamentos pecaminosos.

O rosto dela começou a ficar ruborizado.

— Gostaria de saber se esses pensamentos pecaminosos são comigo.

— Não tenho outra mulher em meus pensamentos. — apertou levemente o braço dela. — Gostaria de ter um momento a sós com você novamente, como em Bad Ischl.

— Se fosse apenas você...

Eles entraram no camarote e soltaram-se logo em seguida. Helene andou até o balcão, olhou ao redor com certo interesse. Karl aproximou-se dela, para observar também.

Amava aquele teatro, era belo de todas as formas. Tinha ido poucas vezes, porque o pai evitava levar crianças para os espetáculos. E quando cresceu, foi apenas cinco vezes, o que era uma lástima.

— Vim aqui muitas vezes durante esses dez anos. Albert raramente vinha, então eu achava formidável me refugiar muitas noites nesse teatro. — sua expressão mudou de repente, parecia aborrecida. — As malditas reverências.

As reverências faziam parte do protocolo. Se tivesse algum membro da realeza presente em algum recinto, tinham que demonstrar respeito. Estava acostumado com tudo aquilo, Helene ainda parecia desconfortável, apesar dos anos.

— Bem, vai começar. — sentaram-se ao mesmo tempo.

As luzes começaram a abaixar, deixando apenas o palco iluminado.

— Espero que seja o melhor Quebra-Nozes. — Helene pegou um binóculo.

— Helene...

— Fique tranquilo. — colocou a mão enluvada dela sobre a dele.

— Estou tranquilo.

— Mentir não é muito seu forte.

— Para você é realmente complicado.

— Para os outros é fácil? — o encarou.

O som dos violinos preencheu o lugar.

Karl deu um pequeno suspiro.

— Sim.

Gostava das melodias de cada ato. A emoção que cada música transmitia era mágico. Sentia dentro dela cada nota, cada passo que um bailarino dava. Quebra-Nozes era fantástico, ninguém poderia negar. E não poderia se negar a excelente bailarina que era a amante de Albert.

Ingrid Feinberg era talentosa e merecia todo o prestígio.

— Vossas Altezas, desejam conhecer a companhia de ballet?

— Absolutamente sim. — Helene se levantou.

— Também irei.

Helene deu um sorriso amistoso para ele.

— Por favor, sigam-me.

Seguiram o homem até os camarins. Todos ficaram em silêncio quando eles chegaram, trazendo certo desconforto para ela. Deu um enorme sorriso e cumprimentou cada um dando parabéns pela bela apresentação.

Quando Helene se aproximou de Ingrid, notou um sorriso debochado nos lábios dela, como se fosse algum tipo de afronta. Percebeu que aquela mulher não era tão amistosa. Apesar de desconfiar disso, pois nenhuma outra amante teria tanta audácia de enviar um convite para a esposa, mesmo sabendo que ela e Albert era um casamento falso.

— Vossa Alteza, fico honrada com sua presença. — fez uma reverência. — Nenhum dos meus colegas acreditaram que a senhora viria, ainda mais com um convite de uma simples bailarina. — seus olhos pousaram em Karl com um brilho malicioso. — Oh, o famoso arquiduque Karl, presumo. — um sorriso diabólico preencheu o rosto dela. — É mais bonito do que eu pensava.

Helene ficou enciumada com aquela mulher falando daquela forma com Karl. Queria esganá-la.

— Sua apresentação foi fantástica. — disse séria.

— Fico lisonjeada.

Aproximou-se da bailarina como se fosse cumprimentá-la.

— Escute-me bem, Srta. Feinberg. Jamais ouse me afrontar novamente na frente de todos como se eu não fosse nada. Acima de tudo, quero respeito. Se não conhece essa palavra, procure conhecer. — deu um pequeno beijo na bochecha dela. — Fabulosa! Merece todos os elogios.

Helene se afastou, dando o braço para Karl.

— Sucesso para todos nessa temporada.

HeleneOnde histórias criam vida. Descubra agora