04.

1.6K 118 90
                                    

A sensação era de estar em chamas, como se o sangue correndo em suas veias tivesse sido substituído por lava. Sentia que a qualquer momento poderia entrar em combustão e, apesar disso, não tinha dentro de si nenhum desejo de se afastar daquele a prendia naquele abraço de fogo. Ao contrário. Empurrando-se ainda mais contra ele, Catarina embrenhou as mãos no cabelo de Afonso, segurando com a mesma força com a qual ele a segurava pela cintura.


Não havia gentileza ou lentidão no beijo, mas sim a sensação que se tem quando se encontra algo que nem se sabia estar procurando e então você só se agarra naquilo com toda força, com todo desespero. Sentiam-se sufocar um no outro mas nenhum dos dois se atrevia a emergir em busca de ar, não ainda. O sentimento de... pertencer era mais forte do que tudo. Era como se ao tentarem revelar a alma um do outro daquela forma, haviam acabado por encontrar a parte que completava a sua própria e aquilo... aquilo era assustador. Para ambos.


Para Afonso porque, ainda que ela fosse a pessoa mais distante de seus pensamentos no momento, havia Amália. Havia Amália e toda a infinidade de coisas, de pessoas, que ele deixou para trás para viver aquele amor...


E para Catarina... A única coisa a qual ela sempre quis pertencer foi à coroa. Ao poder. Pensar, sentir, que existia alguém que com um toque, um beijo, podia fazer com que se sentisse mais realizada e segura do que nunca era a coisa mais apavorante que já sentiu.


Foi justamente esse pensamento, esse medo, que a fez quebrar o beijo descendo uma das mãos entre seus corpos e empurrando Afonso para trás, para longe. Não houve grande força no empurrão, apenas o bastante para que seus lábios não mais estivessem conectados apesar de seus corpos ainda estarem muito próximos.


"Você... você... você não devia ter feito isso." ela disse. Estava ofegante e as bochechas levemente vermelhas, como se tivesse estado numa corrida. Afonso não sabia o que dizer, as palavras pareciam presas em sua garganta enquanto também resfolegava, buscando por um ar que já entrava em seus pulmões mas que de nada estava servindo para lhe dar algum controle de si mesmo.


"Eu sei. Eu sei." Respondeu por fim e... e de fato sabia. Sabia que não devia, muito embora as razões para isso fossem uma coisa muito distante de sua mente.


Antes que pudesse dizer algo, tentar formular algo, Catarina pareceu recuperar o controle de si mesma com muito mais rapidez e se afastou, dessa vez colocando bons passos de distância entre eles. Afonso gostaria de dizer que se sentiu aliviado com a distância; não tê-la em seus braços definitivamente lhe deu uma certa clareza do que fato havia feito e a gravidade, mas a verdade é que a visão dela se afastando fez com que quase projetasse o próprio corpo para frente em protesto. Antes que o fizesse, porém, uma máscara impenetrável tomou a face de Catarina e o fez congelar no lugar.


"Não se esqueça que agora apenas um de nós é da realeza aqui, Afonso. Tome esse tipo de liberdade com a futura rainha de Artena, e recebera o mesmo tratamento que qualquer outro plebeu. A masmorra."


Você retribuiu; eles quis gritar para ela mas engoliu as palavras. Não achou que seria prudente entrar num novo debate com Catarina, especialmente considerando o que havia acabado de acontecer como consequência do ultimo que tiveram.

Heavy CrownOnde histórias criam vida. Descubra agora