Capítulo 2

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  Quando eu era pequena eu ficava olhando os carros passando, imaginando que eles eram membros de um só corpo, de uma só força

  Hábito que revivi recentemente.

  Lembro o quanto era uma garota estudiosa e principalmente do meu amor pelas histórias de fantasia que eu praticamente devorava com os olhos, histórias que retratavam grandes heroínas, mulheres fortes e bondosas.

  Era meu sonho ser como elas, poder lutar contra o mal, com minhas próprias forças, poder derrotar o monstro do meu pai.

  Que idiota eu era.

  Hoje resolvi testar os meu limites, sabe como é, as coisas não andam fáceis, as vezes quando olho para uma faca penso qual seria a sensação dela cortando a carne do meu pescoço, simplesmente as coisas não andam fáceis.

  Minha vida nunca foi um jardim de rosas, não é a primeira vez que estive aqui, no fundo do poço, não é a primeira vez que eu penso na morte, que desejo ela.

  Mas, as coisas também nunca foram simples pra mim, eu e minha mãe fizemos uma promessa, que nao pode ser ignorada, nunca.

  Foi numa noite particularmente ruim, meu pai havia tido um dia difícil no trabalho, lembro perfeitamente do olhar no rosto da minha mãe quando ele colocou a faca em seu pescoço, um olhar de ódio, de quem não se renderia a morte assim tão fácil.

  Naquela noite ela se sentou na minha frente e junto suas duas mãos na minha, disse que não importava a situação a morte não é uma solução, não é nem mesmo uma alternativa.

  "Jure querida"- ela pedia, desesperada, lágrimas saiam do seu olho que estava começando a adquirir um tom arroxeado por causa do soco do meu pai.

  "Eu juro"

  Que idiota eu era.

  Desde nossa última conversa minha mãe tem cuidado dos preparativos da minha viagem, ficou decidido que eu iria passar um tempo com Mirela, uma amiga antiga da mamãe, eu estou bastante desconfortável com a ideia, mais isso é necessário, então não tem muito que eu possa fazer.

  Hoje era pra ser minha última despedida de Chicago, o lugar onde nasci e vive durante todo minha vida, mais por algum motivo vim parar na beira da ponte da Michigan Avenue.

  Me encosto sem jeito no parapeito,  desconfortável com a situação, os carros passam em borrões atrás de mim enquanto as luzes de Chicago brilham ao meu redor, e tudo que posso fazer é olhar pra baixo e imaginar como seria se eu estivesse morta agora.

  Mais uma vez me volta a memória das minhas histórias favoritas, como a vampira dos X-Men.

  "Mamãe, mamãe, imagina só... imagina que eu sou tão forte quanto a vampira" eu revivo a cena "ter super poderes seria super legal! eu ia proteger todooo mundooo haha"

  Me lembro novamente daquela noite, da explosão, da raiva que eu sentia, da minha vontade de mata-lo.

  Olho para minhas mãos e me pergunto novamente qual é o problema comigo.

  O que eu sou de verdade?

  Olho para o rio vários metros abaixo de mim e vejo beleza nele, um tipo de beleza diferente do que as outras pessoas veem.

  "Não seja boba" sussurro para mim mesma " Vai ficar tudo bem".

  Como já estava tarde resolvi voltar para o apartamento, no caminho porém paro numa loja de brinquedos, entro e compro um ioiô, como uma lembrança, para levar comigo quando eu for embora para a Irlanda.

  As vezes eu imagino como vão ser as coisas lá, mais logo trato de afastar esses pensamentos, não vale a pena sofrer por antecedência.

  Daqui a duas semanas estarei embarcando para um lugar totalmente desconhecido, para começar de novo, para esquecer.

  " Vai ficar tudo bem" repito esse mantra durante toda a caminhada até minha casa provisória enquanto brinco com meu novo ioiô na mão direita.

  Adeus Chicago.

Ayne, e a Luz VerdadeiraOnde histórias criam vida. Descubra agora