Capítulo 5: Anelym

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12 de fevereiro de 2017 – Brasil, às 8:00 a.m.

– Anelym, você precisa sair daí! – Eles gritavam do outro lado da porta.

Mas eu não queria ouvir, não queria ninguém perto de mim. Eles me faziam lembrar a todo instante da tragédia que se abatera sobre sua vida. Se ouvisse mais algum "meus pêsames" ou "eu sinto muito, eles eram tão jovens" pularia da janela do quarto.

Eu tinha uma vida maravilhosa, sim. Meus pais se amavam. Mamãe estava prestes a me dar a segunda irmãzinha. Viajávamos a todo instante, fazendo pesquisas sobre as economias nacionais em vários países da América Latina. Eu e minha irmã mais nova estudávamos com mamãe, e íamos muito bem, fique você sabendo!

Sempre estava com meus pais. Sempre fomos unidos como ninguém mais. Em meados de janeiro, minha avó materna convidou eu e minha irmã para passarmos umas férias no interior do estado de Recife, no Brasil. Já tinha ouvido falar das praias do lugar e quase implorei para mamãe e papai deixarem que eu e Mylena fôssemos.

Se eu pudesse amaldiçoar esse dia...

Um mês depois veio a notícia de um acidente.

Eles dirigiam em uma estrada muito íngreme na Venezuela. Não houve como escapar em uma curva fechada. A polícia disse que papai estava em alta velocidade.

Papai nunca corria. Nunca.

– Anelym! – Minha tia continuava, insistentemente.

Ela veio diretamente da Itália para cuidar de mim e Mylena. Mas eu não a queria. Não queria ninguém me consolando, dizendo em como eles eram um casal feliz e amoroso – eu sei disso, porra! –, o quanto eles não mereciam morrer, mas que estão em um lugar melhor agora.

Parem com isso!

Eu não quero ser consolada, apenas chorar em paz. Será pedir muito?

Alguém arrombou a porta.

Por sorte, minha cama na casa de vovó ficava logo abaixo de uma janela aberta. Pulei para o parapeito dela.

– Saiam daqui ou eu pulo! – Ralhei com as pessoas que invadiram o quarto.

– Anelym! – Mylena exclamou logo atrás de tia Gloria.

Eu não queria que ela me visse naquele estado, é claro. Era minha irmãzinha de nove anos. Não queria que ela tivesse perdido os pais também.

Éramos para estarmos todos juntos naquela viagem. Éramos pra ter morrido unidos, como fomos durante toda a vida.

– É tão simples – eu pensei alto.

Eu poderia ajudar o destino a desenhar minha sina. Da janela para o chão de cimento e cerâmica da área da churrascaria de vovó era uns doze metros. Se caísse de cabeça, com certeza morreria. Papai e mamãe estariam me esperando de braços abertos. Talvez até minha irmãzinha em sua forma de anjinho ainda.

Olhei para Mylena com os olhos úmidos, implorando.

– Tirem Mylena daqui – ordenei.

Alguém a arrastou aos berros para longe.

– Não faça nada estúpido, mocinha – Tia Gloria aconselhou.

Mas eu estava muito anuviada pelos medicamentos que tinham feito eu engolir. Finalmente eles faziam efeito.

Dei uma última olhada para tia Gloria e sorri, sentindo o corpo relaxar tão de repente.

Enfim, me senti caindo e caindo...

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⏰ Última atualização: Aug 24, 2018 ⏰

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