10 Despertar

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— Ele está acordando. — Ouvi uma voz conhecida ao meu lado.

— Ah, já era hora!

Abri os olhos, e encontrei Lívia, minha mãe e Karen no quarto.

Pisquei para me acostumar à claridade.

— Bem vindo de volta, querido. — Karen apertou minha mão.

Pigarreei — Há quanto tempo estou morto?

Ela riu — Três dias, querido.

Olhei para Lívia. — O que ela ainda está fazendo aqui? — Não dava para acreditar na burrice dessa garota.

Ela bufou de raiva. — Você é um imbecil Edu! Por que me mandou ir embora? Achou mesmo que eu deixaria você sangrando na sarjeta? E que historia é essa de tentar desarmar bandido? Ficou maluco?...

— Ei, ei... Tá pensando que é quem para me dar sermão, garota?

— Não estou pensando! Eu sou a pessoa que te ajudou naquela merda de terminal!

— Onde eu só estava por sua causa! — rebati, ainda lutando com minha voz.

Ela bufou outra vez.

— Vamos parar com essa DR? Não é hora disso, gente. — Karen a afastou de mim.

— Você é inacreditável Eduardo! — Minha mãe retrucou.

Revirei os olhos. — Cadê a Vi?

— Está com o Bê lá embaixo. — Karen tentou me tranquilizar.

— Puta merda! Deixaram aquele idiota olhando ela?

— Fica calmo, para quem acabou de acordar, você está muito nervosinho.

— Karinha, por favor... — Quase implorei.

— Nós vamos descer, o médico disse que vai passar aqui daqui a pouco para conversar com você.

Assenti — Diz para ela que eu estou bem, tá?

— Ah, caso queira saber, seu carro foi recuperado. — Ela piscou para mim.

Respirei aliviado — Obrigado.

Ela me deu um beijo na testa, e saiu com a minha mãe do quarto.

Tentei me mexer, mas senti meu abdome repuxar.

— Você é um idiota, Edu. — Lívia resmungou.

— Vou ter que perguntar outra vez o que você está fazendo aqui ainda?

Ela me fuzilou — Já vi que sua gentileza se foi.

— Não era para você estar aqui. Era para você ter entrando em alguma porra de ônibus, e estar longe...

— Quer que eu vá? Eu vou, mas saiba que falei com a Karen, ela me contou tudo, e você é um imbecil desinformado. E está sendo um cretino, sem razão.

— Eu... — fiquei a encarando, pensando em um jeito de ela sumir, sem ter que magoá-la mais.

— Você o que? – ela me enfrentou.

— Eu quero que você vá. — Falei olhando para baixo.

— Idiota! Você não precisa ficar se vitimando por isso. Já pensou em falar com alguém que não tenha a cabeça fechada da sua mãe?...

— Não é da sua conta. — falei em voz baixa.

Ela bufou — Isso não seria problema para mim, se você quer saber. Ao contrário de você, eu luto pelo que eu quero, não fico esperando a morte chegar.

Ela se virou, pegou a bolsa e saiu batendo a porta, e pisando duro.

Respirei fundo. Eu sentia minha cabeça pesada de analgésicos, mas mesmo assim, as dores não davam trégua.

****

O médico passou para me informar que o tiro só havia atingido meu rim esquerdo. Ele foi removido, mas nada com que eu não pudesse viver. Perdi uma boa quantidade de sangue. E ficaria mais algum tempo no hospital, estava com uma infecção intestinal e uma leve pneumonia. E eu sabia que isso já era de antes...

Enquanto ele falava, eu só conseguia pensar no que a Lívia tinha falado. Mas de qualquer forma, eu desejava que ela não aparecesse mais. O que me ajudaria, só por não me trazer tantos problemas.

****

Fiquei mais três semanas internado. Uma infecção deu trabalho dobrado aos médicos, mas enfim, consegui voltar para casa, com a grata surpresa de ter meu amado Porsche de volta para mim. Se eu já estava desconfiado daquele "assalto" depois de ele ter sido encontrado intacto, não me restava dúvidas.

A banda entrou em recesso, e os shows foram adiados até eu estar inteiro. Tentei convencê-los de achar um substituto. Mas não quiseram nem ouvir a respeito. Quer dizer, o Bê ficou bem tentado, mas Maycon e Gui, nem me deixaram terminar a frase.

Karen me contou que contratou uma enfermeira para me ajudar, e minha mãe ficou com uma tromba gigantesca, odiava gente estranha em casa, na verdade ela odiava quase tudo na face da terra.

Cheguei em casa, com a escolta dos caras da banda, e eles me ajudaram a chegar até meu quarto.

Assim que me deitei, Vi correu para mim, se sentando ao meu lado na cama e segurando minha mão.

— Vou cuidar direitinho de você Edu.

Eu ri. — Viu Karen? Acho que nem preciso de enfermeira.

Karen riu, com um sorriso meio suspeito no rosto — Dessa, você vai precisar querido.

Olhei desconfiado para ela, mas achei melhor não retrucar.

— É isso cara, vê se melhora logo. E aproveita o tempo para escrever mais músicas fodas para a gente. — Maycon riu.

— Isso ia ser de grande aproveitamento. — Gui concordou.

— Mas nem todo estourado, vocês param de me explorar não é? — eu ri — Pode deixar, ficar parado não é mesmo comigo.

— Bom, não faz mais que sua obrigação, já que achou que tinha peito de aço para lutar com bandido armado. — Bê desdenhou.

— Nossa, você é muito otário cara... — Karen o repreendeu.

— De boa Karinha, já estou acostumado.

— Falou então cara. — ele se virou para Vi e bagunçou seu cabelo — Até mais gatinha, vê se da um jeito nesse babaca do teu pai. — ele riu.

— Pode deixar tio Bê. Mas você que é babaca.

Segurei o riso, enquanto os outros soltaram um "ooooloco".

Depois dessa, só restou para ele, ir embora. A Vi podia amá-lo, mas nem ele podia falar mal de mim para ela, por mais distante que eu a mantivesse deles, quando se encontravam, ela era o centro das atenções.

Karen se aproximou, me deu um beijo no rosto e me estudou por um momento.

— Você está bem mesmo?

Assenti. — Vou ficar Karinha, não se preocupe.

Ela sorriu — Sua enfermeira chega ás duas, tá bom? Combinem os horários, e depois eu cuido dos pagamentos. Não se preocupe com nada, vou tomar conta deles.

Baixei os olhos. — Valeu Karinha, sem você eu estaria perdido.

Ela sorriu — Não me agradeça ainda. Só... Volte logo.

Sorri assentindo, e ela saiu do meu quarto. 

Discordantes (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora