Escolhas

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Quando abro a porta do meu apartamento Nuttha está sentada no meu sofá, seu vestido chique branco quase se confundindo com o branco do estofado.
Não me espanta ela estar no meu apartamento, sempre tivemos a chave do apartamento um do outro, o que me espanta é o olhar que ela me lança quando eu abro a porta.
— Achei que tinha um evento hoje.
— Eu tinha. — Ela responde seca.
Me sento na mesinha de centro, de frente pra ela. Seus olhos estão vermelhos, não sei dizer se é de choro ou cansaço.
— O que houve?
Nuttha respira fundo antes de começar a falar. Ela cruza os dedos largos e magros, as unhas pintadas de rosa clarinho, sua cor favorita.
— Eu me formo em breve.
— Sim, eu sei.
— E também farei vinte e cinco anos.
— Sei disso também.
Ela suspira.
— Meus pais esperam que eu esteja noiva antes dos vinte e seis, Max.
— Nuttha, já conversamos sobre isso.
Eu me levanto e ela vem atrás.
— Não, Max. Você conversou sobre isso.
Esfrego os cabelos, todo o meu corpo está tenso.
— Estamos juntos há três anos, você parecia tão decidido há algum tempo atrás. Se formar, casar, construir uma vida comigo.
Eu fico em silêncio, por que não sei o que dizer. Eu era tão diferente há um tempo atrás, há dois anos atrás.
— Eu vi as fotos do seu novo ensaio com P'Tul.
Volto meu olhar para Nuttha, seu rosto está um emaranhado de emoções que eu não consigo decifrar.
— Você nunca se interessou pelo meu trabalho, por que viu as fotos?
Nuttha joga os cabelos para trás como sempre faz quando algo está incomodando-a.
— Eu estava em um café com umas amigas, elas estavam concentradas no celular e de repente as fotos pularam no rosto delas. Elas fizeram alguns comentários que me incomodaram e...
— Que comentários?
  Nuttha empina o queixo em minha direção.
— Que vocês pareciam um casal bem real.
Dou um sorriso sarcástico.
— Será que é por que temos que parecer um casal real?
— Não é só isso, Max. As coisas mudaram desde que você e P'Tul se conheceram. Eu nunca interferi em seu trabalho, nunca vi seu trabalho com o P'Tul e sempre respeitei tudo que vocês precisavam fazer mas...
— Isso é ridículo.
Nuttha cruza os braços.
— Então me responda uma coisa e eu esquecerei tudo isso e assumirei que é ridículo e que é coisa da minha cabeça.
— O que é?
— Você sente algo por P'Tul?
Eu sempre fui péssimo em mentir, o garoto da verdade, como meus amigos sempre me chamaram. Naquele momento sou tomado pelo peso da pergunta de Nuttha, e como em um filme, todos os momentos em que passei com Tul surgem em minha linha de visão. Eu me sinto bem com ele em minha vida, posso ser eu mesmo com ele, e ele me conhece como ninguém. E é então que eu começo a questionar meus sentimentos. O que eu sinto por ele? O que eu sinto por Nuttha? Eu não sei.
— Eu não sei. — Respondo derrotado.
As lágrimas começam a rolar pelo rosto de Nuttha.
— Você ainda me ama, Max?
Um soco no estômago doeria menos.
— Eu não sei, é tudo que eu posso dizer. Eu não sei.
— Então eu acho que você precisa descobrir, certo? Você precisa descobrir para que possa escolher, escolher o que quer.
— Do que está falando?
Nuttha pega sua bolsa e limpa rapidamente as lágrimas que insistem em cair.
— Tchau, Max.
E ela sai porta afora, me deixando ali sem entender nada. Um relacionamento de tanto tempo terminar assim?
Sento no sofá com as mãos no rosto pensando no que aconteceu nos últimos minutos.
"Escolher o que quer", as palavras de Nuttha ressoam na minha cabeça, como se tivesse um gravador ali só para que eu pudesse ouvir essas palavras.
Penso na garota que acabou de sair do meu apartamento e respiro fundo. Agarro as chaves do meu carro e saio rumo a noite quente de Bangkok.

                                              * * *

Toco a campanhia três vezes até que alguém vem abrir a porta.
O rosto sorridente quando me vê, como se já estivesse esperando por mim, e talvez estivesse. Estudo bem seu rosto: Olhos, boca, nariz. É tudo perfeitamente no lugar, como se tivesse acabado de ser esculpido.
— Vai ficar me olhando ou vai entrar?
Sua voz soa divertida, nada zangada por eu estar ali tão tarde.
Sinto tudo dentro de mim se acender. Não, eu não diria se acender, eu diria incendiar por que agora posso ver que já estava aceso há algum tempo, eu só não estava enxergando.
Aceito seu convite e entro, sendo inundado pelo seu cheiro que toma todo o seu apartamento.
— E então, está com fome? — Me pergunta indo pra cozinha.
— Tul?
Ele se vira pra mim.
— Sim?
Eu dou um sorriso olhando para seu corpo bem definido, ele está apenas vestido em sua calça de dormir listrada azul clara.
— Estou faminto.

Contos que devem ser contados • MaxTulOnde histórias criam vida. Descubra agora