Capítulo 04 - O meu melhor segredo

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Sentada na última mesa redonda no canto do refeitório, senti a presença de alguém ao meu lado — o que era um fato surpreendente —, já que ninguém costumava sentar-se comigo.

Ao direcionar meus olhos para o lado, avistei Austin e sua bandeja no lugar que até então estava vazio.

— Posso me sentar com você? — Perguntou mais como uma afirmação.

— Você não precisa fazer isso. — Neguei.

— Isso o que? — Perguntou e suas sobrancelhas se uniram em confusão.

Revirei os olhos e voltei a encara-lo.

— Eu irei te dar aulas, isso não significa que tenha alguma outra obrigação comigo. — Avisei. — Estou bem assim.

Austin enfiou uma garfada de purê em sua boca e dessa vez ele quem revirou os olhos.

— Não estou aqui porque me sinto obrigado. — Revelou.

Olhando discretamente pelo refeitório, percebi os olhares de seus melhores amigos e dos populares em nossa mesa. Com certeza ninguém estava entendendo o fato dele estar ali.

Senti vontade de expulsa-lo. Essa era a minha realidade. Apesar de amá-lo, não gostava da atenção que estávamos chamando.

Durante o almoço um tanto desconfortável, Austin talvez tenha tentado se enturmar comigo — ato que sou péssima quando se trata de fazer novos amigos — e ficou falando sobre suas dificuldades na matéria que o ajudaria.

— Você precisa procurar entender a matéria. — Revelei. — Quanto mais afastado estiver, mais dificuldades irá encontrar.

Ele sorriu forçado e me senti aliviada quando o sinal tocou para nós retirarmos.

Ficar muito próxima dele me causava sensações diferentes. Sentia minhas mãos passarem a tremer aos poucos e suarem.

Eu poderia ser um pouco mais corajosa e aproveitar o momento e me aproximar de verdade. Quem sabe tentar conquista-lo.

Quase correndo. Essa era uma boa descrição quando o fim da aula chegou e sai pela sala como um furacão, quase arrastando a minha própria mesa com a velocidade.

Sentia olhares para mim e aquilo estava acabando comigo. Quando cheguei em casa, deixando as mãos sobre os joelhos e respirando fundo por conta da mini corrida até ali, agradeci por nenhum aluno de lá morar na minha rua.

— Por que está suada? — Mamãe perguntou calma ao meu lado, fazendo-me sobressaltar com o susto.

— O que está fazendo em casa? — Perguntei colocando a mão sobre o coração. — Você não pode me assustar assim.

Ela riu e beijou a minha testa.

— Cheguei mais cedo. — Respondeu. — Você almoçou na escola?

Balancei a cabeça concordando. A minha vontade era negar porque sabia que ela estava aprontando algo na cozinha — mesmo que não fosse o seu forte — o cheiro estava divino.

— Ah, que pena. — Falou desanimada. — Estou fazendo lasanha.

Meus olhos brilharam e de repente a barriga que estava cheia simplesmente desapareceu. Sabia que tudo aquilo era gula e não fome, mas eu não me importava.

— Não tem problema se eu comer um pedacinho. — Anunciei.

Mamãe sorriu com meu comentário e fomos juntas para a cozinha.

Como papai não estava em casa, nos sentamos no balcão da cozinha para não precisar sujar a mesa. Enquanto ela retirava a lasanha do forno, coloquei os pratos e os copos de suco sobre o mesmo.

— Eu tenho um segredo. — Mamãe contou. — Mas é um mega segredo.

Um fato sobre nós duas: nós amávamos segredos. Uma das coisas que amávamos compartilhar uma com a outra eram segredos.

Isso era algo que podíamos falar que era só nosso. Uma exclusividade de nós duas.

— Conta logo! — Pedi ansiosa.

Mamãe foi até os armários e retirou de dentro uma caixinha. Enquanto eu enfiava mais uma garfada de lasanha na boca, ela caminhava até onde eu estava sentada e deixou a caixa na minha frente.

Estava muito ansiosa. Tanto que demorou um segundo para que eu desfizesse o nó que permitia a caixa estar fechada.

Lá dentro avistei mais um monte de papel branco, o que foi necessário retirar da caixa e encarar pequenos testes de gravidez. Meus olhos embaçaram, quem sabe pelas lágrimas que estavam se formando.

— Isso é verdade? — Perguntei sem acreditar. — Você está grávida?

Ouvi o soluço do choro dela e a olhei nos olhos. Nós duas estávamos chorando feito crianças e nos abraçamos no meio da cozinha.

Eu estava muito feliz. Ninguém no mundo saberia o quão feliz eu estava. Meu coração havia encontrado um novo repouso.

Mamãe e eu combinamos em dar a notícia para papai no sábado à noite, quando comemoraríamos o seu aniversário de quarenta anos.

Nós havíamos planejado uma festa, papai mesmo quem montou sua própria lista. Ele não gostava de surpresas, mas tenho certeza que amaria essa.

E então eu esqueci um pouco da minha vida. Esqueci de contar sobre Austin ter passado o horário de almoço comigo e pela primeira vez em meses eu não ter almoçado sozinha.

Estava feliz e nos encontrávamos sentadas no sofá da sala fazendo planos. Outro fato sobre nós: amávamos planejar.

— Estou perto de completar o quarto mês. — Contou. — A médica disse que é normal a menstruação de algumas mulheres grávidas continuarem vindo.

— Isso é o máximo! — Afirmei animada. — Quer dizer que teremos que esperar menos.

Mamãe estava com seu notebook em seu colo. Como de costume escrevendo mais um livro ou fazendo anotações sobre eles. Eu era a sua principal leitora e fã número um — mas precisa competir este posto com papai —.

Papai chegou em casa tarde. Ele era um homem sereno e despreocupado. Não costumava trazer os problemas para casa. Deitou-se sobre nós e senti vontade de chorar por saber daquele segredo.

O abracei forte e mamãe ficou me encarando com medo, como se a qualquer momento eu fosse contar o que estava acontecendo.

Respirei fundo e olhei para o teto a fim de evitar que lágrimas caíssem.

— Por que está tão carinhosa hoje Amélia? — Papai estranhou e por um segundo vi a mesma feição curiosa que havia visto mais cedo em Austin.

— Nada ué. — Dei de ombros. — Preciso tomar banho.

Durante o banho, parei para imaginar o quão grande teria que ser o nosso amor a ponto de termos um filho com essa pessoa.

Quer dizer, nós sabemos que nem sempre existe amor no ato de engravidar. Mas neste caso específico, sim.

Eu amava Austin. Ele era o meu primeiro amor. Apesar de muitas vezes imaginar uma família ao seu lado e vários mini Austin, tentava pensar se meu amor era o suficiente para isso.

Era nessas horas que eu tentava acessar meu computador e quem sabe escrever algo meu. Ver mamãe tão feliz escrevendo livros, fazia com que eu ficava curiosa para por em prática o meu talento.

Eu tinha talento? Qual era? Talvez eu seria uma co-autora. Conseguia esboçar varias ideias para mamãe expor em seus livros.

As vantagens de não se APAIXONAROnde histórias criam vida. Descubra agora