Eu, sinceramente, não sabia o que estava fazendo. Há meses não saía de casa para nada e agora estava indo conhecer uma garota que perdeu o sentido pela vida, sendo que eu mesma não via sentido em muita coisa.
Parei em frente ao prédio e dei um assobio. Era um condomínio em um dos melhores bairros da cidade. Estacionei o carro em uma vaga de visitante e fui anunciar minha chegada ao porteiro. Pra variar, ele demonstrou certo choque com o meu rosto. Bati no peito diversas vezes e disse que estava acostumada com isso, que não me afetava mais. Mas era mentira.
Olhei pra ele com cara de poucos amigos, o que literalmente era verdade. O cidadão ao menos poderia ser um pouco mais discreto. Não ficar com os olhos arregalados seria de bom grado. Disse o nome do tal Oliver e em menos de 10 minutos lá estava eu, desconcertada dentro de um apartamento bem mobiliado.
— Gostou? — perguntou Oliver, percebendo minha avaliação do lugar. Ele me encarava sentado em seu sofá, que rangia quando ele se movia um pouco.
— Aconchegante, mas um pouco masculino demais para o meu gosto. Falta cor, sabe? — despejei, enquanto olhava de forma discreta mais um de seus ternos bem passados. Antes que ele pudesse responder, emendei outra pergunta: — Você nunca usa outra coisa que não seja terno?
— Um advogado enfrenta muitos obstáculos e um deles é a vestimenta. Mas geralmente quando relaxo não estou de terno. Eu faço equitação.
Não consegui segurar um riso frouxo de deboche, chegou a entrar água gelada pelo meu nariz. Ele havia me oferecido um copo logo que cheguei, e aceitei.
— E você relaxa? Vive empertigado — disse, ainda sentindo as narinas arderem, com a água que as invadiram.
— E você sempre descarrega um monte de pergunta inconveniente quando visita as pessoas? Cadê os comentários triviais como: "que bonito apartamento, a localização daqui é ótima, tenho uma amiga que mora no prédio do lado"?
— Se tem uma coisa que eu não sou é trivial, talvez seja por isso que meus comentários sejam mais interessantes que os costumeiros.
— Isso eu não vou poder discordar de você — disse ele, dando um sorriso tímido. Sorri também, quer dizer, foi um meio sorriso, algo mais ligeiro que o bater de asas de uma mosca que foge de um golpe de travesseiro. Foi quando assumi o que eu tentava negar, que eu gostava desse tal Oliver, que simpatizei com ele e com aquele jeito de "fera" na vida profissional e perdido na vida social.
Não que a minha vida social fosse uma maravilha. Mas um dia tinha sido muito satisfatória. Eu era basicamente o centro da maioria dos eventos em que ia. Não poderia dizer o mesmo do advogado reservado que agora olhava apreensivo pela porta.
— A maçaneta virou — disse ele um pouco aflito.
— Calma, é só uma maçaneta!
Logo entendi que o nervosismo dele não era o simples mover da bendita maçaneta, mas era quem estava atrás da porta. A menina entrou como um furacão, gritando com uma voz de trovão:
— Por que foi perguntar de mim na escola? Fiquei sabendo hoje pela inspetora de alunos que você esteve lá! Quando ia me avisar? Seu grande ditador! — berrou a menina.
Juro que tentei entender a roupa dela. Tentei buscar na memória modelitos de estilistas ditos modernos e que gostavam de extremos. Mas sinceramente não achei nada que remotamente lembrasse aquilo.
Era nitidamente uma garota sem noções de moda tentando mostrar que queria ter um estilo próprio usando diferentes estilos já conhecidos. Em resumo, a vestimenta era excêntrica. Ela se equilibrava em cima daquela coisa de borracha, que não deveria se chamar calçado, como um equilibrista se equilibra em uma corda feita de chiclete.
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Degustação - A youtuber
RomanceCompleto na Amazon. O conceituado advogado Oliver tinha tudo o que queria, uma carreira de sucesso e a mulher dos sonhos, porém, com as guinadas da vida, agora vivia em função da irmã adolescente, que precisava de sua ajuda. Até o dia que o destino...