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Gostava de dizer que alguma coisa aconteceu. Mas a verdade é que a minha vida continua na mesma rotina monótona. Passo os dias com James em casa, por vezes vamos ao parque. Ou visitar os bisavós. Ou então o avô Philip. 

Confesso que as visitas ao avô Philip são as que eu mais gosto. Conversar com ele alegra-me um pouco, mesmo que ele diga sempre a mesma coisa: 

–Tens de superar– ele diz frequentemente apontando para a placa de identificação de James que eu trago ao pescoço.  

E ainda acrescenta: tens de sair de casa, conhecer pessoas novas, começar a trabalhar, e mais um monte de coisas que ele consegue dizer na forma de frases bastante motivacionais. E quando ele fala tudo parece possível, mas é só até eu voltar à realidade e perder-me novamente na minha tristeza. Depois vem a fase da frustração por não conseguir superar. 

A única coisa que me tem distraído nos últimos tempos é o casamento de Kate. Tudo porque ela decidiu marcar o casamento para daqui a dois meses! Só pode ser louca, eu demorei praticamente um ano a organizar o meu.

E eu, como sou a mais desocupada das madrinhas, fiquei encarregue de todos os preparativos chatos. Não que eu me queixe, eu realmente não tenho mesmo mais nada para fazer.

Kate já começou a procurar alguns lugares, a pensar no tipo de decoração e, claro, no vestido! Ela está mesmo feliz, e a viver um dos momentos mais importante, e também stressante, da sua vida, falo por experiência própria.

O meu tempo de noivado foi incrivelmente especial. Tudo foi um conto de fadas, durante um ano inteiro de expectativa para o grande dia só havia espaço para amor, emoção e felicidade. E depois de tanto tempo, quando finalmente chegou o dia, foi perfeito.


Há cinco anos atrás...

«–Ao amor– eu digo enquanto levanto o meu copo de champanhe.

–Ao teu dia amiga!– Vic acrescenta antes de brindarmos.

Hoje é o grande dia. Eu e as minhas madrinhas passámos toda a manhã e uma parte da tarde a arranjar-nos, posso dizer que tive mesmo um dia de princesa. Agora é hora de entrar no meu vestido de noiva e casar com o homem da minha vida.

Estamos no quarto onde eu costumava ficar quando vinha passar férias com os meus avós maternos, porque eu não consigo imaginar um lugar mais especial para casar do que a quinta deles, onde os meus pais também casaram. 

Lá fora, temos o ar puro, os sons da natureza e o verde a perder de vista. Flores em tons de vermelho decoram todo espaço bem como várias luzes e velas para deixar o ambiente bastante romântico. O altar improvisado está montado junto ao lago, decorado com um arco de flores. A festa vai ser também ao ar livre, as mesas estão dispostas num terraço e decoradas com motivos rústicos, várias luzes suspensas por cima das mesas iluminam o espaço e para completar inúmeros arranjos de flores estão espalhados por todo o lado.

–James vai ter um trabalhão para abrir este vestido, Amora!–Vic brinca enquanto acaba de apertar os botões do meu longo vestido branco de renda que ela própria concebeu, não fosse ela uma aspirante a designer de moda. 

Quando enfim estou pronta, a emoção nos olhos das minhas madrinhas é visível e depois de um último abraço elas saem do quarto para se posicionarem junto ao altar.

Não fico muito tempo sozinha, pois os meus pais não tardam a entrar, vendo-me pela primeira vez hoje. E se até aqui eu não tinha chorado, agora vendo-os tão comovidos, eu não consigo mais segurar, e uma lágrima de felicidade rola pelo meu rosto. 

–Estás tão linda, minha querida– a minha mãe diz após limpar a minha lágrima e me abraçar.

–Eu ainda não acredito que o meu bebé vai casar– o meu pai acrescenta com os olhos brilhantes depois de me dar um carinhoso beijo na bochecha.  

–Nem eu pai– respondo tentando a todo o custo segurar o choro.  

–Mas nada de choros. Que o James está lá em baixo à beira de um ataque cardíaco à tua espera!– a minha mãe diz prática como sempre. Como eu costumo dizer, o coração derretido da relação é o meu pai, que está a tentar controlar a emoção a todo o custo para não chorar.

Depois de uma última olhada no espelho, saio do quarto amparada pelo meu pai de um lado e pela minha mãe do outro, desço as escadas e caminho até à saída.

Passo pela sala onde tantas vezes eu ouvi a minha avó a contar-me a sua história de amor com o meu avô, passo pela porta que dá para o salão onde os meus pais casaram, passo pelo jardim onde tantas vezes eu brinquei com o meu irmão e os meus primos, passo por baixo da árvore onde estão gravados os nomes dos meus pais dentro de um coração, e é por entre todas estas memórias que chego junto ao lago.

E lá está ele, o amor da minha vida, à minha espera. Os convidados levantam-se e ouvem-se os primeiros acordes da música, e só  neste momento James se vira para mim. Inicio a minha caminhada até ao altar, sempre amparada pelos meus pais e de olhos postos em James que sorri para mim enquanto várias lágrimas rolam pelo seu rosto.

Apesar de ser um percurso bastante pequeno, parece que demora uma eternidade para percorrê-lo. Até finalmente chegar junto dele. Depois dele cumprimentar o meus pais com um abraço, ele volta-se para mim.

–Eu sou o homem mais sortudo do mundo– ele diz no meu ouvido após me dar um beijo na testa.

E o momento pelo qual tanto ansiámos chegou. O sol ameaçava esconder-se e foram os seus últimos raios dourados que nos iluminaram no momento em que dissemos sim.»

(Sobre)Viver Sem TiOnde histórias criam vida. Descubra agora