"Não é fácil, mas também não é impossível"

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Xiao Rou

Agarrada a Mi Le sinto o vento batendo contra minhas pernas, me seguro mais forte na cintura dela aproveitando o conforto e a familiaridade que sinto quando estou perto dela, deixo minha mente vagar sentindo uma liberdade plena como se eu pudesse respirar livre.

Paramos em uma loja de conveniência e Mi Le me pede para esperar, quando ela volta me entrega uma sacola e saímos de novo tomando uma rodovia. Levamos alguns minutos e vejo uma placa de relance e só depois me dou conta de onde estamos, é a primeira vez que passo por aqui e finalmente posso matar minha curiosidade. Ela estaciona e me pega pela mão me levando para a borda da ponte onde a extensão do oceano faz com que eu me perca, uma imensidão negra e brilhante.

Abro a sacola e começo a rir, contando aleatoriamente deve ter pelo menos dez sorvetes.

-"Sorvete?" – pergunto de cenho franzido.

-"Eu amo sorvete especialmente o inverno." – ela pega dois sorvetes e me oferece um deles.

-"Por quê? É congelante o suficiente no inverno, não entendo como pode gostar.".

-"Se não quiser eu quero." – ela segura a minha mão e encosta o sorvete nos meus lábios rindo.

-"Eu nunca disse que não queria, mas ainda quero saber a história por trás disso." – Mi Le sorri e concorda com a cabeça.

-"Não é nada extraordinário ou traumático, na verdade é tudo muito simples. Minha família é estável, nunca passei necessidades e fui respeitada pelas escolhas que tomei desde a minha sexualidade e faculdade, todos amamos sorvete, minha mãe, meu pai e minha irmã e quando viajávamos para lugares muito frios era como um ritual de família, nós ficávamos conversando e rindo, não era perfeito, tinha brigas e nem sempre concordamos uns com os outros, brigávamos pelos últimos bolinhos e quando alguém comia meu miojo favorito, minha mãe odiava ver meu uniforme jogado no chão e eu não colaborava muito, mas mesmo assim quando as coisas ficavam difíceis para mim e tinha que fazer escolhas difíceis ela comprava sorvetes e conversávamos então não posso te impressionar com minha infância ou adolescência, eu sou total e absolutamente normal independentemente do que digam." – processando em minha cabeça as palavras de Mi Le, penso em como a naturalidade e sua calma me trazem confiança, paz.

-"Ainda assim é impressionante. Pode parecer inconivente, mas eu queria te perguntar como foi pra você se descobrir... Entender quem você era de verdade? Não precisa responder se não quiser." – respiro fundo sentindo um frio na barriga ansiosa pela resposta.

-"Acho que desde criança, minha mãe quando comprava roupas pra mim eram vestidos, saias, sapatilhas essas coisas, e quando eu comecei a acompanhar ela procurava moletons, casacos de coro, calças mais largas e tênis foi natural, eu nunca tinha saído com garotos e nem ia á festas escondida, não escrevia cartas de amor aos meus professores e nem olhava a bunda dos jogadores de futebol. Um dia, eu devia ter uns 15 anos eu vi uma garota na escola eu me senti diferente e muito confusa, cheguei em casa e disse á minha mãe "Mãe eu vi uma menina hoje e meu coração está palpitando até agora", lembro que ela largou a colher que estava segurando e se aproximou de mim, me envolveu em um abraço apertado e ficou lá chorando por um tempo agarrada á mim. Eu fiquei pensando o que eu tinha feito de errado para ela ficar assim, me senti culpada, mas ela me soltou e me olhou sorrindo e disse "Tudo bem meu amor, quando eu te levar para a escola amanhã me deixe conhece-la". Sinceramente não sei dizer o que ela sentiu naquele momento decepção, medo, alegria, mas ela sorriu. Eu sabia que eu não era como as outras meninas e meus pais também, só que eu me aceitei sabia que não seria fácil e estudei muito para entender tudo e depois que entendi contei aos meus pais, "Eu gosto de garotas" não recebi críticas, não me senti julgada ou pressionada á me desculpar por ser quem eu era.".

-"Você não me odeia pelo que meus pais disseram quando te viram?" – pergunto cabisbaixa.

-"Não nunca pensaria nisso, também não guardo rancor de sua família. Xiao Rou o fato das pessoas falarem sobre mim não me incomoda, eu nunca pensei nem um segundo sequer em mudar quem eu sou para satisfazer o ego de ninguém, são apenas rótulos que as pessoas dão para o amor e eu não sou um rótulo, sou uma pessoa, sou humana e sei que minha vida está sendo construída de acordo com o que eu acredito, eu escolhi amar quem eu quiser, escolhi me vestir como eu quero sem me esconder. É normal se sentir cansada eu também me senti e fiquei insegura em alguns momentos, mas pra mim o amor é simplesmente amor sem uma definição de quem tem direito de compartilhar dele." – meu peito se enche de uma felicidade por ouvir cada palavra de Mi Le, não seguro a vontade de abraça-la e me engancho nela ouvindo as batidas do seu coração, ela me abraça de volta e beija o topo de minha cabeça.

-"Tenho tanto orgulho de você Mi Le, obrigada por me contar." – ficamos aconchegadas uma na outra com o vento gélido batendo contra nossos rostos.

Música: James Arthur - Say you won't let go 

Boa Leitura! 

Breaking With LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora