O ouro do pecado

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"Palavras verdadeiras podem não ser agradáveis, palavras agradáveis podem não ser verdadeiras." - Provérbio Chinês


Os opostos fogo e gelo, trevas e luz são essenciais para o equilíbrio. Porém, entre estes, um se sobrepõe ao outro: gelo ao fogo, luz às trevas. Com os deuses irmãos funcionava ao contrário. O fogo derretia o gelo, as trevas devoravam a luz, o mal vencia o bem, a malícia corrompia a inocência, a lascívia dominava a pureza. Sin submetia Jin.

Preso a correntes douradas, o corpo alvo e recém recuperado dos arranhões arfa sobre o altar. A mesma unha de ouro que lhe causou marcas vermelhas, agora, circula seu interior sem piedade. Dói, mas lhe satisfaz. É viciado no turbilhão de emoções contrárias. Está ciente de que é errado e que profanam o templo, entretanto, não param. Sentem-se cada vez mais tentados a cometer tais atos obscenos. E bem debaixo do nariz de sua mãe, Jinsil, a deusa soberana da Verdade.

Sua intimidade está em atrito com a do loiro dominante que continua a cutucá-lo na entrada. O lugar que devia ser sagrado, está quente como o inferno. Seu irmão, Sin, é como o próprio demônio encarnado, exalando luxúria com olhos ardentes, sorriso demoníaco e movimentos pecaminosos. Ele morde de novo o pescoço de Jin – que logo se cura – e sussurra em seu ouvido:

– Por que você não está enlouquecendo com tudo isso? – sibila perigoso e para de se mexer, já que o outro não havia gemido uma vez sequer.

O moreno se recusa a responder. Está sim enlouquecendo, mas se contêm. Ele é o mais velho, o responsável, o exemplar, o deus da Luz e da Pureza na terra, o deus de personalidade de ouro, não pode perder para o mais novo. No entanto, ele sempre consegue o que quer. Controla quase tudo a sua volta, incluindo Jin.

Antes de nascer, fora proferido que teria um diren, sua contraparte. Imaginar que seria seu próprio irmão, com quem dividiu o útero de sua mãe, estava fora da esfera calculada de qualquer um. Muito menos o fato de serem tão atraídos um pelo outro. Os sacerdotes dizem que os opostos convergem para igualar a balança da existência, garantir sentimentos mútuos de repulsa e estabelecer o conceito de bem e mal. Independentemente se há um pouco de mal no bem e vice-versa.

Os gêmeos deveriam se odiar, lutar até a morte a cada encontro e o fazem, porém, seus confrontos são íntimos e resultam em prazeres absurdos para ambos. O desprezo cessa quando se encaram e sentem uma energia única fluindo através deles. E tudo começou quando atingiram a maior idade divina, a qual todos os seus poderes foram liberados. O Sacerdócio Mestre temeu pelo duvidoso futuro de Sin e sua essência impura. A deusa da Verdade, então, decidiu por exilá-lo do Palácio de Ouro, visando a segurança das demais entidades e seus fiéis. A rivalidade dos irmãos apenas cresceu com a distância. Contudo, o amado, imaculado, a esperança de todos, o deus Jin, sentia-se vazio e incerto sobre si. A necessidade de estar com o odiado, maculado, o desespero de todos, o deus Sin, era inadmissível e confusa. Quis entender o porquê de não o detestar de verdade quando próximos; o porquê de suas ações traiçoeiras de roubar o símbolo dourado que pertence ao mais velho; de sua aparência contrária a personalidade e seus toques serem cativantes.

O mais curioso é o ser banhado em ouro o desejar tanto e ousar dizer vez ou outra que o ama. Irônico demais serem filhos da Verdade e fingirem antipatia. E, em noites de lua minguante, no fundo do templo da mãe, eles se consumirem nas mentiras que alimentam os outros.

Hoje, em meio as carícias nada gentis, Jin decidiu que tudo que faziam era um erro e teria falado com Sin se ele não tivesse lhe introduzido o dedo, gerando sensações de deleite. Morde o lábio inferior com força, cerrando os olhos. Sabe que está sendo observado pelo outro e que acaba de denunciar o quanto se segurava.

O pecado do ouroOnde histórias criam vida. Descubra agora