Os sonhos vão fazer você chorar

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Eu morri aos poucos,

mas a parte mais difícil de morrer

é precisar acordar todos os dias.

Eu queria tanto que você ficasse,

eu implorei para você.

Então porque?


Juan me deixa em casa, então se despedimos sem trocar mais nenhuma palavra. Vejo ele indo embora e minha vontade é que fique mais um pouco.

Ao entrar em casa, encontro apenas meu irmão. 

Desde que minha mãe casou-se com meu padrasto eles não param em casa em nenhum final de semana, fico feliz por ela e por mim e em parte pelo meu irmão, porque agora ao invés de ser uma mãe super controladora, ela prefere aproveitar sua vida. Meu irmão é minha maior preocupação, seu estilo de vida e suas companhias não são nada saudáveis.

Sempre ouvi dizer que os pais pecam na educação do segundo filho, mas em nossa família foi ao contrário, meu irmão mais velho, Alan, é o tipo de homem que eu não desejaria para nenhuma mulher, problemas sérios com temperamento, além de não saber lavar um prato, sem contar o espírito vagabundo que habita nele. 

Ao subir as escadas, escuto Alan gritar.

-A mãe mandou eu te dar o recado que amanhã vamos todos almoçar na casa da família do novo papai.- Fala ele com sarcasmo.

Alan nunca gostou da ideia de minha mãe arrumar outro homem, e talvez esse sentimento tenha feito a vida dele sair dos trilhos totalmente. Mas ele não ousa falar isso na frente de minha mãe ou de meu padrasto, pois é ele que paga sua faculdade e todas suas regalias.

Apenas afirmo com a cabeça e saio, não somos muito próximos e nunca fomos também, pelo menos não tanto desde que nosso pai morreu.

 Chego ao meu quarto e aproveito para tomar um banho e  logo me deitar para dormir. Tenho que recuperar as energias para o almoço em família, era tudo que eu menos queria. Deixo que meus pensamentos vagueiem para longe, geralmente escrevo afim de desabafar tudo que se encontra nas cavernas de minha mente, mais certas coisas são dolorosas demais para se por em um pedaço de papel.

Minha mãe querer que eu e meu irmão marquemos presença em um almoço da família de seu marido, Roberto, é um absurdo. Eu tento não culpa-lá por tudo, mas meu lado egoísta as vezes vem a tona e, a culpa  por permitir a morte de meu pai. Por não ter dado o suporte suficiente. Ter apenas feito as malas e me levado aquele dia, deixando meu irmão e meu pai para trás. Não ter sido a mulher dele quando ele mais precisava.

Parando para pensar meus sonhos morreram naquela noite.

Ele me ensinou a andar de bicicleta, me deu meu primeiro livro. Me apoiou nos estudos e na vida. Falou que quando eu me formasse estaria de pé na primeira fileira aplaudindo orgulhoso fosse qual curso eu escolhesse. Ele me ensinou o significado do amor e mostrou-me na mais pura essência como é amar. Meu super herói que um dia acreditei ser invencível, foi derrotado. Ele tinha respostas para tudo, menos para o sentido da vida. E isso o derrotou, de forma que nem eu e meu irmão não fomos motivo suficientemente bom para ele poder escolher viver.

No fundo eu o culpo também.

Culpo a todos porque é mais fácil assim, culpo a eles porque eles tem sua parcela de culpa. Mas quem é que não tem uma parcela de culpa sobre a vida dos outros nesse mundo? 

Matamos uns aos outros sem se darmos conta, ou melhor, sabemos quem estamos prejudicando quando compramos produtos feitos por meio da exploração e do trabalho escravo de crianças e adultos, ou quando destruímos descaradamente o meio ambiente matando os milhares de organismo vivos que contribuem para nossa espécie, ou quando praticamos bullying com um colega de escola sem saber que vamos arruinar sua vida pessoal e profissional, ou quando consumimos produtos cancerígenos mesmo sabendo que vamos morrer em decorrência de seu consumo desenfreado.

Se você não está se matando, está matando alguém.

Somos agentes indiretos, todos temos sangue em nossas mãos.

Eu juro que tento todos os dias não pensar nele, mais meu pai permanece em minha mente o tempo todo, e saber que ele não estará presente nos momentos mais importantes de minha vida, dói como se eu já estivesse no inferno. Mais eu permaneço firme, eu traço planos e metas e as sigo minuciosamente, porque talvez estando no controle de minha própria vida, eu possa me sentir feliz por ainda estar aqui. 

O mundo não é justo e nunca vai ser, mas eu não tenho que concordar com quem vive nele e tem pensamentos extremamente otimistas sobre as relações humanas. Há um ritmo, e se, o mundo está pegando fogo, devemos dançar ao ritmo das labaredas.

Foi por vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora