Capítulo 11

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Depois de minutos entendiantes esperando os resultados dos exames, ouvi alguém chamar meu nome. Era a enfermeira me chamando para preencher alguns dados da ficha. Levantei os olhos e a segui, mas devido a minha visão desfocada, acabei esbarrando em um homem fantasiado que passava depressa pelo corredor.
— Desculp… — Ele parou de falar assim que olhou para mim. Vi uma figura com nariz de palhaço, com a cara toda pintada, mas não consegui distingui muito bem os desenhos no rosto dele, culpa da miopia e do astigmatismo, eu sou quase uma cega sem os meus óculos.

— Oi… E-e perdão, moça… — Ele gaguejava com a voz rouca.
Em seguida se afastou de mim e puxou a enfermeira para um canto, a mesma entregou imediatamente o papel com as minhas informações para ele.
Depois de passar lendo minha ficha, ele se virou lentamente…
— Lembra de mim? — Escutei a voz dele como em um sussurro.
— Você é o… — Esforcei ao máximo minha mente para lembrar. Mas a minha memória falhou miseravelmente. E a falta de nitidez dos meus olhos contribuíram para o insucesso no reconhecimento, ainda mais com ele fantasiado de palhaço — Desculpa, mas eu não reconheço você — ri envergonhada.

Ele passou um minuto calado, e eu tirei de um lado do bolso da minha calça velha os óculos quebrados, sinalizando uma das explicações para minha "amnésia". Acho que ele entendeu, porque depois resolveu dizer quem era.
— Estudamos juntos. Meu nome é… — E lá estava ele gaguejando novamente, isso estava realmente cômico, até que ele limpou a garganta e completou —…Me chamo Jack.

— Que engraçado, tenho um amigo chamado Jack também. — Forcei novamente minha memória — Mas não lembro de ter estudado com outro Jack, não. Estudamos no Evermmy juntos?

— Isso, no Evermmy. — ele passou as mãos no cabelo.

— Então tá, Jack — Eu ri com a situação. E nossa, eu poderia jurar que ele estava nervoso de estar ao meu lado — Jack, por que dispensou a enfermeira?

— Eu falei que poderia ajudar você. — Ele tocou no meu braço quando disse a última palavra, e o simples toque do seu dedo me causou um arrepio na espinha.

— Não faz sentido um garoto de provavelmente dezessete anos assumir o lugar de um profissional de saúde, não acha?

— Sou voluntário — Ele falou de imediato. — Faço brincadeiras com os doentes da ala infantil.

Dei um sorriso com a informação.
— Ganhou meu respeito, garoto.

— E como eu vi uma moça bonita pelo corredor, pensei que não seria um pecado desviar minha atenção pelas próximas horas… — Ele sorriu e em seguida tocou na minha mão me guiando pelo corredor.

Aposto que meu rosto estava vermelho com aquele comentário.

— Deixe aqui fora qualquer tristeza. Okay? É o meu lema como palhaço. — Ele colocou a mão direita no coração, demonstrando a seriedade do seu lema. Não tinha como não ri com o jeito dele— Meu papel hoje é distrair você pelas próximas horas. E eu não aceito não como resposta. Não te dou esse direito.

Jack o Palhaço era divertido, e a ideia era ótima, porque eu não queria lembrar das últimas horas, dos últimos meses e no quanto minha vida se afundou ainda mais. Quanto mais eu conversava com o palhaço Jack, mais a vontade eu me sentia. De banalidades da vida, conversamos sobre planos para o futuro, e aí o assunto ficou sério. Eu acabei dizendo todas as minhas angústias para ele. E me perguntei mais de uma vez como eu não havia notado ele no meio da multidão de alunos do Evermmy, porque ele sim é o tipo de pessoa que se vê no meio da multidão.
Ele não falou muito sobre ele, mas fiquei feliz por ele querer saber tanto sobre mim, quanto mais eu falava, mais ele sorria. Acho que faz parte dos palhaços ser feliz com a felicidade dos outros.

                               ×××

— Olha só, quando você olha muito para uma coisa ruim, ela fica boa. — Jack estava me ensinando sua nova técnica de sobrevivência para dias ruins — Mas a diferença não é você olhar, mas é você saber olhar. — franzi o cenho enquanto Jack falava sua teoria — Presta atenção, se eu olhar para alguém com confiança essa pessoa se intimida. Mas aí que está a questão, não foi o olhar para a pessoa, foi olhar com confiança.
Ele apontou para si mesmo antes do completar
— Agora me olhe com um olhar de confiança e me intimide. Os psicólogos dizem que isso ajuda a desenvolver uma mente melhor.

— Jack, não mesmo. Nem vou saber diferir quando você estiver intimidado ou quando estiver normal. Não sem meus óculos.

— Deixa disso. Eu te aviso quando estiver me sentindo intimidado com sua autoconfiança.

Depois de meia hora tentando lançar um olhar no mínimo intimidador, caímos na risada enquanto ele fazia piadas dos meus olhares que eram tudo, menos ameaçador.

— Você é um palhaço — falei rindo — Literalmente. — gargalhamos — Pensei que você fosse trazer alguma lição para esse seu desafio de olhar intimidador.

— Mas eu trouxe. — Ele disse rindo, sua risada era agradável de se ouvir. — Você é péssima em intimidar. .

— Nossa, grande conclusão — nós conversavamos como se fossemos amigos a séculos.

— Ah, você também é ótima em cair em pegadinhas que envolvam pesquisas quanto ao psíquico humano. — ele falava rindo — Agora falando sério, a lição do dia é: não seja ameaçadora só porque as pessoas querem que você seja. Seja você, Mirella. Seja gentil quando as pessoas esperarem que você surte. Essa é melhor vingança.

— Te declaro você o palhaço mais sábio que eu conheço. — Digo entrando na brincadeira

— Provavelmente devo ser o único palhaço que você conhece. — Ele disse se divertindo.

— Sim — disse enquanto Jack fazia cócegas. — Para, seu doido. — falei rindo.
A proximidade do corpo do palhaço Jack e de seu rosto me deixou por um momento paralisado, e senti o corpo de Jack rígido também. Nossas respirações estavam próximas, e nos lembravam da distância mínima entre nossos lábios. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, nossos lábios se tocaram, e se me perguntassem quem se aproximou primeiro eu diria que os dois e ao mesmo tempo nenhum dos dois, foi tão rápido e tão devagar que só percebi que meus braços estavam envoltos ao seu pescoço quando os braços dele envolveram firmemente a minha cintura. Suspiramos juntos. O sentimento inundou meu peito, e o beijo do palhaço carregava um sentimento intenso, que por um momento me deixou em choque, mas depois me deixou inebriada.
Quando nos afastamos senti a respiração ofegante minha e dele, e só então percebi que os passos de alguém se aproximavam da porta.
Era o médico, com o exame em mãos. O apaixonante palhaço entrelaçou seus dedos nos meus e me trouxe uma sensação agradável. Ele me lançou um sorriso gentil enquanto esperávamos ansiosamente as palavras do doutor.

Sorri, eu me sentia pela primeira vez verdadeiramente feliz depois de tantos dias turbulentos.

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⏰ Última atualização: Dec 16, 2018 ⏰

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