Sinhá Mariana andava depressa. Sebastião não sabia se ela já o havia notado ou o ignorava, só sabia que ela não olhava para trás. Ele vinha em seu cavalo e com os escravos de cada lado a pouco mais de cinco metros. Sem fazer muito barulho, na verdade. Ela segurava as compras contra o peito e pisava firme na terra, uma poeira vermelha subia, manchando a parte de trás do seu vestido azul, que pouco antes estava como novo.
Mariana era uma boa menina. Gostava de ir à igreja todos os dias, mesmo quando não tinha missa. Estava sempre com um terço na mão e sempre procurava fazer de bom grado o que o pai lhe pedia. Sua mãe morrera a algum tempo antes de Sebastião chegar, mas ninguém lhe dizia de quê. Ela aceitava as ordens do pai, pois ele era muito bom para ela, sabia que a filha gostava desse rapaz que estava estudando fora, e ele também era jovem – devia ter vinte e dois anos. Então estava tudo bem na vida da menina – não fosse por Sebastião.
A menina sabia que sempre que o capataz a via, ele a seguia. Isso a cansava, e ela mesma, mesmo sendo proibida pelo pai de falar com outros homens sem estar na presença de mais alguém, já havia falando para Sebastião que parasse com a perseguição, que ela poderia lhe emprestar uma de suas criadas para ele fazer o que quisesse, mas, como um cão que segue o próprio rabo, o capataz só tinha interesse na menina. Talvez o fato de ser um amor não correspondido e proibido o atiçasse.
Ele já ia lambendo os lábios, olhando para a silhueta que o vestido apertado fazia na menina quando falou cortando o silêncio.
– Eu sei que você me notou. Não precisa fingir – silêncio. Os escravos estavam a todo o tempo de cabeça abaixada, e o caminho até a casa da sinhá era deserto. Um caminho estreito de terra e mato seco de um lado e de outro. Havia uma cerca de arame farpado e estacas velhas de um lado, mas do outro havia apenas mato e rocha em abundância. – Por que você faz isso comigo? A sinhazinha sabe que eu me apaixonei, não mando no meu coração. A sinhazinha manda no seu próprio coração?
Sem responder nem mudar seu ritmo, a menina continuava sua caminhada. Por baixo do vestido ela era só suor e tremedeira. Mais cedo, seu pai havia mandado que um dos escravos fosse até a mercearia, mas ela se ofereceu no lugar com o pretexto de que queria sair. Mesmo o pai insistindo que ela fosse com o capataz da fazenda ela disse que iria sozinha, que preferia assim, pois poderia conversar com seus pensamentos. Não imaginava ela que iria se encontrar com Sebastião. Agora estava arrependida. Logo quando chegou à porta da mercearia mais cedo, quando avistou Sebastião, a menina pensou em voltar, mas como percebeu que ele a havia visto, ela decidiu que era melhor ignorá-lo e esperar que ele não a incomodasse, como acontecia em algumas ocasiões. No entanto, agora, eles estavam praticamente sozinhos.
Sebastião fez o cavalo cavalgar mais perto da menina. Ela assustou-se e deu um salto para o lado, dando passagem para ele ir embora, mas ele insistiu. Os escravos foram pegos de surpresa, e o da esquerda, que estava debilitado por causa do sangue que agora secava em seus olhos, quase caiu. Mas o fato é que os pulsos de ambos criaram hematomas por causa do puxão que receberam.
– Eu sou louco por você, você sabe disso. Me dê um beijo e eu vou embora. É tudo o que eu peço – a menina continuava em silêncio. – Não sabe que esse seu silêncio é que me deixa com mais vontade de te ter? Continue me ignorando e eu continuarei te seguindo, até o dia em que eu irei te possuir.
A menina parou e levou uma mão ao rosto, começando a chorar. Sebastião parou mais à frente. O escravo do lado direito levantou a cabeça para olhar para a menina, mas Sebastião o chutou fazendo sua orelha cuspir sangue, e ele desistiu da ideia, abaixando a cabeça novamente.
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O Criado Mudo
Short StoryUma época de preconceitos, racismo e escravidão. Intrigas por terras e romances proibidos. Pessoas clamam por liberdade, por voz e vez.