Capítulo 2 - Vitrola

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- Esse é um clássico. - Essa foi a primeira frase que eu ouvi sair da boca dele. E ele a disse com um sorriso que me deixou quase que completamente vermelho.
- Sim... - Eu estava ficando suado mesmo que estivéssemos em um clima nada quente, e por isso resolvi não dizer mais nada.

Paguei o disco e saí com muita vergonha de ele ter percebido meu nervosismo. Eu me preocupei em gravar completamente o rosto dele em minha mente. Percebi que seus olhos eram exatamente da cor do céu quando o sol já se foi mas ainda não anoiteceu completamente. E era exatamente assim que o céu estava enquanto eu voltava pra casa.

Seu cabelo era loiro e enrolado, como a representação que a igreja católica tem para anjos. Se ele estivesse usando uma roupa branca, e não a camiseta vermelha da loja, isso passaria da barreira da coincidência. Talvez eu só ainda estivesse muito vidrado no livro sobre como as representações do catolicismo para a santidade contribuíam para que o homem ocidental branco fosse privilegiado que eu li nas férias.

Eu cheguei em casa com o disco e mostrei pra a minha mãe.

- Eles ainda vendem vinil hoje em dia?
- Sim, é tumblr ouvir músicas nesses negócios antigos.
- Tumblr?
- Esquece. Vamo ouvir?
- Claro. Pega a vitrola do teu avô aí nessa caixa.
- Eu não faço a menor ideia de como usar isso.
- Deixa que eu boto, menino.

- Oh yeah, oh right, will you gonna be in my dreams, tonight? Cantamos todas as letras de todas as músicas.

- Mãe. - Eu disse no colo dela, já cansado dos exatos 47 minutos fazendo o controle da TV de microfone.
- Oi, filho.
- Eu vi um menino na loja, e ele era bem bonito. E eu fiquei com muita vontade de falar alguma coisa com ele. Talvez pedir o número ou sei lá. Mas eu só fiquei vermelho.
- Isso é mais normal do que 'cê imagina. Eu também ficava assim quando eu achava alguém bonito na tua idade. Talvez vocês se vejam de novo. A cidade é bem pequena, e não tem muitas escolas, então vocês podem acabar estudando na mesma. E talvez você tenha mais confiança pra falar com ele da próxima vez.
- Obrigado de verdade por dizer isso, mãe. Te amo.
- Também te amo, filho.
- Eu vou pro meu quarto.
- Tá. - Disse enquanto me dava um apertado abraço.

Azul de quase noiteOnde histórias criam vida. Descubra agora