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Samantha

No avião

Santiago

Chile

16 anos

- Mãe, quando vamos para um país que tenha neve? Fico vendo os filmes e sinto cada vez mais vontade de ir – falo enquanto ela vasculha algo na bolsa.

- Querida, não é tão simples. Primeiro por dependermos das transferências do trabalho, sem contar que sabemos o quanto seu pai não suporta frio.

- Acho que a Sam está certa, mãe. Você sabe o tamanho da vontade dela ir. Basta ter neve – Henry se mete. – A propósito, falta pouco para seu aniversário, irmãzinha.

- Nem me fale – coloco os óculos de grau. – Mais um ano em um país diferente, com pessoas, ares e uma escola diferente. Não sei se estou pronta, quer dizer, preparada.

- É só mais um fim de mundo, relaxa. Pensa que lá, pelo menos teremos a praia – Benjamin argumenta. – E é bem bonita, eu pesquisei.

Não estava animada. Não queria mudar novamente e recomeçar em outro lugar. Tudo era diferente quando ficávamos em casa e toda nossa família vinha nos visitar por termos um endereço fixo. Agora, a cada seis meses, tínhamos um novo "lar". Pelo menos não sou filha única.

- Já deu saudades do Chile – Henry falou com um sorriso. – Amava aquele lugar.

- Saudades do Chile ou da garota que você quase namorou? – Ben debochou – Aposto que ela nem vai lembrar do tempo que tiveram juntos.

- Cala a boca, idiota – dá um tapa na testa dele, estava entre os dois. – É claro que a Alicia vai lembrar, agora fica quieto, que nem beijar na vida você beijou.

- Meninos, sem briga – suspira. - Novas vidas, novas etapas, se ajudem, por favor – meu pai pede e coloca os óculos escuros. – Escolham um filme, conversem, ouçam música ou durmam, mas não se matem – ele vira de lado e fecha os olhos, lembro que não dormiu quase nada.

A essa altura, minha mãe já tinha cansado das revistas de moda e repassava alguns e-mails antigos. Ben capotou rapidamente também.

- Ei – Henry chamou. – Tudo bem? Seus olhos estão vermelhos – fecho os olhos por uns instantes e os abro. 

- Está tudo, menos bem. Sinto falta de quando éramos mais novos e nossos pais achavam melhor ficarmos num mesmo lugar por causa da infância, aquela estabilidade que tínhamos era sem igual – respondo sem conseguir encará-lo.

- Sam – segura minhas mãos. – Sei que sente falta de casa, nós três sentimos. Nossos pais sabiam que seria dessa forma, chuto que não queriam ficar longe da gente, especialmente do Benjamin – me puxa para seu peito. – Eu também sei que estou bem longe de ser um bom irmão mais velho e que deveria ser mais presente na vida de vocês, ao invés de ir a festas ou sair com meus amigos, mal paro em casa e isso não é novidade.

Eu sinto falta da minha proximidade com ele, depois que começou a sair mais, ficou difícil vê-lo com frequência, apesar de nos vermos todos os dias, costumávamos dormir na mesma hora.

- Ry, não se cobra tanto, relaxa. Você está no último ano do colégio, tem que aproveitar, ano que vem é faculdade. Temos nossas brigas de irmãos, normal, toda família é assim. Enquanto estivermos unidos, tudo ficará bem. Não me importo que vá nas festas, vejo seu rostinho lindo todo santo dia. Às vezes, enjoa ficar em casa – o encaro. – Você é presente, irmãozão.

- Ah, cara, eu não sei. Papai sempre falou que como irmão mais velho, tinha a obrigação de cuidar de vocês, eu faço tudo, menos isso.  Eu sinto falta de estarmos todos em família, em casa, da vovó fazendo biscoitos doces e nos chamando para confeitá-los – suspira. – Isso é uma droga. Essa, é uma das razões das quais fico tanto com meus amigos.

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