Prólogo

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Havia apenas três bancos disponíveis no vagão do metrô, sendo que estava indicado de que eram exclusivamente para idosos. Mas quem liga para isso?, pensou a garota, que no momento que viu o banco desocupado foi correndo para se sentar. Era raro encontrar um banco disponível no horário mais lotado do metrô, então talvez esse fosse seu dia de sorte.

Fazia três horas que estava de pé sem descansar, ou, ao menos, sem encontrar nenhum lugar para descansar. Logo que se sentou, seus músculos finalmente relaxaram depois de um longo dia de caminhada no centro da cidade. Definitivamente, aquela "caminhada" havia lhe custado alguns calos no pé.

Apressadamente, tirou seus sapatos e esticou o pé. Havia tanta gente estranha no metrô que tirar o sapato e ficar descalça era o de menos. Cuidadosamente, apoiou os sapatos no colo e suspirou. Uma das coisas que mais odiava em andar de metrô era as pessoas que ficavam no vagão junto com ela. Ela usava o tão malcuidado transporte três horas por dia durante cinco dias na semana; ou seja, ela passava pelo menos setecentas e dez horas - o que equivale a trinta e dois dias inteiros -, naquele transporte por ano com as mesmas pessoas sem ao menos conhecer elas. Ela sabia quem eles eram - tinha aquele homem gordo estranho que vivia com uma camiseta do Star Wars, aquela mulher peituda que ficava usando shorts curtíssimos e ouvindo funk alto, aquela loira oxigenada que mais parecia um dinossauro usando saia e batom do que uma mulher... - mas ela nem sequer cumprimentava eles. Caso eles se vissem na rua, não é como se fossem parar para conversar. Seria sempre aquele silêncio sepulcral entre eles, e ela sempre seria para eles aquela garota morena e estranha com olhos estranhos.

Um homem se aproximou sorrateiramente e se sentou ao seu lado. Apesar de não estar sol, usava óculos escuros e um chapéu que cobria grande parte de seu cabelo castanho escuro que ia até seu ombro. Era alto, e estava com as mãos enfiadas no bolso do seu casaco sobretudo preto, que era grosso demais para as tardes abafadas de São Paulo. Aquele homem era, logo ela concluiu, um estrangeiro. Ou coisa parecida.

Ela o encarou por alguns minutos. Talvez fosse sua expressão sombria, ou o seu rosto simétrico e seus traços bem definidos, ou até mesmo sua feição rígida, mas havia algo nele que a instigava. A garota nunca vira-o no metrô ou pelas redondezas, o que era muita coisa. Ele se mexia desconfortavelmente em seu lugar, como se não fosse acostumado com não apenas o lugar onde sentava, mas a situação toda que havia se metido. Até que ele pegou-a o encarando.

Ela se sentiu como se ele estivesse olhando sua alma. Era como se todos os seus segredos, problemas e pensamentos fossem expostos com apenas um olhar. A menina logo quebrou o contato visual. Havia alguma coisa naquele cara, alguma coisa...

- Esse lugar não é para idosos? - Uma garota surgiu da aglomeração de pessoas que estavam de pé. Ela devia ter minha idade, pensou a morena. A garota era alta, com a pele tão branca quanto a neve e cabelo vermelho como fogo. Seus olhos eram azuis, claros como água cristalina. Segurava com a pouca força que seus braços finos podiam oferecer uma pasta cheia de folhas, que pareciam prestes a cair a qualquer momento.

- Sim, mas... Bem... - Olhou em volta, tentando arranjar uma maneira de explicar que ninguém ali, infelizmente, estava se importando se o lugar era para idosos ou não. Quando olhou novamente para a direita, viu que a menina havia se sentado do seu lado, no último lugar vago do vagão.

- Relaxa! Eu também preciso me sentar, essas folhas iam cair a qualquer momento. Eu sou contra as pessoas que sentam em lugares para idosos, mas quem sou eu para dizer algo, sendo que eu mesma sento nestes lugares? - A menina do seu lado riu consigo mesma, apesar de não achar a situação engraçada. Passou a mão em seu jeans, que era manchado de tinta que nem sua camisa branca. Vendo a oportunidade de quebrar o silêncio, a morena virou-se novamente para ela.

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