.uma visita tardia

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Estudar.

Pode parecer idiota, mas eu ainda conseguia me preocupar com isso. Mesmo com mortes e fantasmas e tal. Por isso eu estava sentado em frente à escrivaninha, com o livro didático aberto. Infelizmente, a matéria era História. Não que eu não gostasse, pelo contrário, achava muito interessante, mas o assunto me lembrava a aula, e a aula me lembrava a sala de aula, e a sala de aula me lembrava Seulgi, e Seulgi me lembrava o cheiro forte de sangue que eu sentia em meus pesadelos. O solo molhado escorregadio em meus pés. O gosto que senti nos dedos ensanguentados que me impediram de gritar pela luz.

Já tinha praticamente certeza de que iria mal em História. Minha mãe iria ficar decepcionada. Não era exatamente minha culpa se tudo em minha cabeça era luz e sangue. Os conselhos de Baekhyun funcionaram. Esforcei-me ao máximo para me afastar da eletricidade e não reagia aos sonhos. Agora os pesadelos eram bem menos frequentes e nem um pouco vívidos. Mas os que eu tivera antes já haviam feito estrago o suficiente. Era madrugada agora, e eu estudava porque não conseguia dormir.

Mas o medo dos pesadelos não era a única razão para isso. Era também a tempestade.

Nunca tivera medo de tempestades, chuva, água ou qualquer coisa, mas de repente cada estrondo no céu escuro arrepiava todos os pelos do meu corpo. Conforme a madrugada passava, isso só piorava. Outra causa da minha falta de concentração na matéria era a luz. Para estudar eu havia acendido uma luminária, e sua luz parecia pulsar, me atraindo quase que por hipnose.

A luminária piscou.

Levantei a cabeça. Sua luz não havia falhado nem naquela noite, nem nunca. Por que agora? Pus-me de pé e andei até meu criado mudo, abrindo a primeira gaveta e pegando o anel ali guardado. Estava prestes a colocá-lo quando uma porta de meu guarda-roupa abriu e fechou-se rapidamente. Fiquei imóvel por alguns instantes antes de inseri-lo no dedo onde cabia melhor. Quando Baekhyun estava perto, visível ou não, sentia o anel ardendo em minha pele. Quando se aproximava muito de mim, a jóia parecia quase entrar em combustão.

Estava frio como gelo.

Sentindo-me vulnerável e fraco, tirei-o de meu dedo e apertei, quase com raiva. Como se isso fosse trazê-lo até mim. A luminária apagou.

Agora o quarto estava escuro. As cortinas estavam abertas, permitindo que eu percebesse os milhões de gotas de chuva que caíam lá fora.

Fui puxado. Quero dizer, não senti nada em minha pele, mas meu corpo se moveu contra a minha vontade, então eu só podia estar sendo puxado. Até a janela. Parei bem perto dela.

Um clarão. Pensei que ficaria cego com o relâmpago ofuscante, mas vi um vulto no reflexo. Em seguida, o trovão mais alto que já ouvi em minha vida ribombou pelos céus. Meu corpo estava livre agora, então me virei e voltei para a escrivaninha, onde havia visto o vulto momentaneamente. Peguei meu celular para iluminá-la.

Em cima de meu livro, meu caderno estava aberto, nas folhas em branco. Uma delas não estava mais em branco. O papel havia sido queimado, as partes pretas fragmentadas formando letras.

CUIDADO

Desconectei o fio da luminária da tomada e  conectei novamente. Nada. A luminária havia queimado.

***

“Como é estar morto?”

Eu havia perguntado baixinho, bem baixinho, caso minha mãe ou minha irmã passassem por perto. Estávamos eu e Baekhyun no sofá de minha sala. A tevê estava ligada, no canal de notícias, mas com o áudio quase inaudível. Eu estava deitado, e o fantasma deitado praticamente em cima de mim. Era possível vê-lo ali, eu apenas não sentia sua pele, suas roupas ou seu peso, apenas arrepios. Baekhyun parecia pensar em uma resposta.

Deadly Betrayal [ChanBaek]Onde histórias criam vida. Descubra agora