Capítulo 2

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-Vamos! Precisamos voltar antes que eles sintam a nossa falta. – Ele sussurrou tão delicadamente perto do meu ouvido, e sua respiração era como uma briza de ar fresco. A mão dele continuava pressionada em meus lábios. E seu sussurro gelado fizera com que todos os meus pelos ficassem eriçados. Eu estava tremendo quando ele me soltou. Não por causa de todas as sensações que ele me fazia sentir, mas por eles. Aqueles olhos.

Glaciem não disse nada quando me soltou, e se notou que eu tremia, fingiu que não viu. Voltamos para o jardim em silêncio. E tenho certeza de que essas travessias não incomodava somente a mim.

– Lar, doce lar Princesa. – Ele finalmente disse quando parou em frente aos portões do Jardim.

– Você sabe que eu odeio que me chame assim. – Cruzei os braços apertando-os com força na frente do meu corpo. Era uma forma de proteção inútil.

– E como devo chama-lá? – Ele se aproximou de uma forma lenta e calculada. Seus olhos prateados estavam em alerta. E eu verifiquei se minhas paredes mentais estavam intactas.- Você é filha de um Grã- Senhor, herdeira de uma corte e da magia da primavera. - O seu tom era de deboche quando disse isso. – Princesa parece um bom nome para alguém como você.

Eu bufei com seu deboche. – Não parece não. – Seus olhos prateados continuaram me encarando te forma tão íntima que fez as minhas bochechas esquentarem. E ele era um macho muito bonito e sabia disso. Seguro, atraente e sedutor. Tudo o que eu não era.

Não éramos filhos de verdade de Grão- Senhores. Éramos um erro. Fomos criados na Grande Guerra, como armas pelo Caldeirão. Cada Grão- Senhor doou uma parte de seu poder, para que fossemos criados a partir disso.  O que os Grão- Senhores não esperavam é que nós representaríamos a essência de cada Corte. Se nos matassem o equilíbrio da Corte seria afetado, e danos inimagináveis aconteceriam. Eles não quiseram arriscar. Então nós fomos enviados para um lugar sombrio "na dobra do tecido",  criado para não ser visto e nem lembrado. Só assim as Cortes ficariam salvas e eles poderiam viver sem se preocupar com efeito-colateral. Glaciem gostava de dizer que nós éramos filhos e herdeiros das Cortes. Talvez conseguisse dormir melhor assim. Eu não.

– Te vejo no Grande Ritual  Aylla. – Ele deslizou os dedos por uma mecha do meus cabelos. E seguiu de volta para as floresta de pinheiros. Ele passava a maior parte do seu tempo naquela floresta. Ele era da Corte Invernal. Nunca pus os pés lá, e certa vez ele me disse que era apenas frio e solitário, e isso bastou para que eu perdesse o total interesse.

Passei pelos portões de forma sorrateira, o sol ainda não havia saído por completo.  Ele ainda se escondia em meio a nuvens pesadas e ao ar gélido. Obra de Glaciem.

Essa Corte não funcionava, até que o sol saísse e esquentasse o gramado. Moravam ali na Corte Primaveril  apenas alguns féericos. Meu tutor, que me ajudava a controlar meus poderes, manter a Corte viva e o equilíbrio,  Rashner a criada que cuidava de mim, e mais alguns criados, os quais vi poucas vezes em todos esse anos.  Há também criaturas nas Corte, mas não atraem muita atenção para si mesmos. 

Aqui aprendemos sobre nossa Corte, história, tradição e sobre nossos poderes, que só devem ser  usados para manter a Corte viva. Cultivar sua essência, manter o equilíbrio e nada mais. Existem leis para quem usa os poderes de forma... inadequada.

Ella da Corte Outonal, foi a única amiga que tive em todos esses anos, além do Glaciem, se é que posso chama-lo assim. Seus olhos eram de raposa, seus cabelos eram longos e vermelhos. Pareciam chamas acessas. Era forte, determinada e de uma beleza extraordinária. Ela foi pega usando seus poderes, que segundo a Grã-Sacerdotisa Irina, prejudicariam o balanço da essência da Corte Outonal. Nunca mais a vi. E ninguém fala sobre isso. Sinto falta da minha amiga. Do fogo amigo que ela transmitia. Tentei saber o que tinha acontecido com ela, mas Irina acabou com qualquer questionamento antes mesmo de começarem. Fui espancada por três dias e ganhei mais cicatrizes do que eu poderia contar. Irina gostava de se certificar que todos estivessem sob seu controle, e ela sabia muito bem como fazer isso.

Irina é conhecida entre as Cortes com a Pacificadora e a a criadora das leis, mas para mim, ela não passa de uma fêmea obcecada por poder e atenção. Glaciem sempre se mantém longe dela. Ele diz que devemos ficar longe das pessoas que sempre consegue o que querem. Eu  tento fazer o mesmo, mas algumas vezes eu fracasso... e é bem feio.

A Corte dos EsquecidosOnde histórias criam vida. Descubra agora