Ter Aurora sentada em minha cama é algo estranho. O trabalho de biologia que apresentaremos em apenas uma semana exigiu duplas, e como não sou muito sociável, o resultado foi esse: trazer uma quase desconhecida para o meu quarto. Por mais assustadora que seja essa ideia, não deixa de ter aquela pontinha de ansiedade.
Aurora está debruçada sobre o livro, ajeitando os óculos. Tamborilo os dedos no caderno ao ritmo da música que toca no meu celular, já que não tenho a mínima ideia do que mais posso fazer.
- Não vi seus pais - Aurora corta o silêncio após alguns minutos.
- Minha mãe trabalha, chega daqui a pouco - digo, olhando o relógio na cabeceira da cama - meu pai, nem sei.
- Temos o mesmo drama então - ela olha pra mim com um sorriso afetado - o que houve com ele?
- Na verdade minha mãe não fala muito sobre isso, não sei.
Minha resposta rápida deixa Aurora pensativa. Seus olhos que antes estavam fixos no livro se perdem no vazio.
- Estranho... minha mãe também nunca falou detalhadamente sobre meu pai. A impressão que tenho é que ela esconde algo sobre ele.
Começo a pensar que eu e Aurora temos mais em comum do que imaginamos. Mesmo a ausência de meu pai não me afetando completamente, sempre tive certa curiosidade a respeito. Cresci com as mesmas dúvidas, nunca obtendo as respostas que procurava. Até que em algum ponto simplesmente desisti da busca pela verdade e aceitei o fato.
- Sou a única que se sente incomodada com isso? - Aurora corta o silêncio que havia se instalado no ar, tirando-me de meu devaneio.
- Já me senti - digo, dando de ombros - hoje não mais. Acaba sendo indiferente pra mim.
- Sabe, toda vez que passo por algum problema... Penso como seria ter meu pai ao meu lado, pronto pra me ajudar e me ouvir. Minha mãe vive tão ocupada, acabo guardando meus problemas só pra mim. Não quero me tornar um "fardo emocional" - ela faz o sinal de aspas com as mãos.
-Sei como é... Já tentou ir atrás dele de outra forma?
- Tentei conversar com alguns parentes sobre isso - sua voz assume um tom suave - mas sempre que toco no assunto, eles sempre mudam o rumo da conversa.
- Já ouvi dizer de pessoas que procuram na internet, mas não sei como funciona.
Aurora arregala os olhos e pega meu notebook em cima da escrivaninha sem ao menos pedir permissão, como se tivesse tido uma ideia brilhante. Ela suplica com os olhos por agilidade da minha parte quando a tela de bloqueio aparece. Digito a senha o mais rápido que consigo, porém sem entender a urgência da situação.
Os dedos de Aurora são rápidos ao digitar uma série de comandos, extremamente concentrada. Fico curioso com o que ela está fazendo, porém não pergunto nada, apenas aguardo. Após alguns segundos, e com uma leve comemoração, Aurora vira a tela para minha direção.
O site minimalista, contendo um campo de busca com o cursor do mouse piscando e um título amplo chama minha atenção: PROCURE SEUS CONHECIDOS AQUI.
- Tudo o que precisamos são algumas informações básicas. Nome, e-mail, qualquer dado relacionado a pessoa. Alguns sites são mais específicos, mas preciso pesquisar mais a fundo - Aurora diz num só fôlego - Aliás, obrigada pela dica, nem tinha pensado nisso.
Levo alguns segundos para raciocinar e processar corretamente o que está acontecendo. Após tantos anos de busca, tentativas de obter informações que sempre falharam, a resposta poderia estar bem na minhas mãos. O site continha as informações de milhões de pessoas do mundo todo, qualquer dado registrado na rede apareceria ali. Mesmo não sendo uma coisa 100% garantida, me apego a mínima esperança de encontrar quem já esteve fora da minha vida por tempo demais.
- Ainda assim, eu não sei sequer o nome dele - dou um suspiro de frustração.
- Nem eu... Espera - Aurora tira o notebook de minhas mãos e novamente digita alguma coisa que sou míope demais para decifrar - pronto. Aqui são os passos que devemos seguir.
Novamente com a tela voltada para mim, começo a ler rapidamente o título da matéria: COMO ENCONTRAR PESSOAS PELA INTERNET. Nada de especial, apenas dicas sobre como conseguir informações. "Parentes e amigos próximos podem ser de grande ajuda... pequenas informações podem fazer a diferença... Pesquise o máximo possível". Passo os olhos por alto e volto o olhar para Aurora, agora também debruçada sobre a tela do computador.
- É, vamos nessa.
O sorriso puro de Aurora me motiva a sorrir também. Estamos mais próximos da verdade. A mínima esperança já é o suficiente.
"Vamos nessa", respondo mentalmente.
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Vidas Cruzadas
Teen FictionQual seria sua reação ao encontrar alguém muito semelhante a você? Muitos encaram isso como uma coisa normal. Oliver e Aurora também achavam isso. Juntos por acaso, se uniram aos trancos e barrancos em uma amizade improvável. Por tão semelhantes que...