Capítulo 26 - Lembranças

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Meu coração estava muito acelerado, mesmo não sendo comigo, só de pensar, de relembrar os gritos disso eu fico gelado, o humano chega perto de Gotye, ele... meu corpo não responde, assim como eu, o lobo fica paralisado quando o metal toca os seus testículos. Arrepio-me completamente quanto o homem sorri e olha para mim como se eu fosse o próximo. - De você, Kifen... - enfatiza meu nome como se fosse uma piada. - Eu quero respeito. Não só com os humanos. - ele bate a adaga no peito como se ignorasse a chance dela de cortá-lo. - Ele está aqui a mais tempo, é mais velho que você. - agora a arma é mirada para o Gotye que tenta se afastar ao máximo, o olhar dele, assim como o meu, é mergulhado em pavor puro. - Acene com a cabeça se me entendeu, escravo.

Não consigo parar de tremer, balanço a cabeça várias e várias vezes, desesperado, queria ver aquilo longe do lobo, apesar de odiá-lo, não quero que morra. - Ótimo... - então, nosso carcereiro se levanta e gira a adaga na mão como se fosse um graveto inofensivo. - Logo vão ficar sem as mordaças, não quero ouvir gritaria, nem que me supliquem nada, estamos aqui pelos dois, não por mim, estamos entendidos? - eu e o outro Nanci acenamos na hora, movimentos frenéticos. - Excelente... quanto aquela luz. - aponta a única janela que estava atrás de mim, e por como projetava a luz na parede, detinha barras. - Tocar a porta. - completa o caminho breve que a luz fará. - Vão poder falar, e quando ela chegar a metade dela, vocês voltam para as mordaças e para as vendas, sem reclamação. - com um movimento da cabeça, ele simplesmente retorna a se sentar, engulo seco enquanto retorno o olhar para Gotye.

O Nanci estava muito mais apavorado do que eu, muito mais, eu estava realmente assustado, esse humano realmente castraria o Gotye caso quisesse, pude ver isso nos olhos dele.

O lobo ficou quieto, seu peito acalmava junto com o meu, pois, o clima frio, junto ao silêncio, estavam intensos e somente quebrados com o barulho das folhas do livro ao qual o humano lê, e com a luz do Sol que começa a batem no topo das minhas orelhas, assim, após algum tempo o homem refaz uma leve observada rumo ao marcador de tempo que criou, e assim que chega a hora, ele se levanta calmo como sempre e passa a mão em minha nuca, sinto a correia dali afrouxando após um som de metal, bom, ainda não consigo abrir a boca, não até ele puxar a mordaça para frete e tirar a aparte que a circulava dali. A sensação de "liberdade", é muito boa, consigo mexer a mandíbula depois de tanto tempo, mas, não consigo falar nada, o humano faz o mesmo com Gotye, porém, como eu, ficamos apenas olhando para o carcereiro que volta a se sentar, cruza as pernas e retoma a leitura de algo que não identifico por não haver nada na capa, nem... bom, eu não sei ler tão bem...

O tempo passa, eu não consigo mais olhar para nada fora a mim mesmo, sentado, preso assim, tudo por culpa dele, e minha também afinal, admito que fui desrespeitoso, admito que deveria ter me colocado no lugar, mas, como o próprio humano disse, não justifica ele tentar me violar assim, entretanto, um escravo não deve ter orgulhos, ou ego, nosso mestre quer que resolvamos isso, quer que tenhamos um acordo aqui, por isso, já que o lobo não vai fazer nada além de me olhar, falo primeiro.

- Me d-

A sincronia é devastadora, como diabos conseguimos passar tanto tempo calados e falar ao mesmo tempo? É impossível! Todavia, isso tornou o ambiente repulsivo, minha vontade de falar se foi e... Queria nunca mais vê-lo outra vez, queria que ao menos desamarrasse nossas patas e me deixasse ficar longe, não suporto sentir seus dedos tocando nos meus, suas almofadas suando junto com as minhas, esse filho da puta tentou me estuprar, eu não posso perdoar isso assim. - Senhor, posso me deitar? - o humano me olha sobre seu livro e dá um riso breve e debochante.

- Fique à vontade escravo. - agora com permissão posso descansar as costas, mesmo que a alça que prende os meus pulsos esteja cutucando a minha lombar, é melhor que olhar para aquele lobo, muito melhor...

Crônicas de Althurain - O Caçador e a RaposaOnde histórias criam vida. Descubra agora