Prólogo 1 - Malu

5.2K 998 62
                                    

O vento gelado balança meus cabelos, mas, como de costume, eu não me importo muito com isso

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

O vento gelado balança meus cabelos, mas, como de costume, eu não me importo muito com isso. Nasci em Inverleith, e estou acostumada com esse clima úmido, e toda essa névoa deixando a cidade com uma eterna cara de filme de terror. E, como em todas as tardes, desço pela rua Eldon até chegar à esquina do Howard Palace, onde meu pai se encontra com seu violão tocando para os pedestres.

Passei a vir todos os dias buscá-lo assim que aprendi a olhar as horas. Era o jeito mais fácil de trazê-lo para casa e evitar que mamãe passasse a brigar com ele. Todos os dias agora era assim, ele demorava a voltar, e ela brigava quando ele chegava. Eu chorava sempre – escondida, claro, não queria que eles vissem e brigassem mais por causa disso.

Queria que parasse. Tony disse que ouviu mamãe dizer que isso estava acabando. Tomara.

Papai tem a voz bonita, antes mesmo de chegar perto consigo ouvi-lo cantar. Ele está cantando, de novo, aquela música triste. Poeira no vento. Não entendo muito, mas parece bem triste, porque poeira no vento espalha e vai embora. Nunca mais se junta, e isso é muito triste.

Mo nighean ruadh! O que faz aqui, pequenina?

Dadaidh, nem tem graça mais. Sabe que eu venho te buscar todos os dias, e já está ficando escuro.

— Certo, certo – ele reclama, mas sempre tem o sorriso no rosto, como se gostasse dessas broncas. Ao menos eu não grito, acho que é disso que ele gosta.

Papai é bem bonito também. Seu cabelo é da mesma cor do meu, e eu sempre achei muito lindo. Vermelho, igual o céu quando o dia está indo embora – e não tem tanta névoa. Acho que por isso eu gosto tanto, a gente quase nunca consegue ver direito. É diferente, e por isso é bonito. Meu irmão Tony também tem o cabelo vermelho, mas o dele é mais escuro. Quase escapou de ser vermelho, a gente enxerga mais quando está sol.

Ele também gosta de ser diferente.

Mo nighean ruadh, – papai me chama, conforme vamos subindo novamente a rua Eldon, até chegarmos em casa. A rua é bem grande, sempre dá tempo de termos boas conversas – preciso te contar uma coisa.

— Pode contar. Eu vou ouvir tudinho.

— Logo você vai mudar de Edimburgo.

— Não! Eu não vou, papai, sou criança... Só tenho cinco anos, lembra?

— Cinco anos, tudo isso! Meu bebê cresceu muito rápido.

— Sim, já sou enorme.

— Você e Tony vão embora com a mamãe para o Brasil.

Logo meu cérebro começa a fazer contas, porque ele disse eu, Tony e mamãe.

— E você? – Paro no meio do caminho, já não gostando nem um pouco dessa história.

— Eu vou ficar. A casa do papai é a Escócia, e a casa da mamãe é o Brasil.

— Mas aquela música que você sempre canta diz que a casa é onde o coração está...

Ele não responde. Mas isso é algo que eu só iria entender anos depois.

-----

Nota da autora: Inverleith é um subúrbio no norte de Edimburgo, na Escócia, na periferia da região central da cidade

Nota da autora: Mo nghean ruadh - minha ruivinha (em gaélico)

Nota da autora: Dadaidh - Papai (em gaélico)

Siga para o próximo capítulo, onde você encontrará o prólogo do nosso delegado

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Siga para o próximo capítulo, onde você encontrará o prólogo do nosso delegado.

Entre Oceanos [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora