Aconteceu de novo.
Ocorreram discussões por aqui, e até brigas, e sinceramente, eu estou exausta, cansada e dolorida, tudo para achar uma saída desse problema.
Todo dia eu madrugo procurando uma resposta nos meus livros, leio e releio cada página, como uma desesperada, mas eu não acho nada que faça sentido, ou que me ajude.
E ainda tem o garoto.
Aquele maldito garoto.
Ele tinha que aparecer bem quando as coisas ficam estranhas? Ele só dorme! Parece até um adolescente folgado. Estou sentado na minha escrivaninha com mais de 50 livros antigos encima da mesa.
Toc toc toc
Batidas na porta me despertaram, eu levanto minha cabeça, mas não vejo nada a não ser pilhas de livros a minha frente, levanto da cabeça e vejo uma garotinha com olhos molhados, prestes a chorar.
— Tia Anna? — Ela é a filha do padeiro, seus cabelos loiros estão despenteados e seus olhos vermelhos, seu nariz está vermelho e ela não usa luvas, nem cachecol e nem mesmo uma toca ou protetor de orelhas, deve ter saído as presas de casa. Estalo os dedos na direção da lareira e o fogo come mais forte as lenhas, deixando o ambiente mais quentinho e confortável.
— O que houve pequena? — perguntei fechando a porta e a levando para mais perto da lareira, ela sentou no tapete vermelho felpudo e eu agachei ficando perto de seu rosto.
— Meus pais estavam fazendo tortas para a feira de guloseimas amanhã e-e eles começaram a brigar, os vizinhos também ouviram e entraram na briga, agora estão todos lá fora, nesse frio, brigando, pensei que a Senhorita pudesse fazer alguma coisa.
Me levantei indo para a minha estante de poções, mas fazê-los pararem de brigar pra tomar chá, não parecia ser uma ideia muito eficaz, fui até a cômoda e peguei um lençol preto, cobri a menina para que se sentisse mais quentinha e fiz um chá pra ela, em poucos segundos ela já estava dormindo. Coloquei meu casaco e um cachecol e depois sai em direção à padaria.
No começo pude ver um amontoado de gente, parecia ser uma rodinha, elas estavam apontando o dedo umas para as outras, algumas até davam tapas tirando os dedos da frente de seus rostos.
— O que está acontecendo? — perguntei com a voz firme, mas ninguém pareceu me dar atenção, pareciam vidrados em falar palavras rudes - e insultos sobre a quantidade de amoras a se colocar em uma torta— Está certo então.
Esfreguei minhas mãos uma na outro, estalei os dois dedos ao mesmo tempo e sussurrei palavra calmas.
— Certo, agora cada um de vocês irão até suas casas e irão tirar grandes sonos, repletos de sonhos adoráveis. — Mexia meus dedos enquanto eles paravam de brigar e andavam para suas respectivas casas, senti uma leve resistência, mas fiz mais esforço e consegui colocar todos em suas casas, olhei para o céu aonde já estava escuro e tratei de voltar para minha farmácia.
A garota ainda dormia, toquei em sua têmpora para ver se estava confortável, quando tive a confirmação tratei de terminar de procurar uma saída para o meu problema.
Peguei um livro muito antigo, graças aos meus feitiços de preservação, as folhas não estão tão amarronzadas e comidas por traças. Eu tinha que ter cuidado, pois era um livro antigo, não só cheio de energia, como magia rondava suas páginas.
Vários capítulo me chamavam atenção e batiam com os acontecimentos que estavam rondando pelo vilarejo.
Trolls corujas, tinham esse nome pelo hábito noturno de andar por aí e pela sua inteligência, eles emanavam energias negativas, trazendo desconforto e brigas ao lugar. Mas se tivesse algum ser místico pelas redondezas eu saberia.
Sapos fluorescentes, minúsculas criaturas noturnas que pulavam de vaso à vaso de plantas, deixando um rastro colorido porém fatal nas flores, acabava indo para o pólen aonde as abelhas o pegavam e espalhavam pelo ar, fazendo com que as pessoas ficassem de mau-humor.
Também não era isso, só tínhamos abelhas no verão e primavera e ainda estávamos no outono.
Presença de outros feiticeiros intrusos também causam discórdia, já que sua magia não combina com a magia local e pode reagir de uma maneira catastrófica em seres não mágicos.
Também não. Sentiria se tivesse alguém desconhecido no meu local mágico.
Mas não tem?
— Droga — murmurei um xingamento e fui em direção à porta que dava acesso à enfermaria, passei por vários leitos até chegar ao que eu procurava.
Ele estava deitado na cama, tinha olheiras escuras e profundas debaixo dos olhos fechados, a luz da noite entrava pela janela junto com alguns flocos de neve que caiam lá fora, seus lábios estavam secos e o copo de água ainda estava intacto aonde a enfermeira deixou.
Abaixo o olhar e respiro fundo, achei finalmente o motivo.
Era ele, quando levantei o olhar vi seus olhos azuis brilhando assustadoramente, um azul tão forte brilhando no local mau-iluminado, é assombroso o quanto seus olhos de safira me encantam e me deixam assustada, mas logo lembro o que ele está causando e minha expressão de fecha.
Vou até sua maca e o pego por baixo do braço, ele se assusta com o meu toque, seu corpo está quente e eu acho que ele pode estar com febre.
Com o outro braço, pego em sua cintura e ele grita pelo meu ato inesperado.
O pego e jogo no meu ombro, como se ele fosse um saco de batatas.
— Mas que porra? — ele xinga e grunhi enquanto tenta sair do meu aperto, mas eu só faço questão de sair dali e ir para minha casa, aonde fica longe do vilarejo e o pessoal fica longe de riscos maiores.
Quando a neve toca seu corpo ele parece se acalmar e ficar arrepiado, ele se encolhe um pouco e eu tenho que revirar os olhos.
Demorou certa de 10 minutos, quando chegamos o joguei encima da minha cama com uma leve delicadeza, mas pude ouvir ele resmungar.
Aticei o fogo com um estalo, ele ficou verde e logo foi para seu estado normal, laranja amarelado.
O garoto me olhava por onde eu ia, seu olhar me queimava e fazia minha nuca coçar, mas eu tentava ao máximo não deixar nenhum rastro de desconforto.
Sentei na cadeira da minha escrivaninha e levantei a minha saia até as coxas, finalmente o vi desviar o olhar.
Tirei as botas pretas e a meia que não ajudava nada, abri a última gaveta e peguei meias de lã, senti um conforto muito maior quando as coloquei, tirei meu casaco, ficando apenas com minha blusa branca, o espartilho de couro e a saia comprida e vermelha de cós alto.
Me levantei e coloquei meus dois braços para trás enquanto o olhava, seu olhar voltou a fixar no meu e eu pude ver com mais clareza suas sardas, ainda com a mão atrás das costas eu desabotoava o espartilho, não fazendo o soltar de vez, mas afrouxando, na frente soltei o laço e comecei a passar a corda pelos buracos. E ele desviou corando mais uma vez, quando o espartilho já estava longe do meu corpo, tirei a minha blusa de dentro da saia, fazendo ela ficar solta e grande. Sentei na cadeira e o olhei fixamente.
— Vamos começar. — eu disse com a foz forte e o olhar fixo nele.

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Amor Gelato
RomansaO frio aqui é perigoso. Não perca o equilíbrio se tiver andando em dunas de neve. Lembre-se de sempre andar com roupas quentes. Cuidado com os dias em que o sol não aparece e os ursos podem te matar. Bem vindo ao Alaska, o lugar aonde, vo...