O Toque.

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Capítulo revisado, 26 de dezembro, 2020.

Nós estávamos bem mais íntimos na terceira semana das férias. Como amigos, eu sabia que precisaríamos termos uma boa relação já que teríamos que conviver juntos. Mas sempre estávamos ótimos, desde o começo. Não era bem a intimidade que eu queria ter com ele mas era até boa. Mesmo sabendo que nunca será o suficiente.

Aquele dia já estava pela metade e me lembro dele me dizer que gostaria de ir até o centro da cidade para comprar novos livros. Não tínhamos internet naquele época, era tudo muito calmo e as melhores formas de se entreter era o MP3 ou ler. Tínhamos uma TV também mas ninguém gostava de assistir. Ele dizia que queria novos livros para poder se inspirar novamente, queria voltar a escrever mas não sabia por onde começar. Naquele dia apelidamos o centro da cidade de P, seria o nosso código para dizer que iríamos sair.

Eu queria poder apelidar nosso quarto, mas não tínhamos um. Queria poder ter apelidado de P. e sempre chamá-lo de paraíso porque seria para lá que iríamos todas as noites. Ele talvez nunca imaginou isso. Mesmo depois do fim daquelas férias. Eu tinha acabado de sair do banho, me enrolei na toalha azul que eu adorava e me dirigi ao meu quarto no fim do corredor. Havia pegadas d'água no chão e provavelmente M. brigaria comigo quando as visse. Encostei a porta e busquei pela minha melhor roupa. Sempre iria querer impressiona-lo, busquei renovação. Usar aquela roupa que eu não usava a tempos. Coloquei meu suéter preto e minha cueca box preta. O dia não estava quente como na semana anterior, o vento nós arrancava calafrios. A bagunça do meu quarto me deixou aventureiro o suficiente para não conseguir achar minhas calças. A porta rangiu como no meu sonho. Como eu imaginava, como eu queria que rangisse todas as vezes em que o imaginava adentrando aquele cômodo. O meu quarto.

— Esse suéter é realmente muito bonito — Falou enquanto adentrava o quarto e se sentava em minha cama que por sinal, eu não havia arrumado. Me lembro de toda aquela bagunça, eu gostava dela. Gostava de como minha organização se perdia no meio dessa confusão. Eu gostava do meu mundo. Mas ele, ele era a minha bagunça, ele bagunçava tudo em mim e sua presença era mais que o suficiente para me deixar em estado de choque.

Eu estava semi nu a sua frente, ainda de costa para a sua pessoa mas tímido o suficiente para ter outro motivo para não se virar. Sua voz, aquele momento, naquela circunstâncias a sua voz me agitou. Me deixou nervoso e excitado. Estávamos nós dois em um cômodo, agora com uma porta encostada. M. tagalerava músicas no andar de baixo. Não havia nada mais ali naquele quarto além de mim e ele.

— Está aqui a sua calça, espero que seja essa na verdade. Eu sentei em cima dela sem querer. — Falou, e agora eu podia ver seus sapatos porque ele estava parado em minha frente. Ouvi uma leve risada e peguei a calça que estava em sua mão. — Não demora, temos que voltar cedo ou a patroa vai nos matar! — Agora sua voz estava ficando distante, o rangido da porta voltou a meus ouvidos e eu pude ver que ele havia saído.

Eu não disse uma palavra se quer. Nada. Mas sua risada... Será que ele notou minha ereção naquele dia? Eu pensava em desfazer tudo, tirar minhas roupas e ficar em casa. Cancelar esse passeio para P. e simplesmente me trancar por alguns dias. Estava com vergonha do que ele iria achar de mim, do poderia ser nossos próximos assuntos. Eu estava com vergonha de mim, agora.

Não poderia me deixar levar por meus pensamentos ridículos. Tortuosos o suficiente para me fazer desistir de qualquer coisa que me convenha. Eu havia colocado minhas calças e meus sapatos. Ajeitei aquilo que naquela hora não estava mais tão animado quanto na hora em que o homem cujo eu desejava estava no quarto.

Me lembro de ter me despedido de M. naquela tarde e de entrar no carro dela com ele. Ele no volante e eu no banco do passageiro. Olhei o caminho que percorriamos até o centro de P, me lembro das paisagens daquela linda cidade. Das casas que enalteciam o bairro, as árvores que fazia tudo ficar mais lindo. Talvez hoje em dia elas nem existem mais. Me lembro dos olhares curtos que ele dava para mim durante a viagem. Como se estivesse conferindo o homenzinho que lhe acompanhava ao centro. Eu gostava disso. Gostava dessa maneira de conferir a situação, de poder observar a sua volta e tentar entender o que se passava na cabeça das pessoas. Era o jeito dele de entender o mundo, de entender como as coisas funcionavam ou como eram. Eu poderia também estar completamente errado, ele poderia ter apenas olhando pra mim sem nenhuma intenção qualquer. Sem nenhum intuito, ou propósito. Ele só pode ter olhado, simplesmente, não havia nada que o impediria de fazer isso, de observar.

Até BreveOnde histórias criam vida. Descubra agora