superando os fatos- 4 capítulo

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Meu pai e eu estávamos no quintal, jogando bola um para o outro, brincando como duas crianças, mas parecia que pela última vez em toda minha vida. Eu usava a chuteira que ele me deu, ou meu primo que deu, Ah, sei lá. Eu olhava pra os meus pés, enquanto a bola ia e voltava.

_ Júlia?

_ Oi?

_ Por que tá olhando pro pé?

_ Ah, sei lá. _ Digo, pensativa_Pai!

_ Oi?

_ Lembra aquela época que você disse que esse esporte era violento, e que eu não devia jogar?

_ Hum, lembro.

_ Se você disse isso, então por que me comprou uma Chuteira?

Ele sorri, buscando aquelas lembranças do passado, momentos valiosos na vida de um ser humano.

_ Por que eu sabia que você gostava, e ia ficar feliz por isso.

_ Mas...

_ Eu sei, eu sei.

Ele parou a bola com o pé e se aproximou colocando a mão no meu ombro.

_ Filha, você gosta, é isso que importa, e se você sente que deve fazer, mesmo que todos digam pra não fazer, até mesmo eu, não escute os outros, escute seu coração. Mas leva esse juízo também! Se ainda tiver.

_ Ei!

Rimos.

_ Estou brincando. Então, vamos entrar que está tarde e você... banho, mocinha.

_ Por que? Eu sou uma princesa. _ Faço uma careta.

_ As princesas também tomam banho.

_ Poxa! _ Brinco.

Depois disso ele já tinha ido embora. Se despediu de mim com um abraço suave e um beijo na testa. Ele prometeu me ver todos os finais de semana. Disse que alugou um lugar pra ficar, e que me levaria pra conhecer em breve. Eu estava feliz por ele estar feliz já que não precisaria aguentar a mamãe gritando com ele o tempo todo. Mas estava triste pelos dias que iriam se seguir sem ele, e não ve-lo mais em casa. Seria tempos difíceis. Mas eu sabia que iria conseguir superar. Afinal, nem sempre as pessoas nasceram pra dar certo, e não temos culpa de nada que acontece na vida dos nossos pais, eles nos escolheram depois de escolherem suas vidas, que culpa temos? São simplesmente as consequências depois do que se colhe. Mas tudo bem, eu respirei fundo e disse a mim mesma que tudo daria certo.

Passaram se os primeiros dias desde que papai foi embora, pra ser sincera eu não estava conseguindo superar, ao menos sair do quarto, eu estava realmente deprimida.

_ Júlia! _ Minha mãe grita.

_ Que foi, mãe?

_ Sai desse quarto agora!.

_ Aí, que saco!

Eu abro a porta com os olhos irritados pela claridade da luz, vejo minha mãe na cozinha e vou até ela.

_ Sim, senhora?

_ Até que enfim, pensei que tinha morrido lá dentro.

Guilherme apareceu na cozinha pegando um biscoito.

_ É, Júlia, a casa tá uma bagunça e você dormindo de pernas pro ar. Que coisa feia!

_ Não se mete, Guilherme.

_ Júlia, isso é jeito de falar? Desde quando você fala assim com o seu primo?

_ É, Júlia, desde quando? _ Guilherme provoca.

Respiro fundo pra não perder o controle, e sair correndo de volta pro meu quarto e me trancar, era o que eu geralmente faria.
A campainha toca, o carteiro gritando do lado de fora, minha mãe vai atender. Mas não sem antes me deixar uma tarefa.

_ Júlia, vai lavar essa louça.

Detalhe, eu não tinha sujado nada, devia ser Guilherme e seus amiguinhos idiotas jogando vídeo game aqui em casa ontem a noite. Ele simplesmente riu da minha situação. Que raiva daquele sorrisinho cínico dele. Ficou me olhando.

_ Que foi? _ Susurro inexpressiva.

_ Se deu mal, viu, quer dá uma de durona.

Eu contei até 20 pra esquecer a presença dele e torcer pra ele ir embora. Comecei a lavar a louça e depois ele já nem estava mais ali. Graças a Deus. Eu estava chateada, por que ninguém entendia isso ou por que ninguém tentava me animar? Preferiam me culpar e me fazerem de empregada. Que saco.
Depois de lavar a louça e arrumar a casa, depois de fazer tudo, almoço e lavar a louça outra vez que eu pude ter paz. Eu fiquei do lado de fora, olhando para o nada, pensando no que fazer, se é que eu faria.
Até meu primo aparecer outra vez.

_ Ou, sua mãe falou pra você ir comigo pro campo.

_ Eu não quero ir. _ Digo sem ânimo.

Pra mim não querer ir alguma coisa muito séria estava acontecendo. Gui percebeu, porque ele ficou me olhando parado segurando sua bola.

_ É... _ Ele começa e eu olho pra cima, com tristeza profunda esperando que ele entendesse que eu não queria ficar sozinha e que precisava me distrair. _ Então tá, Tchau.

Ele não entendeu. E se foi, andando sozinho na rua deserta do meu bairro. "Que idiota" sério isso?

Mais tarde minha mãe me chama outra vez, me tirando do quarto.

_ Vai se arrumar, vamos na igreja hoje. _ Diz.

_ Mas a gente nunca vai à igreja.

_ Agora vamos, algum problema?

_ Não, senhora.

_ Vai logo se arrumar, que 7:30h temos que estar saindo.

Eu obedeço, indo para o quarto e me arrumo depressa, quase sempre seu fazia trança no meu cabelo, ou deixava ele preso, por ser ondulado crespo_ mais nas pontas_ era um saco pra pentear. Guilherme voltou logo depois sendo arrastado pela Dona Dalva, minha mãe, pra igreja. Quando eu desci de blusão e sapato ela me olhou torto de cima a baixo.

_ Que isso?

_ Isso o que?

_ Você não vai sair assim comigo. Coloque uma roupa descente, Júlia! Que horror, você já é uma moça bem grandinha pra não saber se vestir.

_ Meu pai não se importaria com a minha roupa.

Ela se irritou.

_ Acontece que seu pai não está mais aqui, e ele não sabe nada sobre como uma menina deve se comportar. Esqueça o seu pai, Júlia, agora vai ser do meu jeito e não vai ter moleza, não.

Agora eu que estava irritada.

A princesa do futebol (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora