Ligo todas as bocas do fogão. Ponho no máximo...
Escuto o fraco zumbido do gás a sair e paro um pouco. O cheiro ainda é fraco e não me incomoda, serei capaz de deixar por quanto tempo ligado?
Ando pela cozinha a ver se me entendo, se consigo existir sem a tristeza a dar-me as mãos. Quero continuar a caminhar pela casa, mas os meus pés andam para trás e para a frente no mesmo sítio.
Sinto que não tenho pressa pelo que me passa pela cabeça, pois pelo menos neste exato momento sei que ainda existo.
Os meus dedos e mãos dançam pelo balcão, passam pelas gavetas e abro uma.
Isqueiro ou fósforo?
Sou louca ou suicida?
Nem tudo é meu, a não ser as possíveis consequências só de deixar os pensamentos viajarem por caminhos escuros.
Tiro as mãos da gaveta, no entanto não a fecho. Não estou a ser justa em existir nesta hesitação de viver ou não.
Mesmo não tendo qualquer compromisso e ser livre de sentir o batimento do coração ou não, sei que não vai dar por muito mais tempo.
O cheiro do gás é mais intenso...
Observo o nada...
Lamento não poder viver no teu mundo num só segundo e só conseguir coexistir com as minhas mágoas.
Não ergo cabeça e não levanto o queixo. Tenho medo de estar á frente do espelho e ver a grande desilusão, eu.
Volto a caminhar ás voltas e passo sempre com as pontas dos dedos na gaveta.
Isqueiro ou fósforo?
A questão repetida deixa-me cada vez menos hesitante....
Devia de ter medo? De arrepender-me e voltar atrás?
O cheiro está intenso e os meus olhos ardem um pouco, estou perto da saída do gás.
Olho para a minha mão direita e encontro o isqueiro na mão. Quando é que o tirei da gaveta? Olho a gaveta de relance e está fechada.
Viro-me para esta por completo, em que segundo misterioso é que eu fiz a decisão?
Aproximo-me do fogão...
É agora.
Acendo o isqueiro.
A pequena chama que dança, enraive-se para um demónio grotesco!
Fecho os olhos e as chamas engolem-me a uma velocidade fenomenal, a sua beleza não me tormenta, mas queima a minha indigna pele.
Hei-de transformar-me em cinzas e deixar-me levar pelo vento.
Tudo explode á minha volta!
O fumo negro dança com o fogo, não se desprezam, amam-se e dançam numa valsa romântica e suave.
Deixo de pensar e deixo de sentir...
É hoje... É agora... Vou deixar de existir...
A porta da entrada abre.
Tudo volta atrás em câmara de filme á velocidade mais rápida deste universo.
O fumo desaparece, o fogo apaga, o isqueiro volta á gaveta e o fogão desliga.
Estou inteira com as mãos no fogão para ligar o gás....
Largo e dou uns passos atrás. A porta da cozinha abre e vejo...
Iluminação.
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Desabafos de uma depressiva
RandomAo longo do ano de 2018 até ao presente, tem sido uma luta constante contra a minha depressão crónica. Neste livro irei descrever os meus sentimentos, sensações e momentos que me afectaram psicologicamente. Irei escrever em texto narrativo na prime...