Aqui estou, á frente do espelho e parada. Não vejo nada certo ou incerto, mas a janela da minha alma está meio aberta e um bocado partida. Não encontro nenhuma razão para começar a sentir-me novamente em baixo, porém a dor está comigo e pondera em permanecer.

Como é difícil e magoa ser um humano. Teoricamente somos praticamente os primeiros da hierarquia, porém sinto que sou uma deslocada e estou em último lugar do triângulo. Poderei ter o maior espaço nesta forma geométrica, mas estou sufocada com tanta escuridão que me rodeia.

Como é complexo ser humano... Se um dia conseguir descortinar este meu cérebro, será um dia milagroso....

Ouço os ponteiros do relógio passar.... Estou a perder tempo comigo mesma?

O tempo é algo precioso e é difícil de agarrar os ponteiros para pará-lo só por uns segundos. Para parar de viver por uns meros minutos. No entanto, continuo a viver e vivo num ciclo vicioso, começa sempre com um "Porquê?" e acaba com um "Não consigo mais". No fim recomeça sempre tudo e é no tudo que não há nada.

Pouso a mão no espelho em frente ao reflexo da minha face. Já nem me reconheço, que pessoa é esta? Eu ponho a minha confiança em ti para viver um dia de cada vez, no entanto vejo-te a empurrar-me pelo poço negro... Quem realmente és tu? Não, não posso ser eu...

Procuro entre os pensamentos uma razão para me aguentar de pé, olho em volta e não vejo nada. Afasto-me do espelho e continuo a desejar encontrar uma deliciosa vontade de viver.

Caminho até á janela do quarto e observo a noite, encontra-se sem estrelas para aliviar a escuridão. Afasto-me e sinto que os pés estão a ser queimados, olho o chão e está revestido por carvão a ferver. Estremeço e estranhamente suporto o quente debaixo dos meus pés. O ferver estala entre as pedras negras enquanto eu dou lentos passos.

Cada passada que dou sinto a palma dos pés a serem comidas pelo calor, torna-se lentamente numa tortura. Nunca pensei que caminhar fosse tornar assim tão difícil de o fazer. Andar para a frente desgasta e queima a carne viva dos meus membros.

Saem fogo das minhas mãos! Grito! Quando dou pelo fim do meu berro, toda eu estou a incendiar intensamente. A minha pele ferve por dentro e por fora, o cheiro intenso a carne queimada viva agonia-me.

Corro! Fujo para escapar desta agoniante sensação de ser queimada. No entanto quanto mais corro mais longo é o caminho de carvão. Salto para fora do chão negro e caiu no lado de madeira. O fogo desaparece do nada... De joelhos esfolados e mãos no chão para não cair de boca, levanto-me lentamente e agarro-me á parede.

Acabei de delirar?...

Limpo a testa com as mãos, suor escorre-me em gotas continuas e passam perto dos olhos. Não sei se me caiem lágrimas misturadas com suor, só sei que caiem gotas sem parar...

O que foi que acabou de acontecer-me?

O meu coração bate descompassadamente, a respiração descontrola-se á medida que tento dar os próximos passos na direcção da porta. Assustou-me por onde acabei de passar e tenho medo do que poderá vir a seguir. Tenho receio de passar esta saída e deparar-me com o Monstro dos meus pesadelos e realidades.

Como eu desejava saber o que vem a seguir... Porque sou um simples humano que não consegue ver o depois?

Estou cheia de calor. Abano as mãos para aliviar, mas não serve de nada, estou cada vez mais quente. Viro-me para a esquerda e tudo á minha volta anda á roda, por pouco quase que volto a cair.

Em câmara lenta viro-me para a direita, e entre passos que tropeçam pelos pés, consigo aproximar-me doutra porta. Continuo a ver tudo a andar á roda, mais um pouco e sinto-me a cair no buraco para ir ter ao mundo do País das Maravilhas. Onde tudo não tem lógica e ao mesmo tempo é racional.

Seguro na maçaneta e lentamente abro a porta... Silêncio e escuro. A única iluminação existente é a do candeeiro do teto. Encosto a porta atrás de mim e observo o teto, as estrelas e a lua dançam no cimo e andam á roda devido ás tonturas.

Dou o primeiro passo para entrar noutro quarto e ao encontro da pequena cama, piso vidro partido. Os meus dentes rangem ao sentir os pequenos pedaços de vidro a entrar na minha pele. Olho repentinamente para o chão e vejo que este está apilhado de vidro quebrado.

Sou tenho que dar uns passos em frente.... Vou conseguir chegar à cama?

Dou outro passo e a minha coluna estremece rudemente ao aguentar a dor que sobe dos pés à cabeça. Inspiro com força e dou outro passo, os pés já estão completamente em sangue e com feridas incontáveis.

Expiro e no seguinte inspirar acelero as passadas para chegar mais rápido à cama. O cérebro estala ao sentir cada espetar de vidro de todos os passos que acabei de dar. Agarro-me à grade da cama e lentamente baixo-me. Uma das mãos, com leveza sacode os vidros para longe e estremece quando sinto um arranhar.

Lágrimas caiem por muitas razões, pela força de ter consigo ultrapassar este caminho tortuoso, pela mágoa desconhecida que não parece desparecer e pelo medo de me esquecer por completo.

Mas cheguei aonde precisava de estar. Não preciso de ver as estrelas a encantar a noite para ver iluminação na escuridão.

O meu corpo treme por todos os lados, a coragem mistura-se com cobardia. Luto para viver, mas desejo morrer a cada segundo que passa. Não sei o que dizer com esta contradição a não ser sentir confusão...

Porém...

Limpo rudemente as lágrimas da cara e inspiro fundo. Soluço de tristeza, no entanto consigo esboçar um sorriso. Incrivelmente, mesmo estando no meio do escuro consigo afastar por momentos todos os sentimentos horrendos.

O meu pequenote, o meu filho, o meu grande amor incondicional, ele é um ser humano cheio de força e bondade. É o meu anjo nesta Terra amaldiçoada.

Ele dorme com uma respiração dócil e calma... Não precisa de dizer nada para aquecer o meu coração gelado. Posso estar exausta e a chorar, mas ele consegue dar na mesma significado à minha insignificante vida. Faz-me desejar estar sempre com ele, abraçá-lo e deixar ser abraçada.

Ele dá-me razão para acreditar em algo bom e dá-me motivos para conseguir respirar.

Ele é tudo para mim...

Sorriu um pouco mais...

Lembro-me agora de quem eu sou.

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⏰ Última atualização: Oct 27, 2020 ⏰

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Desabafos de uma depressivaOnde histórias criam vida. Descubra agora