Livro I - O Livro de Débora - Capítulo 1: Aprisionamento

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Verão de 2013 - Brasil

Que chuva! A cidade de São Paulo estava sendo castigada pela chuva de verão que caía naquela noite. O trânsito assumira sua versão de caos e as pessoas lutavam para chegarem às suas casas depois de mais um dia de trabalho no infindável cenário de concreto.

Preso no congestionamento, o sedã preto de Mariah Blake aguardava a chance de seguir em frente, carregando em seu interior a preciosidade pela qual a família lutava, enfrentando forças ocultas cujo poder ultrapassava o imaginável pela mais fértil das imaginações.

– Senhorita, não acha melhor ligar para sua tia e avisar que chegaremos tarde em casa? – disse o motorista, pomposo em seu uniforme escuro enquanto ajeitava o espelho retrovisor. Seu nome era Rodrigo, um rapaz de fisionomia comum, cabelos castanhos e olhos verdes detentores de um olhar fugaz quando se referia à sua passageira.

Ela estava sentada do lado direito do carro e encarou o motorista através do espelho; Débora Blake, filha da gêmea Sophia, sobrinha de Mariah Blake, tinha um jeito de olhar bem exótico, afinal, seus olhos eram um conjunto belo de âmbar dourado. Os longos cabelos castanhos eram repicados até a altura dos ombros e o restante escorria pelas costas até a altura da cintura. Não era uma adolescente, mas se parecia com uma em seus plenos vinte anos.

– Não há necessidade – Débora respondeu ao voltar a visão para o lado de fora do carro. – Nesta cidade, todos sabem que a chuva gera atrasos.

Rodrigo não se pronunciou mais quanto àquele assunto, mas perguntou se poderia ligar o rádio para que a música ajudasse o tempo a passar mais rápido. Débora assentiu e se esparramou no banco de trás do carro dando um longo suspiro. Uma de suas mãos percorreu seu peito em busca de algo escondido por debaixo das roupas; seus dedos sentiram um objeto arredondado com tamanho semelhante ao de uma moeda. Sentir aquele objeto lhe trouxe uma sensação de paz, mas de medo instantes depois; medo de algo que ela não podia controlar.

– Rodrigo...

– Sim?

– Por que você aceitou esse emprego? – ela perguntou, mas era como se falasse consigo mesma, refletindo sobre coisas de sua vida.

– Todo mundo precisa de um trabalho, senhorita – ele respondeu com um sorrisinho torto através do espelho.

Ela suspirou como alguém vencido pelo cansaço e vagarosamente ajeitou sua posição no banco do carro. Encarando Rodrigo pelo retrovisor, ela demonstrou preocupação. Contudo, não era um sentimento pela resposta dele em si, mas pelo fato de saber exatamente qual era o trabalho de Rodrigo. Naquele momento ele não a olhava nos olhos com as esmeraldas que eram os seus, mas havia algo neles que ela já conhecia faz tempo e que fazia com que ela sentisse um temor enorme por ele.

– Isso não faz sentido – a voz dela não passava a indignação presente nela.

– Se não fosse eu, seria outro, outro e outro – ele disse, alisando o volante do carro em sentido horário com a mão direita enquanto a outra repousava sobre uma das pernas. – Eles sempre vão encontrar alguém que a proteja deles.

Débora baixou a cabeça e cerrou os punhos já apoiados sobre as pernas. Seus olhos marejaram, mas antes que uma lágrima tivesse a chance de cair, ela voltou-se para ele e disse:

– Isso não é justo! Você fala de um jeito... Como se as pessoas fossem descartáveis. Se você se for, outro virá... E irá também! Estou cansada de ver pessoas morrendo por algo que está ligado a mim e nem sei explicar o que é. E não posso me abrir com ninguém sobre isso, não só porque tia Mariah me proíbe, mas porque ninguém acreditaria em mim.

Prisioneiro delaWhere stories live. Discover now