Capítulo 3: Passado de um, passado de outro

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Huh? Ah! Meu nome é Débora.

Esta foi a primeira frase dela em seu primeiro dia de aula no Brasil, com dez anos de idade. Ele achou graça pelo sotaque, mas não se prendeu muito a isso. Não foi o fato de ser uma aluna nova, como também uma estrangeira, que chamou a atenção dele. Ele gostou de Débora assim que colocou os olhos nela.

A mudança de país fez com que ela vivesse um tempo em paz antes de os demônios voltarem a emboscá-la. Contudo, Rodrigo se autoproclamou protetor já nessa época. A adaptação dela é devida muito a ele.

Eram amigos tão próximos que muitos os consideravam namorados, coisa que divertia Rodrigo. No Ensino Médio, andavam juntos, dividiam o lanche, confidenciavam segredos um ao outro; ao término do 3º ano dele, precisaram se despedir depois de seis meses. Ela ainda passaria pelo último ano e ele optou por servir ao exército. Ele sabia que não poderiam se ver como antes, então pediu algo importante a ela.

Quero ser aquele de quem você sempre vai se lembrar quando alguém perguntar com quem foi seu primeiro beijo.

No fim, ele mesmo achou graça do que havia pedido e como havia pedido. Os dois riram, mas acabaram por finalizar aquela fase da vida deles da forma que poderia influenciar a nova etapa quando pudessem se encontrar com frequência novamente.

O beijo se repetiu na cabeça de Rodrigo não uma, nem duas vezes, mas várias enquanto ensaboava o sedã da família que retornara da vidraçaria alguns dias depois da luta no shopping.

Quando se deu por conta de que o que tinha nas mãos era uma esponja e não Débora, deixou-a cair, soltando um longo suspiro. Ele não a culpava por algumas coisas terem mudado ao longo do tempo que ficaram um pouco distantes, afinal, ele também tinha mudado, mas desejava do fundo do coração algumas coisas de volta. Pensou no abraço que recebera no shopping, mas não pôde desfrutar da lembrança por muito tempo.

Seu celular tocou. Número desconhecido, porém, ele atendeu como se já soubesse quem era.

– O que foi? Sim, eu sei. Também sei disso. O que você deve fazer? Você sabe o que deve fazer.

Ele escutou passos se aproximando. Mesmo sem verificar quem era, procurou terminar a conversa.

– Preciso desligar. Depois eu ajudo você com isso.

Ele voltou a trabalhar no carro como se não tivesse ouvido ninguém chegar. Presumiu que fosse Robert, pois aquele dia da semana era justamente o escolhido para sua folga e no qual o tio assumia a proteção de Débora. Rodrigo havia levantado cedo para logo trabalhar no carro e, assim, poder abdicar desse dia de descanso.

– Rodrigo, hoje é seu, sua, folga – disse Robert, aproximando-se com a espada totalmente limpa do sangue do demônio, a arma de fogo com munições extras e frascos novos de água benta, assim como a espingarda para os tiros de sal. – Pode deixar que acompanho Débora até as aulas de recuperação.

Devido aos constantes problemas com os demônios, Débora perdia muitas aulas na faculdade e acabou por ficar reprovada em algumas matérias. Para se recuperar para o próximo ano, contratou aulas particulares e se encontrava com os professores na faculdade a pedido de Robert.

- Sem problemas, Robert – disse o rapaz ainda sem olhar para o homem, mantendo-se firme na limpeza do carro. – Eu posso ir até a faculdade com ela.

Robert colocou as coisas no chão um pouco distante da área que o rapaz usava. Depois voltou até ele, tocando seu ombro e braço para que ele parasse com o serviço e prestasse atenção no que diria.

Listen, son... Eu sei que se preocupa com ela, mas tire o dia de hoje para você. Quem sabe não seja bom para pensar em como fazer as coisas voltarem a ser o que eram entre vocês, hein? – o tio sorriu antes de continuar. – Eu me lembro de como eram nos tempos de escola e sinto muito pela distância ter afastado um pouco vocês. Aliás, não só a distância, mas também os malditos demônios.

Prisioneiro delaWhere stories live. Discover now