UM - Parte 1

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N.A.: isso aqui é um suborno porque tem grandes chances de eu dar umas atrasadas nas postagens de MdP por esses dias. Continuo não tendo data para começar a postar esse livro aqui para valer. Aviso dado!

***

Pelo menos a casa não está caindo aos pedaços.

Pago, saio do taxi – essa cidade é tão pequena que nem tem Uber – jogo minha mochila nas costas e paro, ainda com a porta do carro aberta. A casa pode até ser grande, mas é horrível. E estou sendo generosa. A entrada parece até bonitinha, com duas colunas logo antes da porta, mas só. O restante da casa é uma colcha de retalhos: teto em alturas diferentes, paredes com acabamentos diferentes, ângulos e estilos que não encaixam... E acho que algum dia ela já foi branca, ou pelo menos de alguma cor clara. Agora está manchada por anos de chuva, poeira e sabe-se lá o que mais sem ninguém para cuidar dela. Espero que pelo menos o telhado ainda esteja inteiro. E as janelas estão tão sujas que parecem amarelas. Isso vai dar trabalho.

— Tem certeza de que é o lugar certo, menina?

Me abaixo e olho para o motorista. Ele é velho, com o cabelo completamente branco e aquela atitude de "tio prestativo". No tempo que gastamos da rodoviária até aqui, uns dez minutos, ele já me contou mais sobre a cidade do que minha avó disse na minha vida toda.

E ele está encarando uma das janelas do segundo andar. Olho para ela também, em tempo de ver uma sombra passar. Cortinas velhas. Não quero nem pensar em como deve estar empoeirado lá dentro. Minha alergia vai amar isso.

— Dizem que a casa é assombrada, sabe — o motorista continua.

A casa velha da minha avó, assombrada? Sério? Faço um esforço e não reviro os olhos. Isso não deveria me surpreender.

— Sim, é aqui mesmo — respondo, ignorando o comentário.

Fecho a porta do carro e encaro o portão fechado com um cadeado. Ele não é um dos portões que acostumei a ver a vida inteira: ou inteiro ou uma grade simples. Não, é um daqueles portões bonitos, com barras de ferro esculpidas para formar desenhos bonitinhos e tudo mais. O tipo de coisa que eu esperaria ver em um filme, não na casa velha da minha avó.

Entre o portão e a casa propriamente dita está o jardim – que agora é puro mato, óbvio. Quando minha avó mencionou a casa, não pensei que fosse ter um jardim desse tamanho. Eu diria que é pelo menos meio lote de mato. Mais trabalho para mim. Talvez tenha sido para fugir do trabalho que ela saiu desse fim de mundo.

Solto o cadeado e entro, puxando o portão atrás de mim. O taxista ainda não foi embora e não tenho certeza se isso é bom ou ruim. A casa está abandonada há uns trinta anos... Talvez ter vindo direto para cá não tenha sido minha melhor ideia. Mas é a casa velha da minha avó. O que é que pode acontecer de ruim?

Fecho o cadeado de novo e começo a atravessar o caminho de mato mais baixo até a casa.

O táxi vai embora quando já estou parada na porta e eu suspiro. Não é que não goste de lidar com pessoas, normalmente, mas agora... Bom, não estou vindo para uma cidade tão pequena que não aparece em nenhum mapa porque quero estar cercada de pessoas. Ainda mais pessoas "prestativas". Agora não.

Abro a porta e passo a mão pela parede, procurando o interruptor. Minha avó prometeu que ia cuidar da papelada toda e mandar ligarem luz e água, então eu só precisava vir e tudo estaria pronto. Só espero que...

As luzes se acendem com um zumbido baixo. Certo. Até agora, tudo certo. E tem um lustre. Um lustre de verdade. Na minha sala. Ou será hall de entrada? Esse lugar é tão grande que eu não faço ideia de como chamar as coisas.

Sombra e Luar (Entre os Véus 1) - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora