TRÊS - Parte 2

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Eu nem lembrava que tinha trazido o telefone. Se bem que, para ser honesta, não lembro de nenhum detalhe de quando empacotei minhas coisas para sair do apartamento que dividia com Gabriel. Mas o que importa é que eu trouxe e que aparentemente os cabos estão todos okay e já tenho uma linha fixa funcionando. Uma preocupação a menos.

E um contato a mais. Pego meu celular e o cartão que Matias me deu. Melhor salvar isso, senão tenho certeza que vou perder. E... melhor anotar o número da empresa também. Nunca se sabe. Se bem que esse número eu tenho certeza de que consigo achar na lista telefônica.

Encaro os potes na outra bancada da cozinha. O que quer que tenha acontecido mais cedo, não aconteceu de novo. E se eu soubesse onde esses potes estavam guardados, a essa hora provavelmente já estaria dizendo que era só coisa da minha cabeça. Que eu só estou estressada demais e esqueci que arrumei tudo.

Como é que eu vou dormir depois disso? Ugh. Não devia ter vindo para a cozinha depois que Matias foi embora. Devia ter subido para o meu quarto, tentado arrumar alguma coisa lá, ou talvez me sentado no saguão mesmo... Mas não, tinha que voltar para a cozinha. Só para me lembrar que estou em uma casa assombrada. Por que por mais que tudo me diga que isso é impossível, que é mais fácil alguém ter invadido aqui e estar escondido rindo da minha cara...

Ninguém teria conseguido limpar o primeiro andar no tempo em que gastei para ir comprar pão e voltar. Ninguém ia ter conseguido arrumar todos esses potes no tempo de eu acompanhar Rafaela até o portão e voltar. Não é humanamente possível. Então só tenho uma opção. Ou melhor, duas. Sempre pode ser um caso de que finalmente estou ficando louca.

Olho para uma das janelas que dá para o quintal. Já está escurecendo e tenho a impressão de que o dia foi inútil. Tem tanta coisa para fazer que acho que posso passar o dia todo esfregando o chão que vou pensar que não fiz nada. E estou começando a pensar em círculos.

Eu devia fazer alguma coisa para comer. Pelo menos um sanduíche. Realmente devia. Mas... Preguiça. Não. Vou é dormir. Ou melhor, tentar dormir. Numa casa assombrada.

Para quê me lembrar disso agora, de novo?

Pego uma garrafa de água na geladeira e subo para o segundo andar. Droga. Esqueci de instalar o chuveiro. Era só o que me faltava. Sabia. Sabia que ia deixar alguma coisa passar. Eu trouxe meu chuveiro porque minha avó avisou que tinha mandado tirarem os que estavam na casa há um bom tempo, porque eram velhos demais.

Paro na porta do quarto e encaro a caixa aberta em cima da minha cama. Ah, não. Agora já é demais.

Abro a porta do banheiro de uma vez e ela bate na parede. Estico uma mão em tempo de não deixar ela voltar na minha cara. O que diabos está acontecendo aqui? Tem... Não. Não mesmo.

Bato a mão no interruptor. Não tem ninguém aqui. Nada. Mas eu juro que vi uma silhueta... Entro no banheiro e olho ao redor. Nada. A janela continua fechada, não tem nenhum outro jeito de alguém ter entrado ou saído... E meu chuveiro está instalado.

Respiro fundo, abro a torneira e dou dois passos para trás. A única coisa que falta agora é um momento filme de terror e a água descer preta. Ou sangue. Ou, o que é mais provável, dar um curto na fiação.

A água demora alguns segundos mas começa a cair sem nenhuma surpresa. Nenhum cheiro de queimado, nada de cor estranha, só água. E não demora muito para o vapor começar a subir. Encaro o chuveiro. Certo. Então...

Não adianta eu tentar me convencer de que estou esquecendo que fiz as coisas por causa do estresse. Não tem como, eu não teria esquecido que instalei o chuveiro, até porque eu teria desligado a chave geral para fazer isso. E eu ia precisar de ferramentas.

Droga. As ferramentas eram de Gabriel. Acho que não trouxe nada. Não que isso importe, se as assombrações da casa querem instalar as coisas para mim...

— Obrigada.

E agora estou ficando louca e falando com fantasmas.

Me estico e desligo o chuveiro.

Fantasmas que aparentemente sabem instalar um chuveiro. Okay.

Respiro fundo e balanço a cabeça. Que seja, então. Ou eu estou ficando louca, ou isso está acontecendo de verdade. E, de qualquer forma, não adianta discutir.

Volto para o quarto só para colocar meu celular em cima da cama. Trouxe algumas roupas para cá mais cedo, o que inclui meu pijama e toalhas. Ótimo. Preciso dormir. Preciso muito dormir e quem sabe quando acordar as coisas vão ter voltado ao normal.

***

N.A.: eu acho que preciso de um despertador pra lembrar de postar antes de ir dormir... asuasuhauhsauhsauhsa

Sombra e Luar (Entre os Véus 1) - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora