Quando há chuva lá fora

5. Área Restrita

QHCLF Pt. 5

20. Muitas coisas para mim

Já se passou uma semana deste que Jhonny me mostrou a cidade abandonada e ainda não superei e também não consegui ler os relatórios que peguei lá.
Estávamos matando o último tempo de aula na pista enorme de corrida que temos do lado do colégio. Ally estava correndo, se preparando para uma competição que teremos em dois dias, ela parece bem nervosa, mas muito determinada.
Será que ela começou a correr depois que descobriu que os monstros eram reais? Porque está sendo uma alternativa eu começar a correr com Ally, seria bom ter fôlego e velocidade se for atacada.
Mas ao mesmo tempo me pergunto o porquê disso tudo, não precisaríamos disso tudo se a gente não morasse aqui. E é aí que vem outra pergunta, como seria a nossa vida sem esses monstros? Estaríamos em algum canto do colégio jogando Uno? Ou matando a aula de inglês do lado de fora?
Esses meus pensamentos são cortados por uma fumaça fedorenta. Keila estava do meu lado fumando um cigarro.
- Tem como você morrer pro outro lado? - digo, irritada - Tomara que você engasgue com esse cigarro.
- Qual foi? - diz Keila, se afastando e rindo com a minha irritação.
Pego meu celular e começo a escutar algumas músicas da Birdy no aleatório.
O noticiário local disse que faria sol por toda a semana, não está quente, pois o vento frio faz com que a gente ainda tenha que usar casaco, mas finalmente posso ver a cor do céu pela primeira vez deste que cheguei nessa cidade. O brilho do sol bate no meu corpo, que agradece, já estava ficando pálida pela falta de sol.
- Onde você morava fazia muito sol? - Keila finalmente fala.
- Muito - respondo - tanto que o pessoal do orfanato teve que gastar muito dinheiro pra colocar ar condicionado no prédio.
- Você ficou por quanto tempo lá? - eu posso sentir o peso e cuidado que Keila está tendo com as palavras.
- Eu fui deixada lá com uns oito anos de idade e a Mary mal tinha um ano. Algumas pessoas queriam adotar somente a Mary, mas eu me neguei a me separar da minha irmã, ela é a única coisa que me restou de uma vida normal, eu me importo mais com ela do que comigo mesma.
- Devia ser bem foda lá - Keila diz - No sentido de ser um lugar ruim.
- Era - digo, vendo Mary correr com Ally, mas desistindo quando não conseguiu alcançá-la, Kendra, amiga da Ally, pegou ela no colo e começou a correr.
- Olha, Rose! - grita Mary, levantando os braços.
- Menina, você já tem dez anos, já ta grande pra ser carregada no colo! - digo, rindo.
- Ih - diz Kendra - Eu aguento ela, levinha.
Assim que Kendra diz isso, ela quase cai, ela respira fundo e coloca Mary no chão, que empurra ela e começa a correr, rindo.
Vejo que alguém sentou no meu lado e quando vou ver quem é, me assusto. Briana está do meu lado. Keila apaga o cigarro no chão e posso ver a sua cara de desconforto.
- Sua irmã é demais - Briana diz - Eu queria ter uma como a sua.
A Briana não foi tão forte com a irmã quanto eu fui com a minha, levaram a irmã mais nova dela quando a gente tinha nove anos, foi a primeira vez que conversamos, pois não gostei de vê-la triste daquele jeito.
- Pensa pelo lado positivo - digo - Pelo menos ela não está nessa cidade estranha.
- Pelo menos isso, né - Briana diz, abaixando a cabeça.
Eu dou batidas de leve no meu próprio ombro, Briana se aproxima e coloca a cabeça nele.
- Obrigado por me ajudar naquele dia - ela diz, calma - Eu estava péssima, mas você me ajudou.
Eu não odeio a Briana, ela pode ser muito estranha, mas de vez em quando ela é um amor de pessoa. Nosso primeiro beijo foi quando tínhamos treze anos, foi estranho, mas nada que não tinha como piorar, já que Briana ficou obcecada por mim.
Mary vem correndo até mim, abrindo os braços, Briana se afasta e eu abraço Mary.
- Eaí, coisa fofa? - digo - Se divertiu?
- Muito - Ela diz, ofegante - Você deveria tentar também.
- Muito cansada pra correr agora, mas vai lá brincar, vou ficar aqui torcendo pra você passar a Ally e a Kendra.
O spotify estava no aleatório e foi direto pra "Colors PT. II" da Halsey.
Mary dá um beijinho na minha bochecha e sai correndo. Vejo Jhonny correndo em minha direção, ele sorri e acena pra Mary, que faz o mesmo, mas quando olha para a gente, faz uma cara tensa.
- Vocês não acreditam no que eu acabei de descobrir - ele diz, respirando fundo.
- Tá falando daquilo? - diz Keila, apontando para a entrada da pista.
Cassandra e Sam estavam se beijando.
- Sim, mas é algo mais tenso - diz Jhonny - Elas estão namorando de novo.
Eu fico sem palavras. Não que Sam fosse alguma coisa minha, mas ela estava me beijando dias atrás. Por um momento eu desviei os meus olhos, meu coração estava acelerado.
Ally se aproximou com Kendra.
- Que putaria é aquela? - diz Kendra, com as mãos na cintura.
Jhonny olha para mim, triste, como se soubesse dos sentimentos que sinto por Sam, ou será que ela contou algo para ele?
Tiro os fones, parando a música abruptamente.
- E o mais estranho - diz Jhonny, já não olhando mais para mim - é que ela até disse que estava apaixonada.
E como ela poderia estar apaixonada por mim, já que eu cheguei a menos de um mês na casa dela e Cassandra está aqui a mais tempo que eu?
- E não era por Cassandra que ela estava dizendo - Jhonny completa.
Não aguento mais aquilo.
- Eu dou três meses pra elas - diz Jhonny, cruzando os braços.
- Meses? - diz Ally, rindo - eu dou semanas.
- Se não atualizou os status do facebook, não é real - diz Kendra.
- Que tipo de gente brega usa facebook? - pergunto, ironicamente.
- Eu - diz kendra, rindo - Me chama de brega de novo!
- Brega! - digo, fazendo pose e rindo, Kendra pula em cima de mim e começa a fazer cócegas, mas eu não sinto nada, mas mesmo assim eu acabo rindo.
Sam e Cassandra chegam perto da gente e todos ficam calados, elas sentam no chão, Jhonny e Keila olham para Ally, que balança a cabeça, em negação.
Ally corre um pouco e eu me levanto para ir até ela.
- O que foi aquilo? - ela pergunta, limpando o suor da testa.
- Não sei - digo - Mas por que parece que vocês não gostaram disso?
- Cara, Sam é muito complicada, eu sei muito bem pelo que ela passa, mas ela já chegou a ter um caso com a Cassandra, ela se afastou da gente e depois que elas terminaram o que tiveram, Sam ficou muito mal, não quero isso de novo, e agora que sei que ela gosta de você, estou puta pra caralho.
- Quem disse que ela gosta de mim? - digo, me fazendo de sonsa.
- Para de besteira - Ally diz, correndo de costas - Jhonny foi bem claro, ele é bom pra esconder segredos de vez em quando, mas às vezes ele joga tudo na mesa e na festa do pijama foi bem óbvio.
- A gente se beijou - digo, rápido.
Ally para de correr e eu também.
- Então por que aquilo? - Ela pergunta, apontando para o novo casal.
- Eu não falo ideia - respondo, não querendo olhar para elas se beijando.
- Quer saber? - diz Ally, pronta para voltar a correr - Eu tô cansada dessa merda.
Ally corre rápido demais e eu, mesmo querendo, não iria conseguir acompanhar.
Minutos depois, estão todos separados, e acabo sozinha com Sam.
- Você deve estar bem feliz com a Cassandra, né? - digo, sorrindo pra ela.
- Eu tô - ela diz, sorrindo, mas sinto um desconforto na sua voz.
Não dissemos mais nada, Cassandra se aproxima.
- Keila quer contar uma coisa pra você - diz ela, rindo, Sam levanta e vai até Keila.
Cassandra se senta do meu lado.
- Eaí - diz ela - como você ta?
- Tô bem - digo - Um pouco nervosa.
- Por quê?
- Tá acontecendo tanta coisa e a minha cabeça não ta conseguindo acompanhar.
- Você vai conseguir se ajeitar, Rose - Cassandra diz, colocando a mão nas minhas costas - Você tem que acreditar em si mesma e no seu potencial.
- Mas são tantas perguntas que quero resposta.
- Então corra atrás delas, faça o seu melhor, e eu sei que você consegue.
Cassandra tira a sua mão de mim, sorri e fica olhando Ally correr por aí.
- Você só tem que olhar bem as coisas - ela diz, com um peso nas palavras - Às vezes as pessoas não fazem exatamente o que querem fazer.
É muito difícil não amar a Cassandra, ela é carinhosa, Sam deve muita sorte.
 
21. Luz