Sou acordada pelo toque do meu celular. Com o susto, levantei rapidamente, encontrando-me no quarto já escuro entre um emaranhado de lençóis e travesseiros no pequeno sofá. Estranho, não me lembro de ter dormido com nenhum lençol cobrindo meu corpo e muito menos travesseiros.
Além do toque da ligação, ouço um grunhido vindo de TaeHyung adormecido em sua cama, que agora não tem nada além de um fino lençol o cobrindo e um simples travesseiro onde descansa sua cabeça.
Onde foram parar todos aqueles edredons e travesseiros? São estes que estão comigo? Não me lembro de ter pegado ou pedido. O Kim os colocou aqui por vontade própria? Por que ele faria isso? Isso é estranho, tipo, muito. Isso não importa agora. Então, antes que ele acorde, peguei meu celular e fui em direção a porta de vidro que dá acesso à sacada e a noite fria que abraçava Busan.
Sem mais delongas atendo a ligação que curiosamente vinha de minha mãe, o que me deixou preocupada. Ela não costuma ligar tão tarde.
ㅡ Mãe! Está tudo bem? ㅡ indaguei tentando conter a preocupação excessiva em minha fala.
ㅡ _____, seu pai ㅡ sua voz é chorosa e dolorida. ㅡ ele não sabe mais quem eu sou! ㅡ um soluço escapou de sua garganta.
ㅡ Calma e me diga o que aconteceu. ㅡ Precionei o parapeito com força.
ㅡ Esta noite eu fui ao mercado para comprar algumas verduras e quando voltei ele não me reconheceu de novo. Filha, é a quinta vez que ele esquece de mim.
Não consegui dizer nada, apenas sinto um aperto doloroso em minha alma.
ㅡ Eu estou cansada de tudo isso! Ver meu marido se definhando desta forma me mata aos pouquinhos diariamente.
ㅡ Não fique assim, vai dar tudo certo. A senhora verá, o papai irá melhorar. Nós já passamos por tantas dificuldades e superamos todas, não vai ser essa que vai destruir a nossa família. ㅡ Se acredito nisso que acabei de dizer? Bom, eu tento.
Meu pai tinha apenas quarenta anos quando os primeiros sinais começaram a aparecer. Ele não conseguia se concentrar em suas tarefas ou esquecia de coisas simples como a data, onde havia guardado suas coisas e até mesmo alguns compromissos como o meu aniversário de dezesseis anos. Após ele ter sofrido um acidente de carro quando se perdeu pela cidade, minha mãe o levou a um especialista que nos deu o diagnóstico que mudaria o rumo da nossa família, meu pai estava com Alzheimer precoce.
Essa doença normalmente se manifesta em pessoas com mais de sessenta anos e é causada pela morte das células cerebrais, o que acaba afetando funções do cérebro. Não há cura, não até o momento, apesar de existir tratamento para retardar a evolução da doença.
O diagnóstico abalou meu pai profundamente. Eu via em seu olhar o quanto estava devastado com sua condição e com medo do futuro, por mais que sempre sorrisse para não preocupar mamãe e eu. Ele logo foi aposentado por invalidez, o que tornou a situação ainda mais triste, pois ele adorava o que fazia. Minha mãe foi a próxima a deixar o trabalho com a evolução da doença, pois ele ficava cada vez mais fragilizado com a degeneração de seus neurônios.
Hoje, após quase sete anos, ele está no que os médicos chamam de estágio grave, o último. Esse último diagnóstico foi feito a três meses atrás, no dia vinte e cinco de dezembro, e por mais que já esperássemos por uma notícia como aquela por conta dos sinais que vinha apresentando, ainda sim, doeu. Quando minha mãe me ligou chorosa naquela noite com a palavra final dos médicos; eu perdi o fôlego, as forças e desabei sobre o chão. Meu natal se resumiu em uma noite fria, solitária e chorosa em meu minúsculo apartamento.
A ligação se encerrou após longos minutos de uma conversa angustiante. Guardei o celular no bolso de meu moletom, encaro o horizonte noturno e então sinto a primeira lágrima deslizar pelo meu rosto.
Eu estou com muito medo! Meu pai está piorando e porra, eu não posso fazer nada para impedir isso! Sinto-me tão inútil e impotente. Por mais que eu trabalhe sem cessar para conseguir dinheiro, na situação de meu pai, nenhum dinheiro no mundo resolveria.
ㅡ Está tudo bem? ㅡ A voz de TaeHyung surge atrás de mim, me fazendo ter um sobressalto.
ㅡ Quer me matar? ㅡ Levei minhas mãos sobre o peito onde o coração está acelerado.
ㅡ Desculpas. Porque está chorando?
ㅡ Não se preocupe, eu estou bem. ㅡ falei de modo nada convincente enxugando as lágrimas com as mangas de minha roupa antes de entrar de volta para o quarto. Não quero que ele me veja assim.
ㅡ Ninguém chora por nada! Pelo que ouvi, você estava falando com a sua mãe. Aconteceu algo? ㅡ insistiu.
ㅡ Eu já disse, estou ótima! ㅡ exclamei irritada esquivando-me de seu corpo encostado no portal que separava o quarto da varanda, e entro.
ㅡ Não precisa se irritar, só estou tentando ajudar. ㅡ Fechou a porta quando me seguiu para dentro do quarto escuro.
ㅡ Se quiser mesmo me ajudar, não se mete. ㅡ Voltei a me encolher no sofá pequeno abraçando minhas pernas.
ㅡ Desculpa, não queria ser invasivo.
Eu abaixo minha cabeça encostando a testa em meus joelhos tentando me acalmar. Ele senta junto a mim no espaço limitado do estofado.
ㅡ Foi mal, você não tem nada a ver com isso. É que ninguém pode me ajudar. Meu pai está... ㅡ Não consigo terminar a frase ao perceber o peso que ela tem sobre mim. ㅡ Ele está...
Meus olhos são inundados e eu tento, mas infelizmente, um choro dolorido rasga minha garganta.
ㅡ Meu pai está morrendo e eu não posso fazer nada. ㅡ chorei escondendo meu rosto em minhas mãos. ㅡ Ele tem Alzheimer e sua condição não está nada boa.
Eu tento parar as lágrimas, mas é um ato difícil diante da tristeza que está se alastrando em mim.
ㅡ Minha mãe, por outro lado, precisou pedir demissão do trabalho, para cuidar dele e agora sou a única que trabalho. Sou quem paga as consultas, os medicamentos, comida e roupas, pois a aposentadoria que ele recebe não é suficiente para sustentá-los. Além disso, nunca tenho tempo de ir vê-los porque está sempre trabalhando e trabalhando. Tudo está afunilando cada vez mais e eu já estou chegando ao meu limite.
Era a primeira vez que eu falava sobre isso com alguém. Para ser sincera, não queria ter contado minha principal fragilidade logo para ele, mas como já disse, estou no meu limite e simplesmente transbordei.
De repente, sinto meu corpo ser abraçado de forma hesitante, sem muito julgamento, encolho contra seu peito e então seus braços me acolhem de uma vez.
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ESTIGMA
FanfictionApós ser ameaçada de demissão, você acidentalmente encontra na Internet algo comprometedor sobre seu odiado chefe e não pensa duas vezes antes de usar isso para manter seu emprego. Mas, o que não imaginava que o segredo de Kim Taehyung revela seu do...