LIVRO EM DEGUSTAÇÃO. DISPONÍVEL NA ÍNTEGRA NA AMAZON.
LIVRO 1 DA TRILOGIA KAPWA - COMPLETO
1º lugar no Concurso Algodão Doce
1º lugar no Concurso WINged Rock
"À margem das grandes cidades, a fumaça esquecida volta a arder. E logo não haverá mais luz...
Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
"Meu reflexo... O espelho está se quebrando. Está aqui. Está muito perto".
Lira arfou baixo, abrindo os olhos e puxando a faca escondida embaixo do travesseiro. O roço de um arrepio pairava por sua pele, como se alguém estivesse próximo de seu rosto, acariciando seus cabelos.
Ela se sentou na cama, a faca apontada para o nada. Seu coração estava disparado, envolvido por uma sensação de apreensão que fazia a respiração sair chiada do peito. Não havia ninguém no quarto da hospedaria além de si mesma.
Uma luz pálida e cinzenta se espalhava pelo cômodo; prelúdio do amanhecer fechado.
Lira moveu a cabeça lentamente, inquieta, analisando os cantos; quase gritou ao olhar pela janela. Do outro lado do vidro, havia uma garota negra, olhando em sua direção.
O sangue bombeou veloz nos ouvidos. Lira comprimiu o cabo da faca e encarou a intrusa enquanto engatinhava sobre a cama. Parecia a mesma garota do seu sonho na colina, só que mais velha, com os cabelos mais cheios e fartos.
Aproximou-se sem abrir o vidro, sem soltar a faca.
A garota não se moveu. Atrás dela, uma cortina de neblina e fumaça encobria o rompimento do dia.
— O que você quer? — indagou, espreitando o semblante dela.
A mão da garota se ergueu, encostando-se espalmada ao vidro.
Tomada por um impulso, Lira ergueu a própria mão, acompanhando o gesto, a palma se encaixando a palma dela; somente o vidro fino e gelado as separava. Foi um instante efêmero, mas infinito, que lançou uma corrente trêmula em suas veias, engolindo a luz nascente e a substituindo pelo brilho das estrelas.
E então, suas mãos se afastaram.
O coração de Lira acelerara de um jeito diferente. A garota não havia dito uma só palavra.
— Ei, está frio aí fora — Lira disse assim que o torpor passou; e abaixou a cabeça, procurando pela trava da janela. — Você não...
Mas, quando olhou de volta, a garota já havia desaparecido.
O quê?!
Ela não poderia estar enlouquecendo. Incrédula, abriu a janela, e foi golpeada pelo vento uivante. Abaixo dela e para os lados, havia apenas os telhados das construções irregulares coladas ao muro da hospedaria. Esticou a cabeça. Teve impressão de enxergar uma sombra se movendo à esquerda.
Prendendo a faca no cós da calça, Lira subiu no parapeito. Como a garota havia andado tão rápido? Com um impulso, pulou, fincando os pés de mau jeito sobre as telhas. O material não aparentava muito resistência. Tomando cuidado para não pisar em nenhum ponto irregular, Lira caminhou sobre a cobertura, envolvida pela palidez da neblina.