Tempestade

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Retirei o quadro da parede, e colocamos a estante de volta em seu lugar.

Nossa, que coisa feia! – Paloma estava com uma mistura de horror e nojo em seu rosto enquanto eu segurava a pintura empoeirada.

Realmente, não era nenhuma visão com a qual você gostaria de se deparar a noite. Nele havia uma mulher, com o rosto todo retorcido. Seus braços longos acompanhavam seu corpo nu, deteriorado e torto para a direita. Ela possuía poucos cabelos, mas os poucos fios que possuía eram compridos, lisos e negros, e seus olhos escuros eram marcantes, fazendo parecer fixos em quem estivesse observando. Além disso, não havia nada no fundo, apenas pinceladas de tinta marrom.

- Bom, pelo visto eu devia ter alguma artista na família. – Falo passando a mão no quadro, para tirar um pouco da poeira e reparando que não havia assinatura na obra.

- É, e ela era bem peculiar... – Paloma levanta uma sobrancelha - Você vai ficar com isso? –  Ela estava atrás de mim agora, provavelmente querendo ir dormir logo.

- Acho que sim, talvez ele tenha algum valor histórico já que parece bem velho.

Deixo-o no chão encostado na parede e vou para o quarto dormir.

                              ✖✖

O celular desperta e eu tento passar o dedo na tela para que ele pare de tocar. Abro meus olhos por um instante para desligar o alarme e me viro novamente na cama quentinha. Num súbito pensamento me recordo que hoje é segunda-feira e levanto da cama em pulo, por quê será que a cama de manhã sempre parece melhor?

Paloma aparentemente já havia levantado bem mais cedo, porque não havia sinal dela na cama em que dormimos juntas. Saio em direção a cozinha seduzida pelo cheiro de café quente, e paro na porta da cozinha admirando a mesa farta com pães, queijos e o que me parecia ser fatias de peito de peru. E lá estava ela, no fogão, colocando a água na jarra do café.

- Bom dia, Dorminhoca. Já estava indo te chamar.

- Bom dia também... Você conseguiu dormir direito ontem à noite? Onde você comprou isso tudo?

- Dormi sim, apesar de ter acordado sem lençol... - Paloma coloca a jarra de café em cima da mesa - Eu vi uma padaria a alguns quilômetros quando estava vindo de carro, aí voltei lá. Pronta para o seu primeiro dia de trabalho?

- Oh, com certeza... – Olho para ela rindo e começando a me sentir nervosa. – Bom, é hora de encarar a realidade.

Como tanto pão até sentir meu corpo pedir chega e começo a me arrumar. Pego algumas roupas que estão dentro da minha mala e dou uma olhada em mim pela câmera do celular, estou vestindo uma blusa azul de gola alta e sem mangas, uma calça jeans justa que realça minhas curvas, um par de sapatilhas pretas e meus cabelos castanhos e lisos, amarrados em um coque.

Não conversamos muito na ida de carro até o Museu Portinari, onde eu iria estagiar. O lugar não era muito longe, porém como minha casa era um pouco isolada dava uma canseira de ir a pé. Quando chegamos no prédio amarelo e enorme, fomos recebidas por um moço simpático que nos ofereceu uma visita guiada pelas exposições. Ele era bonito, alto, com olhos de um verde claro e sotaque parecido com os dos sulistas.

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