Tagebuch

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4 de Maio de 1861Hallo, querido amigo!
Ganhei você recentemente do namorado da minha mãe, e pretendo registrar aqui meus desabafos e acontecimentos diários, quem sabe assim me sinto menos só?

Deixe-me contar um pouco mais sobre mim. Quando cheguei a este vilarejo em que vivo, eu ainda era um bebê no ventre de minha mãe, Josephine. Ela e meu pai, Klaus Ludwing haviam se casado há pouco tempo quando papai recebeu a proposta de ajudar na colonização de um país da América do Sul. Como a situação na Alemanha estava precária e enfrentando uma grave situação econômica, meu papa se despediu de seu país natal em abril de 1845 e embarcou no Virginie rumo às terras brasileiras.

No decorrer da viagem, minha mãe descobriu que me carregava dentro de si e pouco depois de chegar ao Brasil, em 13 de junho, eu cheguei ao mundo. Minhas primeiras lembranças são de uma infância feliz, Mutter me ensinando a fazer Lebkuchen, um fino biscoito típico do seu país de origem, no Natal. Lembro-me de nos sentamos todos juntos a mesa de nossa casa, que papai construiu sozinho com sua sabedoria em carpintaria, e de ser chamada de Kleiner Stern – Pequena Estrela -, devido a um sinal de nascença que possuo atrás da nuca que se assemelha a uma estrela com pontas.

Tudo mudou com a morte de Papa, perto de meu aniversário de 5 anos ele faleceu de Varíola, e mamãe nunca foi a mesma. Em minhas memórias, ela era uma ruiva deslumbrante com um sorriso que transmitia alegria em todos que a viam, nada semelhante com a Josephine de agora. Sempre ranzinza e nunca sorrindo.  E para piorar, pouco depois do enterro de meu pai eu comecei a ter os episódios...

Uma noite eu estava sonhando um pesadelo terrível onde corvos tentavam me matar bicando meu corpo, e me lembro de acordar em meu quarto, com uma voz doce em meu ouvido.

- Calma minha Kleiner Stern, está tudo bem. Nada acontecerá com você.

Ao abrir os olhos, eles se encheram de lágrimas, de alegria. Papa estava sentado em minha cama, fazendo carinho em meu cabelo. Joguei-me em seus braços e meu corpo foi radiado por uma sensação de proteção e segurança, e também frio. O corpo de meu pai estava muito gelado.

- Papa, por que foi embora? Por favor, nunca mais me deixe só... Sinto muito a sua falta, e a mamãe também.

Olhei para o seu rosto e notei que o homem de cabelos grisalhos e cortados na altura dos ombros que um dia eu amei bagunçar, não esboçava nenhuma reação em sua face. Porém, não importava, pois ele havia voltado para mim. Adormeci em seus braços, e quando o dia amanheceu ele não estava comigo.

Levantei de minha cama, e arrumei meu quarto com alegria naquele dia. Assim que terminei fui para a cozinha, pensei que com certeza papai estaria lá, ajudando minha mãe a botar o café da manhã. Porém, quando cheguei lá, não havia ninguém. Mamãe estava deitada em seu quarto, acordada, porém parecia triste demais para levantar. Então percebi que a noite anterior havia sido apenas um sonho, ou foi o que eu pensei.

A partir desse dia, desenvolvi problemas para dormir. Toda noite eu adormecia e acordava no meio da noite e comecei a reparar que sempre havia uma sombra escura me observando no canto do quarto, pela fisionomia eu achava que era meu pai me protegendo de meus pesadelos.

Quando contei para minha mãe sobre minhas visões a noite ela não acreditou.

- Querida, seu pai nunca irá voltar! Eu também queria, mas ele morreu, está no céu agora. – Ela agarrou meus ombros com força olhando fixamente para mim. 

Seus olhos estavam enchendo de lágrimas, até que ela me abraçou e desabou em meus braços onde soluçou por um tempo.

Naquele dia entendi que eu era diferente.

Mais tarde naquele dia - Desculpe-me, querido amigo.

Tive que ir na padaria levar os doces que minha mãe fez para Otávio vender e trazer dinheiro para nossa sustentação. Ele, é um senhor de meia idade, cheio de fiapos grisalhos tanto em sua cabeça de cabelos curtos quanto em seu bigode grosso, e talvez também tenha em sua barriga redonda, que parece peluda por cima das camisas brancas que sempre usa acompanhadas de uma calça preta.

Minha mãe mantém um romance secreto com ele, casado com uma mulher infértil, Isís, seu desejo de ter um filho aumentou com a idade e sempre ilude minha mãe dizendo-a que caso ela lhe dê um filho ela será pedida em casamento.

Não vejo nos olhos cinzas de minha mãe o brilho que possuía quando estava com meu pai, acredito que ela só fique com o padeiro para tentar tampar o buraco que Klaus deixou nela. Ele parou de aparecer para mim, quando os pesadelos sumiram, acho que pensou que agora podia descansar em paz.

Apesar de não gostar muito de Otávio, ele tentava ser gentil comigo ao contrário de minha mãe que está sempre ranzinza e coloca defeito em tudo que eu faço.

Ele me deu você, querido amigo, para que eu possa treinar minha escrita, assim um dia eu talvez consiga uma vida melhor, longe daqui.

Estou prestes a completa 18 anos, já sou moça e pronta para me unir em matrimônio. Peço a Deus que coloque em meu caminho um bom marido para que possamos ir embora juntos e construir uma família onde serei feliz finalmente.

10 de Maio de 1861 - Querido amigo, Hallo!

Trago boas novas! Hoje conheci um jovem simpático enquanto estava no mercado comprando ingredientes para os Lebkuchen. Se chama Victor, é um estudante de medicina e veio tentar emprego na realeza, já que estamos na Cidade Imperial.

Parece ser um jovem cheio de sonhos e de bom coração, igual a mim. O que mais me cativou nele foi que me tratou como se fosse uma menina normal, ao contrário do resto da cidade que sempre me lança olhares e fofocam entre si enquanto ando por eles.

Querido amigo, devo confessar, sinto-me apaixonada por aqueles olhos verdes igual esmeraldas, os cabelos negros até o ombro e seu corpo alto e esbelto.

Deus perdoe-me por estes pensamentos impuros, mas, será ele o prometido que o senhor mandou para mim? Espero que sim.

Tenho que ir, querido amigo.
Bis bald. (Até breve)

Srta. Ludwing

O QuadroOnde histórias criam vida. Descubra agora