Capítulo 4

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Ele desenha

Felipe faltou dois dias a escola e só o encontrei no terceiro dia, durante a tarde. Estava chuvendo forte do lado de fora, os pingos batendo ruidosamente sobre o teto da quadra, e isso tinha nos obrigado a praticar o treino de futebol americano no interior do colégio. Um pequeno e involuntário sorriso se formou em meus lábios quando percebi que o garoto de olhos azuis estava na quadra também, sentado na arquibancada, as costas apoiadas em uma das largas vigas que sustentavam o teto.

Ele pareceu indiferente ao barulho de vinte caras entrando ao mesmo tempo naquele espaço fechado e relativamente pequeno. Continuou concentrado em algo que parecia ser um desenho, pois seus maravilhosos olhos azuis iam de um lado para o outro na folha de papel e as mãos trabalhavam incansavelmente com uma velocidade incrível ao usar o lápis. Ele franzia o cenho ligeiramente cada vez que tinha que fazer um traço mais delicado no papel.

- Olhe, a sua vítima. - Sussurrou Scott quando passou atrás de mim, um sorriso safado em seus lábios.

Revirei os olhos enquanto meu melhor amigo se afastava até os outros jogadores. Depois do ocorrido após a festa de Marie Elizabeth, eu tinha dito para Scott que não iria mais participar daquela aposta idiota e que não me importava se Felipe fosse gay ou não. Infelizmente, Scott podia ser muito persuasivo e acabou me convencendo de que seria somente uma brincadeira, a qual apenas iria nos revelar a verdade, e que ninguém além de nós iria saber disso.

Por fim, a aposta prosseguiu.

O treinador apitou e nós nos reunimos ao redor dele. Suas instruções eram para nós começármos com um aquecimento de quinze voltas ao redor da quadra. Ele apitou novamente e passamos a correr, acelerando os movimentos aos poucos e, quando eu menos esperava, estava erguendo o rosto e lançando olhares rápidos à Felipe.

Após o aquecimento, iniciamos o treino de verdade com um exercício simples, que era só passar a bola de um para outro em zig-zag o mais rápido possível. Dispostos em duas filas e virados de frente um para o outro, nós tínhamos três bolas ziguezagueando ao mesmo tempo e o calor dentro daquela quadra fechada estava quase insuportável. Não sei o que exatamente deu em mim, mas, entre uma bola e outra, ergui os olhos para o Garoto-Morcego e o flagrei olhando fixamente para mim com suas duas bolotas azuis.

E então, a bola bateu nos meus braços com força e desviou para o lado, sem que eu pudesse me recuperar rápido o suficiente para segurá-la.

- Sr. Benson! Onde pensa que está com a cabeça? - Gritou o treinador Hedge, seu pescoço adquirindo uma coloração avermelhada enquanto ele deixava a sua cadeira e chegava perto de nós. - Todos farão cem abdominais agora por terem um Capitão que parece agarrado aos anéis de Saturno!

Meus companheiros de time me olharam com raiva e nos deitamos no chão para fazer as abdominais. Concentrei-me em manter meus músculos do abdômem trabalhando e me forcei a não olhar mais para a arquibancada nenhuma outra vez durante aquele tempo. Meu ventre queimava e o suor deixava os lábios com um gosto salgado.

Quando o treino finalmente acabou, eu estava encharcado de suor, exausto e louco para ir para casa. Relaxei minha vigilância e me permiti olhar para a arquibancada, mas Felipe não estava em nenhum lugar visível. Fiz uma careta enquanto secava o rosto com uma toalha e segui o time, que se dirigia em direção ao vestiário.

- Benson! - Treinador Hedge me chamou e me aproximei dele.

- Sim, senhor?

- Se sente aqui. - Apontou para o espaço vazio no banco e me sentei ali. Cruzou as mãos e começou: - Você tem que se manter focado, Tody. Nosso jogo é daqui a uma semana e temos que ganhar para garantir a vaga nas quartas de final. Você coordena esses garotos em campo e preciso que esteja mais centrado, presente nos treinos e nos jogos.

Como não te amar?Onde histórias criam vida. Descubra agora