Espelho Translúcido

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Hoje é um dia pelo qual esperei muito, embora pareça ser apenas mais um dia qualquer. A sensações que dele surgem me remetem a alguns dias muito especiais no que implica à música. Por isso lembrei desta ideia.

Há dois anos eu passava por um surto criativo, em um momento paradoxalmente de solidão e solitude. Me sentia como um deus. Ao menos criador, sei que sim. Um poder concreto surgia a cada segundo, pois de dentro de mim era dada origem a todo um universo, de texturas, cores, sensações e movimentos. A minha música era uma coisa pela qual tinha controle. Eu decidia, intencionava, formulava e reformulava. É um mundo sobre o qual só eu mensuro o significado. E hoje não é diferente, e os ares semelhantes aos da época onde meu ciclo circadiano não era capaz de acompanhar a criação me renovou e me traz uma de minhas ideias.

2017, época de bastante reflexão. Como disse, tinha controle sobre a música, mas não muito além dela. Acho que em partes foi isso o que me cativou na composição. Em meio a tantas ideias que retratavam o passado em forma de reflexão, esta cria um olhar sobre o presente, em uma dimensão translúcida que coexiste com o interagível.

O pensamento, diante das atuais circunstâncias, se propunha a rever e analisar o caminho dado até então, a fim de entender a que momento as coisas se deram como foi; por que as coisas são como são. A busca de possibilidades para o fim da tão longa jornada também é presente. Esta é uma música que tem um caráter observador, passivo, introspectivo; ansioso, inquieto e emocional. Como também é doce e suave como uma brisa passageira de fim de tarde de primavera. A tentativa de imaginar e de entender como tudo estava no presente e na realidade predomina o desenvolvimento da música. Com o auxílio da visualização dos sentimentos através de tons de azul e amarelo e imagens translúcidas, o sentimento torna-se ainda mais memorável, na medida em que se torna mais abstrato.

No início, o que a move é a saudade de uma imagem que nunca vi realmente, ou melhor, vi quando a criei. É a visualização das imagens antes descritas de longe-perto. Na repetição do tema, há uma variação que muda o ritmo da música, resultando em um ritmo em colcheias, no lugar das anteriores semínimas. A partir deste momento, a imagem translúcida não está mais longe. Agora estou nela. É como se o início da música representasse o anúncio de tal mudança (ir à imagem). Agora, os tons de azul escuro predominam; meu violão está em algum lugar. Estou tocando ele, e ao mesmo tempo não. O pôr-do-Sol se transforma em crepúsculo. Assim desenvolve-se a música até o fim, com a adição de guitarras, em uma atmosfera equivalente ao céu aberto na perspectiva de alguém que ainda não chegou em seu destino final e, não por opção, tem de esperar.

PS.: Não me responsabilizo pelo reconhecimento formal de todas as palavras de que uso, pois às vezes pratico neologismo.

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