[09.12.19]
Se eu te perguntasse a quantos graus a água ferve, tenho certeza de que saberia me responder. Porque é claro que você sabe: é trivial. Mas será que, em alguma das nossas noites, você chegou a imaginar a quantos graus a minha pele fervia sob a sua? Algum dia você soube quantos toques seus eram necessários para me liquefazer? Quantos sussurros me levavam para estar completamente entregue a você? Em algum momento qualquer, mínimo, inútil, insignificante, será que soube quanto de você era necessário para quebrar o meu coração? Por acaso você contou quantas pintinhas eu tinha pelo corpo, como eu fiz com você?
Acho que não. Acho que você nunca nem reparou em como a minha pele entrava em chamas com o toque leve das suas digitais, muito menos deve ter entendido o modo fácil como você me tinha da maneira que quisesse com aqueles seus olhos misteriosos. Olhos dissimulados, distantes, leitores da minha mente e do meu corpo. Se você realmente leu a minha alma, deve ter rido silenciosamente, mas acho que nem isso você deve ter se importado em fazer. Sei, então, que não deve ter lido minha alma, porque isso requer um mínimo interesse... e, sejamos francos... Esta não é nossa história de amor, Taehyung, porque nunca tivemos uma.
Não sei dizer nem mesmo o que tivemos — sei só o que não tivemos, o que não fomos; sei todos os nossos retalhos. Esses pedaços entrecortados e rasgados, pequenos e fragmentados. Agora que as lembranças estão distantes, a verdade é que muitos detalhes da nossa relação se perderam, tanto na minha mente quanto na sua, e, no entanto, algumas partes ainda ficaram, mesmo que espaçadas por vazios, geladas e envoltas em algo esquisito, algo entre sentimentos confusos e a certeza atroz de que será sempre melhor não nos vermos novamente. Essa certeza — sabe de onde ela vem, não é? O que restou de lembrança é tão gelado que pode queimar como fogo. Parece que é só isso que pudemos ter... sempre foi isso, só não percebemos antes. Teria sido melhor se não tivéssemos nos conhecido? Eu não sei.
Ainda assim, ainda que tudo tenha sido péssimo, ainda que nada daquilo tivesse sido realmente bom, eu me lembro bem do dia em que te conheci. Estava frio e nossas respirações condensavam o ar; o vento gelado arrepiava minha nuca e você tinha aquele gosto que queima a boca e a garganta, mas que desce doce e viciante. Qual é o segredo desse gosto? Qual é o mistério desses seus olhos? Me diz, porque até hoje não sei. Não sei por que seus olhos me olhavam daquele jeito, não sei por que nunca deixaram de me olhar assim, como se eu não soubesse nada, como se tudo fosse um segredo do qual eu não fizesse parte. É que talvez eu não soubesse de nada mesmo e talvez você vivesse num segredo eterno? Não... acho é que você tinha medo, tinha tanto medo que precisava escondê-lo atrás daqueles olhos misteriosos. Seu medo, seus segredos, seu eu verdadeiro — que decerto nem você mesmo conhece — enterrado sob todos aqueles tecidos caros, embaixo de todas as mãos que já te tocaram, encoberto pelo cheiro gostoso dos seus perfumes e cremes.
Lembro-me de ter olhado suas mãos depois dos seus olhos, como se tivesse medo do seu olhar me agarrar a garganta com suas mãos, mas ao mesmo tempo, implorando para que o fizesse. Acho que nunca implorei tanto na vida quanto implorei silenciosamente por você, Taehyung. Desesperadamente. Por você, pelos seus toques, pelo seu cheiro, por cada limite macio, faiscante e fascinante entre você e o nada que construímos ao nosso redor.
Lembro também, e é claro que lembro, que, na segunda vez que nos vimos, seus toques eram gentis demais para o meu gosto — e até para o seu. Acho que você me julgou mal, acreditando que eu fosse alguém que gostava de carinho. E eu não era, eu gostava era de me sentir maltratado e dominado — pelo menos até o momento certo de inverter os papéis. Ah, eu adorava aquilo. Ser o oposto do que aparentava. Porque eu sabia que, ao final, teria quem quisesse na minha mão. Pensei que te teria na minha mão também. Eu tinha certeza de que teria. Tinha certeza de que você suplicaria de joelhos para que eu te amasse; e agora, entretanto, me parece que também te julguei mal naquele dia.
Eu nunca inverteria os nossos papéis, nunca seria capaz, porque você me olhou nos olhos naquela noite e eu me senti preso. Você não sorriu. Tinha um olhar que penetrou em mim e me deixou louco em dois segundos. Seus olhos eram enigmas que eu não conseguia desvendar e eu esqueci da vida enquanto você me adentrava com eles. Não sei se algum dia eu verei algo assim de novo. Aliás, eu sei, eu sei que não verei — coisa assim só se vê uma vez na vida. E você foi a minha vez, a minha única vez, e eu sei disso porque tinha vida e morte nos seus olhos. Luz e sombra, gentileza e maldade, sedução e desdém. Tudo e nada: a sua definição, provavelmente a mais perfeita.
Não sei com que coragem eu sorria para você toda vez que aquele seu olhar censurava-me a vida. Eu não era capaz sustentar aquele seu olhar, nunca seria, e não sei se algum dia você conhecerá alguém que o faça. Só o que eu podia fazer era te desafiar de alguma forma, então o fazia: sorria. E você, em contrapartida, continuava sempre a não sorrir de volta. Você não era capaz de retribuir um único gesto meu, nunca foi. Gesto, palavra, sentimento — nada. Ah, não achei que estou me fazendo de vítima; não, eu sei que também nunca retribui. Não quero enganar ninguém, porque já nos enganamos o suficiente antes. Engraçado é entender que nunca realmente nos enganamos: eu sabia que você mentia e você sabia que eu mentia — eram só detalhes que não faziam diferença nenhuma.
Entretanto, eu suponho que tenha sido naquele exato momento, aquela primeira vez em que você não me sorriu de volta, em que eu desejei que você sofresse por mim, Taehyung. Talvez eu seja doente e talvez você também seja. Talvez sejamos completamente loucos — e exatamente por isso merecemos um ao outro enquanto nos afogamos. Aquele olhar de longe foi o começo de toda a nossa merda. Só o que fizemos foi nos machucar. Brincamos com o sentimento um do outro e fizemos tudo, menos amor, mas arrisco dizer que nos arranhamos com tanta força que os vergões nunca sairão.
Então, Taehyung, acha que pode me dizer agora? Agora que tudo acabou, me diz se você sofreu por mim tanto quanto eu sofri por você, porque, já que somos doentes, eu preciso saber disso.
Embora eu já saiba a resposta, preciso ouvir sua voz.
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Me ame a 100°C
FanfictionTAEKOOK [concluída] Jeon Jeongguk desenhava croquis secretamente para a marca de seu melhor amigo. Uma noite, em uma festa após um desfile, ele conheceu Kim Taehyung, o modelo principal da coleção. E não demorou nada para perceber que, embora ach...