5.

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O problema dos nossos sentimentos, era a falta de controle. Você simplesmente não pode controlar o que sente, a situação é imposta e seu corpo reage de forma positiva ou negativa, não tem como fugir disso.

Neste momento eu tinha raiva.

Bom, não sei dizer se era apenas raiva.

Eu estava bufando, impaciente e isso era visível para qualquer pessoa que se desse ao trabalho de me olhar verdadeiramente por mais de dois segundos.

"É sempre assim!" Minha consciência me lembrou e eu só pude concordar. Todas as vezes que Letícia combinava algo, mais dez coisas surgiam e, de repente, um simples café se tornava uma festa até altas horas.

Inicialmente o combinado era apenas sair para comer alguma coisa, mas ao encontrar com o Deus Grego, vulgo Arthur, ele teve a brilhante ideia de irmos para a casa dele, pedir uma pizza.

Até aí, tudo certo, afinal, que mal pode haver de comer uma pizza, não é?

Ao chegarmos lá, nos deparamos com uma casa cheia de pessoas da faculdade, era praticamente uma festinha particular em plena terça-feira! E mesmo que eu pareça uma velha falando, você há de concordar comigo que esse tipo de coisa não é normal.

Gente rica tem mania estranha, parece que não precisam se preocupar com nada.

Letícia, claro, estava radiante. Ela se sentia a primeira dama e tenho certeza que cada degrau que avançava em direção àquelas imensas portas de madeira chique, se imaginava casando com o bonitão de jaqueta de couro.

Na área externa, nos fundos da casa, havia uma piscina e era possível ver algumas garotas de biquíni se banhando por lá. Pelo visto a festinha tinha sido bem planejada.

— Se tivesse dito que era uma festa, eu também teria trazido meu biquíni — comentei sarcasticamente.

— Você pode ficar de calcinha e sutiã, é quase a mesma coisa — Arthur falou, lançando-me um sorriso cheio de malícia.

Eu sorri de volta, sem mostrar os dentes e rolei os olhos, sem disfarçar meu descontentamento com a situação. Esse garoto era mesmo muito abusado!

Letícia estava próxima a um mini bar, enchendo dois copos com alguma bebida da qual eu não iria beber. Caminhei pela enorme sala, em busca de algum canto em que pudesse ficar em paz e, talvez, estudar um pouco. Ao abrir uma porta, me deparei com um ambiente diferente e inesperado.

Era um estúdio. Desses que uma banda usa para gravar suas músicas, bem completo, parecia até ser profissional. As paredes tinham um revestimento diferente, provavelmente para que o som não saísse de dentro do cômodo; os instrumentos musicais estavam dispostos ali, em todos os cantos, de todos os tipos.

Passei os dedos pelas cordas do violão, fazendo com que o som das notas saísse e preenchessem o local.

— Gosta do que vê? — A voz rouca me fez pular. Senti meu coração disparar, como uma criança que é pega de surpresa enquanto apronta.

— Que susto, cacete! — exclamei, colocando a mão sobre o peito.

— Que boca suja — ele riu.

— Você está me seguindo? — questionei de modo acusatório.

— Jamais! — Arthur deu de ombros. — A casa é minha, não é como se você pudesse sair bisbilhotando por aí.

— Oh! Me perdoa, querido — sorri cinicamente —,já estou de saída.

Mas antes que eu pudesse sair porta afora, senti sua mão segurando meu braço e me puxando devagar para perto de si. Foi inevitável olhar para a porta de entrada, como se minha mente traiçoeira estivesse se certificando de que estava mesmo fechada.

Contrariando tudo o que eu tinha como certa na vida (lê-se não flertar com o crush da melhor amiga), meu corpo estava afoito, ansioso por beijar novamente aqueles lábios tão perfeitamente desenhados.

— Não quis ser grosso – ele falou como se estivesse se desculpando. — Nós não tivemos a chance de conversar depois daquela festa e...

— E aí você resolveu que seria bacana ficar de conversa mole com a minha amiga, para quem sabe, se aproximar de mim?

Minha raiva parecia crescer. Esse garoto podia ser lindo, mas era o rei dos babacas.

— Bom, pra ser sincero, sim — ele respondeu naturalmente, como se aquilo fosse comum e aceitável.

— Nossa! Você é muito idiota!

Agora eu estava possessa! Eu esperava uma desculpa esfarrapada e não que ele admitisse assim, tão fácil.

— Não é o fim do mundo. Às vezes os fins justificam os meios — ele sorriu, aquele maldito sorriso que fazia algo me revirar dentro de mim. — E você é difícil de achar, tem noção de como eu andei pelo campus pra te encontrar? — Aos poucos, ele foi se aproximando. — Aí, sua amiga apareceu e, bom, pensei que talvez em contato com ela conseguisse chegar até você, mas ela comentou sobre como você estava interessada no Breno... — Droga, Letícia! — Eu achei que não tinha chances.

Nós estávamos próximos o suficiente para que eu sentisse o seu hálito com cheiro de menta. Trident de menta, provavelmente, muito popular entre as pessoas em festas, talvez para disfarçar o cheiro da bebida...Ou das drogas.

Meus olhos estavam fixos em seus lábios, que eram perfeitos e pareciam ter um ímã em relação aos meus. Senti suas mãos na minha cintura, me puxando para mais perto e colando nossos corpos. Minha respiração parecia falhar, meu coração errava as batidas e, mais em baixo, algo estava quente.

— Lu!

A voz familiar de Letícia vinha do corredor e me fez despertar do torpor em que havia entrado. Me afastei ao mesmo tempo em que Arthur se distanciou.

Aquilo era tão errado e ao mesmo tempo tão necessário. Era incrível como meu corpo reagia ao simples toque do garoto com olhos de gavião.

— Achei vocês! — Letícia apareceu na porta, toda sorridente. — Uau! Que lugar incrível. Você toca? — questionou, chegando mais perto do garoto.

Ele sorriu e confirmou, ela prontamente pediu para que ele tocasse algo.

Eu só queria que ele tocasse em mim. Aquele pensamento fez com que minhas bochechas esquentassem me dando a certeza de que estava mais vermelha do que gostaria.

— Vou deixar vocês a sós — falei baixo, na intenção de sair dali o quanto antes.

— Espera! — Letícia pediu — é rapidinho.

Arthur pegou o violão e dedilhou algumas notas, direto no refrão de uma música bem conhecida.

Me encantei com o seu jeito de olhar, paralisei o tempo só pra lembrar, daquela cena em que eu tirava a tua saia e você beijava a minha boca.

Ele cantou e eu tive certeza que qualquer coisa que saísse daquela boca ficaria dez vezes melhor do que o original.

Mas não era só eu quem estava babando, apesar de conseguir disfarçar bem mais. Letícia estava olhando para ele como se a música fosse para ela, sem nem perceber que seus olhos cor de avelã estavam conectados com os meus.

E aí, a culpa me consumiu mais uma vez, fazendo com que eu saísse do local apressadamente.

Dez Vezes VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora