8.

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— Você não vai mesmo me contar o que aconteceu? — questionei, olhando Letícia de rabo de olho.

Estávamos sentadas no sofá, com as pernas sobre a mesinha de centro, um pote de pipoca doce entre nós e um filme de comédia romântica na TV. Em outras palavras, estávamos curtindo um final de dia.

— Você sabe o que aconteceu, ele me dispensou.

— Eu quero saber o motivo — falei sem ter certeza se realmente queria.

Quero dizer, se ele tivesse dito algo sobre nós — se é que existe um nós — ela estaria bem brava comigo e provavelmente não estaríamos juntas agora.

Letícia suspirou, pegou o controle que estava sobre o sofá e deu pause no filme antes de virar-se no sofá e me olhar.

— Ele está interessado em outra — falou por fim. — É isso.

— Que chato. — Foi tudo o que consegui dizer.

— Chato?! É o fim do mundo! — Letícia se pôs de pé, colocando as mãos na cintura e me encarando. — Olha bem pra mim! Eu sou linda, modéstia parte, claro; sou uma ótima ouvinte e uma ótima amiga! Zero defeitos! Eu não sei o que ele pode ter visto em outra garota que não tenha visto em mim.

Não sei quantos segundos levou para que eu conseguisse formular uma resposta, se é que aquilo era uma pergunta. Parte de mim queria gritar para ela e dizer que eu também era linda, perfeita e etc. E que alguém como Arthur Kannenberg poderia sim se interessa por mim e não por ela; mas a outra parte, a parte sensata, sabia que dizer algo assim seria o mesmo que admitir que eu estava tão interessa quanto ela no garoto, e pior: ele estava correspondendo, aparentemente.

Respirei fundo antes de concordar.

— Você está coberta de razão, ele é um babaca que não te merece. — Péssima amiga! Minha consciência gritava. — O melhor mesmo é esquecer que ele existe e seguir em frente.

— Tá maluca?! — ela franziu a testa e sentou novamente. — Nós vamos é descobrir quem é essa piranha e acabar com o que estiver rolando entre os dois.

Engoli seco.

— Parece até uma psicopata falando assim — murmurei.

— Não exagera, não é como se eu quisesse matar a menina — ela deu de ombros e sorriu —, só quero deixar ela longe do meu bebê.

— E como você pretende fazer isso? — questionei, ignorando o apelido carinhoso que acabara de ouvir.

— Com a sua ajuda — ela sorriu. — E com a do Breno também.

Suspirei. Algo me dizia que isso não iria acabar bem para nenhum de nós quatro.

¨

Depois de uma quarta-feira de ressaca, a quinta-feira veio cheia de brilho e felicidade... Pelo menos deveria ser assim.

A verdade é que eu mal consegui dormir a noite, não conseguia parar de pensar no que Letícia iria aprontar e como reagiria quando soubesse quem era a possível concorrente. Lógico que eu estava sendo muito otimista, afinal, quais eram as reais chances de eu ser a tal garota pela qual ele estava interessado?

Acordei pior do que no dia anterior, porém, no horário.

Letícia, por outro lado, estava radiante! O sono da beleza que eu deveria ter tido foi tirado todinho por ela, parecia que estava vendo unicórnios voando, de tão sorridente que estava.

— Dormiu bem? — perguntei, enquanto servia uma xícara de café preto.

— Melhor impossível! — ela respondeu, sentando-se no banquinho e apoiando os braços sobre a bancada. — Passei a noite toda conversando com o Breno. Você acredita que ele não faz ideia de quem seja a tal garota?

Respirei aliviada.

— Isso é bom? Quero dizer, eles são amigos né? Deveria saber — dei de ombros e sentei de frente para ela.

— É maravilhoso! Minha teoria é que não existe garota nenhuma, se não, Breno saberia quem é.

Talvez porque ele também esteja interessado nela! Minha Consciência gritou.

— E mais! — ela continuou: — Breno concorda comigo, inclusive ele acha que Arthur só me dispensou porque tem medo de se envolver. — Ela abriu um sorriso triunfante.

Continuei tomando meu café e ouvindo enquanto ela detalhava a sua conversa com Breno, contando sobre como os dois tinham teorias sobre o assunto e frisando que eu deveria dar uma chance para o garoto loiro, que parecia tão legal.

Saímos do apartamento, descendo os três lances de escadas e nos encaminhando para a parada de ônibus mais próxima. O caminho até a faculdade não era tão longo, mas também não era curto o suficiente para que fossemos a pé, então esperamos por cerca de dez minutos até que nossa condução aparecesse.

¨

Ao chegar no campus, Letícia avisou que iria ao banheiro e eu resolvi que esperaria no saguão. Encostei-me no balcão de informações, ainda pensando sobre o que Letícia havia dito mais cedo e em como eu faria para que ela desistisse daquilo. Assustei-me ao sentir uma mão tocar minhas costas e virei rapidamente.

— Terra chamando! — A mulher da recepção falou rindo. — Não queria te assustar, mas chamei seu nome baixinho e você não respondeu, então...

— Tudo bem — falei, sorrindo sem jeito.

— Tenho um recado para você — ela sorria de orelha a orelha e, notando minha cara de interrogação, apontou o dedo para que eu olhasse.

Segui seu dedo, olhando para onde estava apontando e me deparei com Arthur, encostado no marco de uma porta, de braços cruzados e me olhando. Ele fez um sinal com a cabeça, apontando para dentro da sala e entrou, sumindo do meu campo de visão.

Fiquei parada, não sabia o que fazer.

O que ele estava fazendo ali? Isso era loucura! Parecia que estava se escondendo de alguém.

E como se a mulher pudesse ler meus pensamentos, ela apenas sussurro:

— Você vai precisar ir até lá para descobrir.

Concordei com um movimento de cabeça e sem dizer nada, caminhei para a sala da qual ele havia entrado, ignorando completamente os avisos que minha consciência estava dando e todo o bom senso que me restava. 

Dez Vezes VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora