Cegonhas e repolhos

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Sorte mal esperou o marquês partir. Assim que ele estava perto da porteira de saída da propriedade, ela se virou e correu e volta para casa. Nunca corria sem por atenção onde pisava, mas esqueceu-se do cuidado. O resultado foi um tropeção em uma raiz alta e uma feia queda sobre pedras afiadas.

Um dos joelhos da jovem sofreu um corte profundo enquanto o outro apenas ralou. Um jovem negro de nome Tomaz, que trabalhava na horta, passava por ali e correu para acudi-la. Encontrou-a com os olhos marejados de lágrimas graças à dor tão forte que não permitia nem que ela movimentasse a perna.

— Dona Sorte! — Exclamou preocupado enquanto passava um braço dela por sobre seu pescoço. — Eu a ajudo senhorita.

Tomaz passou um braço pela cintura de Sorte e com o apoio dado ela conseguiu se levantar. As lágrimas vertiam dos olhos, quando falou, a voz saiu embargada.

— Graças a Deus, Tomaz. Sou grata por sua ajuda. — Agradeceu.

— Se não estiver em condições de andar, posso carregar-te. — Ofereceu solícito.

— Aceito se não for incômodo, Tomaz. Será mais rápido que me arrastar até lá. — Sorte achou a oferta bem vinda, pois realmente não estava bem.

O jovem Tomaz tinha braços fortes do trabalho e físico robusto. Ergueu Sorte no colo como se não pesasse mais que uma criança. A moça o segurou pelo pescoço e ele carregou-a pelo caminho de pedra, ladeado por flores até o comprido e largo alpendre da casa. Depois entrou na residência e se direcionou para a sala.

— Não Tomaz, leve-me até meu quarto. — Ela pediu. — Dessa forma será difícil subir as escadas, mesmo com os apoios de segurança.

Tomaz anuiu com a cabeça. Atenderia ao desejo dela, mesmo embaraçado porque não era direito entrar no quarto de moças solteiras. Esperava que o patrão entendesse a urgência. Nem de longe o conde era um homem nervoso e irracional, mas quando se tratava da irmã, ele tinha cuidado redobrado.

O jovem a levou escada acima enquanto ela observava aquela obra feita para preservá-la intacta. Os degraus eram mais amplos que o usual, os corrimões largos e feitos de boa madeira. Tudo porque quando era criança, Sorte tropeçou em um dos degraus e quando tentou se apoiar no corrimão, ele se quebrou. Só não morreu porque estava a apenas quatro degraus do chão, mas ficou muito machucada. Depois disso, tinha cuidado redobrado ao descer as escadas, mesmo depois da reconstrução. Quando era polida e ficava escorregadia, Sorte só subia apoiada em alguém.

Tomaz entrou com ela no corredor, onde encontraram Matilde saindo do quarto da condessa. A mulher, vendo o sangue na roupa clara de Sorte, soltou um gritinho de susto. Pela porta aberta, o conde - que chegara a algum momento – e a condessa olharam assustados.

— Sorte, o que aconteceu? — Pedro perguntou preocupado enquanto levantava-se para ajudá-la.

— Meu quarto é o último, Tomaz. — Sorte falou e Matilde foi rápida abrir a porta.

Tomaz, embaraçado, continuou o caminho até depositá-la sobre a cama. Enquanto isso, Sorte dava explicações para o irmão.

— Tentei correr, pois estava preocupada com Adália. Não vi uma raiz pelo caminho, por isso tropecei nela e caí. Tomaz passava por perto e me ofereceu ajuda. Aceitei, pois está doendo como o inferno. — Quando terminou de falar já estava acomodada sobre o próprio colchão.

— Obrigado, Tomaz. — O conde agradeceu.

— Você me salvou. — Sorte agradeceu também.

Tomaz abriu um sorriso largo ornado por lábios carnudos.

Sorte e o Marquês (Donas do Império - Livro 1) [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora