Quando me formei no ensino médio, parecia que as portas se abriram pra mim, que eu estava presa e fui liberta, o mundo ganhou mais cores e possibilidades, passei a enxergar a vida com outros olhos, enxergando beleza e alegria. O novo mundo que eu estava para descobrir era novo e nunca havia experimentado; era um nuance de curiosidade com descobertas. Eu me permiti viver e deixei as algemas estraçalhadas no passado.
Era uma "recém jovem", que não se via obrigada a ir no colégio que a atormentava mais, pois havia se formado; uma jovem que podia escolher o que queria fazer da vida e o que não queria; que não precisava forçar amizade com ninguém; que poderia ficar sozinha sem ter pessoas para me tocar; uma jovem livre.
No começo da juventude, o TOC ainda estava presente, não é fácil se curar. Eu comecei a fazer repetições na mente, com pensamentos mesmo, do tipo que eu pensava mil coisas horríveis e repreendia com mil coisas boas; se uma pessoa saudável pensa cem coisas por minuto, eu pensava quinhentas.
A todo momento a minha mente estava trabalhando. Eu calculava tudo de cabeça, contava tudo que via; eu contava os calçados empilhados no meu quarto, minhas canetas, minhas blusas, minhas calças, meus shorts, meus brincos, etc... Sabia exatamente a quantidade de tudo em meu quarto, se alguém mexesse nas minhas coisas, eu sabia que tinham mexido, pois além da quantidade eu colocava com perfeição certinho, um esbarrado e eu já ficava furiosa gritando: " quem mexeu no meu quarto?". Tinha problemas de contar tudo até na rua, tipo por quantas árvores eu passei, quantas casas bonitas vi, quantos carros vermelhos, quantas pessoas passaram por mim, a porcentagem de desconto em uma peça de roupa, etc.
Às vezes eu nem prestava atenção em quem conversava comigo, porque minha mente estava contando tudo que meus olhos avistavam. Eu só queria uma ajuda pra não ser assim, por dentro gritava socorro e pensava porque cada hora o TOC era de um jeito e nunca acabava, parecia que mudava de fase, mas não me soltava.
O jovem tem o mundo pra viver e descobrir. Eu, por mais que passava por isso, ainda tinha esperança da cura e de viver em liberdade. Passei a me abrir para novas amizades e oportunidades. Foi então que eu consegui um emprego na fábrica de veículos da Fiat onde eu e várias meninas montavamos parabrisa; as peças vinham todas separadas e tinha um mínimo para montar por dia, eu adorei porque contar "coisas" era comigo mesmo. Na empresa eu passei a ser conhecida como "máquina" porque eu montava mais parabrisa que todos, eu estipulava uma meta na minha cabeça e se eu não cumprisse achava que algo ruim iria acontecer comigo, então eu montava o mais rápido possível para bater a minha meta e a minha meta era alta, em torno de mil por dia; minhas mãos ficavam calejadas e doloridas, mas cumpria a minha meta a risca. Com isso, foi se passando dias e meses e meu trabalho foi reconhecido na empresa, eles me mudaram de função porque acharam que o trabalho que eu fazia era muito pesado pra mim. Me colocaram para embalar os parabrisas e despachar para outros países; eu amei mais ainda porque eu poderia continuar contando coisas e minhas mãos não ficariam mais doloridas ou calejadas. A empresa ordenou que eu e as meninas das embalagens despachadas, montassemos as caixas de todos parabrisas que ficassem prontos do dia anterior no dia seguinte; e não fizemos feio, tinha em torno de vinte mil parabrisas para embalar e despachar, e em uma semana embalamos e despachamos eles, além de todos que as outras meninas da montagem montavam no dia. Sei que fui tão hagio que as minhas colegas de trabalho não conseguiam me acompanhar, então elas pediram pra mim ir um pouco mais devagar; acho que se eu montasse as caixas sozinha, acabava até mais cedo. E foi assim durante seis meses, até que sai e fui estudar.
Comecei o curso técnico em química, e o TOC estava lá. Todos os dias eu tinha que usar a mesma caneta e começar a escrever no caderno pela data; sem a data eu não escrevia nada.
Depois a faculdade de farmácia... estipulei que não deveria fazer todo exercício, dever ou trabalho na faculdade, nem que eu dormisse lá [risos], teve vezes de eu chegar 17:00 horas na faculdade e sair 23:00, ficava sozinha com meus pensamentos aterrorizantes. Tinha um problema com a carteira que iria sentar, sempre trocava minha carteira, por mais que a anterior fosse tão boa e igual a atual, eu tinha que trocar para sentir conforto.Com o passar do tempo, por eu me permitir mudar e fazer coisas que nunca havia feito antes, eu passei a esquecer o TOC, como se eu estivesse tomando um remédio, mas meu remédio era passear, viajar e socializar. Porém, estava num processo de cura onde Deus já estava me curando dia após dia.
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TOC, MAS NÃO ME TOC!
Non-FictionEsse é um livro sobre a experiência de uma criança até a juventude com o TOC, ou seja, Transtorno Obsessivo Compulsivo. Onde conta o sofrimento que a pessoa passa com essa doença perturbadora.