Lola

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     Sinto cheiro de morte.

     Não sei exatamente como sou capaz de identificar como a morte cheira, mas estou certa de que é esse cheiro agressivo e nojento que sinto agora. Ele me invade e me deixa zonza no momento em que Loyal e eu saimos das sombras e passamos pelas grandes portas do palácio em ruínas. Aqui tudo brilha em um tom lindo de verde que ofusca a luz natural do dia que vem lá de fora. Por instinto, puxo a mão de Loyal e a seguro com firmeza. Sinto os olhos dele em mim, mas nenhuma palavra sai de sua boca e ele não se afasta. Se as circunstâncias fossem outras, eu me sentiria totalmente afetada pelo calor de seus dedos entrelaçados nos meus, mas tudo o que consigo pensar agora é no perigo que estamos correndo neste lugar. 

     Hoje eu realmente corro risco de morrer. Uma coisa é viver na Terra - onde um carro pode nos atropelar, ou podemos contrair uma doença incurável, ou nosso coração pode simplesmente decidir parar de bater -, outra é estar presa em um mundo totalmente novo e correndo em direção à força mais perigosa já manifestada nele. Se eu morrer aqui, o que acontece? Deixarei meu pai esperando para sempre? Alguém algum dia lhe contará o que aconteceu ou ficarei na lista de adolescentes desaparecidos para sempre?

     A mão de Loyal puxa a minha com firmeza e ele para no meio do caminho, fazendo com que eu olhe para ele para saber o motivo.

     - Tire essa expressão assustada do rosto - ele rosna. - Você é nossa juíza. Você é quem tem o destino de todos nós, incluindo aquela coisa, bem nas suas mãos. Não há ninguém em Centelha do Norte com mais poder do que você.

     Mordo o lábio inferior com força e tento refrear as lágrimas que inundam meus olhos. Estou apavorada.

     Loyal se inclina para mais perto e coloca os lábios sobre minha testa, num beijo desajeitado e tenso. Sinto o corpo dele tremer enquanto está perto de mim e não sou capaz de me conter - abraço-o com força. Porque tenho medo de que ele morra também. Porque ele é importante para mim.

     Ouvimos ao mesmo tempo o som de passos desesperados aproximando-se de nós e nos soltamos, alertas. Vejo um brutamontes - muito parecido com os daquele bar aonde me levaram quando fui sequestrada - vindo como um turbilhão, fugindo de alguma coisa. Ele carrega um grande espada em forma de meia lua e, assim que nos vê, passa de assustado para enraivecido. Loyal salta sobre ele como um gato e os dois se chocam com brutalidade. O tipo de luta que eles travam é totalmente inédita para mim, cheia de golpes velozes e dez vezes mais agressivos do que os golpes de luta que temos na Terra. Eu mal posso acompanhar os movimentos com meus olhos. Humanos não seriam capazes de lutar dessa forma tão bárbara.

     - Vá! - ouço Loyal gritar e sei que é para mim.

     Não hesito. O medalhão não me deixa. O objeto mágico de repente me preenche de coragem e eu corro na direção da fonte da brilhante luz verde, que vem lá de cima. Há uma longa escadaria diante de mim e, conforme subo me apoiando no corrimão, sinto algo grudando meus pés e dificultando minha subida. É uma espécie de gosma quase líquida e escura, que se espalha pela escada como lava vulcão abaixo. O cheiro é desolador - o cheiro de morte que senti mais cedo, dessa vez bem mais forte. Cubro o nariz e continuo, pisando nos lugares onde não há muito da gosma. Subo dez degraus, quinze, vinte, vinte e cinco... E me deparo com um corpo ao chegar ao topo. Das feridas abertas dele verte a gosma em abundância e eu percebo que a coisa em que estou pisando é sangue. Vejo mais um corpo caído e mais outro e outro e caio de joelhos, vomitando perto da parede. Minha cabeça gira e eu começo a suar frio tamanho o nojo que sinto. Esses homens - Sombrios, certo? - foram mortos pela coisa que está liberando a luz verde. Tenho certeza disso e sinto o medo dentro de mim crescer ainda mais quando penso no que ela é capaz de fazer com alguém como eu.

A Ruína de Ricky Prosper (VOLUME 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora